Na pandemia

Carnaval "histórico": sem festa, sem música e com foliões em casa

Pandemia do coronavírus tirou a alegria e representa um fato nunca antes visto em uma das festas mais populares do país; em São Luís, grupos lamentam o cancelamento e calculam prejuízos

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h17
Carnaval 2020, milhares se divertiam na Beira-Mar
Carnaval 2020, milhares se divertiam na Beira-Mar

São Luís - Um Carnaval anulado, mais triste, sem as festas, desenvoltura e alegria tão comuns no período momesco. A pandemia do coronavírus, que assola o mundo e acomete milhares de pessoas no planeta, afetou costumes, obrigou as populações a desenvolverem novos hábitos, trocou a máscara de pierrô e colombina pela proteção facial imunológica e interrompe, de forma histórica, a festa mais popular do país.

Em São Luís, com a tradição antiga dos “entrudos” que marcaram o início das festas, o clima é de melancolia e, de forma irregular, populares se organizam para fazer seus “próprios” bailes, ainda que sem o consentimento do poder público que, por sua vez, promete fiscalizar.

Por causa das medidas de isolamento social, a alegria momesca – com a inclusão de foliões nas ruas e avenidas sob a justificativa de curtirem a vida de forma tresloucada, irreverente e descontraída - dará lugar à reclusão e distanciamento entre brincantes. Órgãos públicos suspenderam integralmente as programações, previstas para começar neste fim de semana e que se estenderiam até a Quarta-feira de Cinzas, no próximo dia 17.

Neste período, em tempos “normais”, os blocos estariam finalizando as fantasias, os repiques eram afinados, as baterias das escolas faziam os seus últimos ensaios, os carnavalescos ajustavam os efeitos finais das decorações e o folião comum já mandava, a essas alturas, a mensagem via rede social para o amigo, marcando aquele encontro em um dos circuitos da folia, seja no Centro Histórico ou na Beira-Mar e outros pontos. Ou acertando aquela viagem para o interior, com o embarque em um dos meios de transporte ofertados (ônibus, ferrys) ou veículo próprio.

Será um Carnaval épico por outras razões, personificado pelo lamento dos foliões que devido a este hiato quanto à promoção e participação de festas, deve utilizar o tempo para a reflexão sobre a vida, modos, comportamento e, principalmente, sobre nosso limite como ser humano e sobre nossa pequenez diante de um vírus tão mortal.

O Estado dedicará estas páginas às providências tomadas pelas autoridades públicas para sanar os prejuízos das instituições carnavalescas da cidade, sejam blocos ou escolas de samba. A cadeia produtiva (comércio e artesãos) formada por setores como bares e restaurantes e outros serviços calcula os prejuízos que, a princípio, são imensuráveis.

No entanto, neste momento, todo o sacrifício vale a pena em prol da saúde.

[e-s001]Carnaval “sem vida”: sem folia e a espera de compensações
Historicamente, conforme O Estado já contou em suas páginas, o Carnaval em São Luís é o berço das manifestações de rua e organização (ou desordem, como queiram) de pessoas que resolvem se juntar, em determinada hora do dia, para curtirem marchinhas e outras canções. Mas, em tempos de disseminação de coronavírus, estes e outros hábitos estão proibidos pelas autoridades públicas sanitárias.

O coronavírus chegou ao país no pós-Carnaval de 2020. Alguns pesquisadores acreditam que, durante as festas do ano passado, o “corona” pulava de folião em folião, inclusive na capital maranhense. Não há nenhuma comprovação científica, por enquanto, de que durante as festas anteriores, havia casos confirmados da Covid-19, seja na capital ou em outras cidades maranhenses.

No entanto, o Governo do Maranhão, desde o segundo semestre do ano passado, vem estabelecendo regras de conduta em locais públicos e se refere ao Carnaval como uma “festa inviável”. Nem mesmo a tradicional decoração nos pontos da Folia, como as Praças da Saudade, Largo do Caroçudo, na Madre Deus e em outros locais será vista, segundo garantiu a O Estado a Secretaria de Estado da Cultura (Secma), em nota.

Ainda de acordo com a pasta, a “Secma reiterou que não realizará programação este ano, não lançará decoração alusiva à festividade em nenhuma cidade do Maranhão”. Segundo a Secma, o objetivo é respeitar as regras de distanciamento social e desestimular qualquer tipo de aglomeração.

Sobre o futuro, a Secma comunicou que qualquer tipo de atividade presencial, que gere grande público, somente “voltará a ser realizada pela Secretaria com o fim da pandemia, dentro de um quadro de ampla segurança sanitária e mediante a liberação expressa das autoridades em saúde pública do Maranhão”.

Acerca de compensações para grupos culturais de Carnaval, o Governo do Maranhão informou que “novos projetos em apoio ao setor serão lançados em 2021 e a data de publicação do próximo edital está sendo estudada”.

A Prefeitura de São Luís confirmou a O Estado que as programações organizadas na Passarela do Samba, no Anel Viário, estão canceladas e somente serão retomadas com o fim da pandemia. A orientação do prefeito de São Luís, Eduardo Braide, é evitar qualquer evento que provoque ou estimule aglomerações em rua.

O secretário titular de Cultura de São Luís, Marco Duailibe, disse que a administração avalia qual a melhor forma de amparo às agremiações. “A pandemia chegou a uma proporção que requer extremos cuidados. Alguns dos nossos hospitais estão com 100% de seus leitos ocupados para o tratamento da Covid-19. Infelizmente, o nosso Carnaval, assim como as agremiações que dele fazem parte, foi afetado. Estamos agindo com responsabilidade e compromisso com a vida das pessoas”, disse.

Dentre as medidas, o Município avalia o repasse financeiro às agremiações. Tradicionalmente, blocos e escolas recebem uma contrapartida para o custeio das despesas básicas. A Prefeitura banca ainda a premiação do concurso das manifestações e arca com a montagem e desmontagem da estrutura de Passarela.

O secretário de Cultura cita o contato com as agremiações. “Não podemos promover qualquer tipo de aglomeração no atual momento, por uma questão de saúde pública. Contudo, estamos avaliando criteriosamente alternativas de apoio aos nossos grupos culturais”, disse Marco Duailibe.

O Estado apurou que, no mês passado, a pasta cultural da capital maranhense sugeriu às agremiações um Carnaval em formato virtual, no entanto, devido ao cache considerado baixo para as despesas básicas das manifestações, a proposta foi rechaçada. Algumas agremiações criaram alternativas próprias para manter ativas as programações internas.

SAIBA MAIS

A origem do Carnaval no país inicialmente se dá com o chamado “entrudo”, ou seja, com uma brincadeira que consistia pela saída de um grande grupo pelas principais ruas das cidades, onde participavam desde escravos, passando por libertos e pessoas do povo.

Com adequações sociais do fim do Império e, principalmente, a partir do declínio da atividade escravocrata, adotou-se uma linha de aceitação de igualdade entre classes.

Foi neste contexto que – com o surgimento de uma classe operária e diversificada sexualmente com a participação de mulheres – as festas típicas de Carnaval, que até então estavam confinadas apenas aos clubes ou ambientes internos, voltam para os espaços públicos. Essa mudança é também vista na capital, São Luís.

A festa mais popular do país começou a sua história na capital maranhense de forma segregadora. Foi assim o início do carnaval na cidade que, com seus costumes e características, fizeram parte de um momento histórico importante e de transição dos séculos XIX para o XX.

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