Artigo

O camaleão Alan Parker

Luiz Thadeu Nunes e Silva, Engenheiro agrônomo e viajante, já visitou 143 países em todos os continentes

Atualizada em 11/10/2022 às 12h19

No início da quarentena, quando ninguém ainda sabia o tamanho do problema, recluso em casa, foi na arte que busquei refúgio. Parafraseando o poeta Ferreira Gullar, “A arte existe pois a vida não basta”. Lançando mãos de livros, músicas, escritas e filmes, amenizei a ansiedade, tédio, medos.

Um dos primeiros filmes que assisti, na reclusão, foi “O Expresso da meia noite”, que já vira quatro vezes no antigo Cine Passeio, e em sessão de arte no Cine Eden. Dias depois foi a vez de “Mississipi em chamas”, ambos do múltiplo diretor inglês Alan Parker.

No último dia de julho, na sexta-feira, Alan Parker morreu em Londres, aos 76 anos, de doença degenerativa, segundo sua assessoria. Nascido em Londres em 1944, Parker iniciou sua carreira publicitária como redator, passando em seguida para a direção de comerciais, até chegar às telonas.

Estreou no cinema com "Quando as metralhadoras cospem" (1976), um filme de gangster com crianças (entre elas, uma iniciante Jodie Foster). “Um filme bobo”, na avaliação do exigente Parker.

Após o primeiro filme, Hollywood o contratou para dirigir um roteiro de Oliver Stone, "O expresso da meia-noite" (1978), filme que lhe rendeu sua primeira indicação ao Oscar, sucesso de crítica e bilheteira. O filme marcou a minha geração. Em entrevista no Hotel Nacional, no FestRio, Parker disse que o filme era conservador: “narra a história de um garoto americano preso por tráfico de drogas na Turquia, transformado em livro, que Oliver Stone fez o roteiro, mexendo um pouco na história”. Anos depois Parker pediu desculpa pelo “exagero da dramatização da história”. O cineasta tinha ligações com o Brasil, por diversas vezes esteve no eixo Rio-São Paulo, inclusive como jurado de festivais de cinema.

Em 1987 filmou “Coração Satânico”, com Mickey Rourke e Robert de Niro, “The Commitments” (1991), e “Vida de David Gale” (2003), seu último filme.

O cineasta também tinha afinidade com a música. Ele dirigiu Madonna na adaptação do clássico musical “Evita” para o cinema, em 1996. Com canções do inglês Andrew Lloyd Webber, a produção mostrava a vida da primeira-dama argentina Eva Perón (1919-1952).

Ainda foi responsável por “Fama”, de 1980, que mais tarde fez uma bem-sucedida transição para os palcos ao acompanhar um grupo de adolescentes numa escola de artes cênicas de Nova York.

Em parceria com o genial Roger Waters, dirigiu o clássico “Pink Floyd - The Wall”, de 1982. A produção foi criada a partir do álbum homônimo e venceu a maioria dos prêmios mundo afora. O clássico The Wall é um hino para todos os apaixonados por música. Recentemente ouvi, via YouTube, The Wall em árabe.

Em 2015, Parker anunciou sua aposentadoria dos estúdios, alegando cansaço de brigar com os magnatas de Hollywood. Se reinventou pintando quadros.

Mesmo sem nunca ter vencido o Oscar, Parker colecionou, ao longo da carreira, diversos prêmios Bafta, a maior honraria do cinema e da televisão britânicos. A primeira vitória foi com o filme para a TV “The Evacuees”, de 1975.

Nos anos seguintes, recebeu estatuetas pelo roteiro de “Bugsy Malone - Quando as Metralhadoras Cospem”, de 1976, e pela direção de “O Expresso da Meia-Noite” e de “The Commitments: Loucos pela Fama”, de 1991. O último título também lhe garantiu um Bafta de melhor filme. Em 2002 foi nomeado cavaleiro pela coroa britânica com título de Sir Alan Parker.

Sem Oscar, seus filmes foram agraciados com dez estatuetas em diferentes categorias. Em nota, após sua morte, Hollywood se rendeu ao seu talento e versatilidade, e o chamou de “Camaleão”.

Para os amantes de bons filmes e música, Alan Parker foi um gênio, que deixou um legado inigualável. Sem eu perceber, Parker estava comigo na quarentena. Na vitrola toca “The Wall”.

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