artigo

Como vai a nossa Liberdade, seu Alfred?

POLIANA RIBEIRO

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

Lembro-me de Seu Alfredo, no sobe e desce na Rua Gregório de Matos, Liberdade. Morávamos próximo, mas só fui descobrir isso quando entrei na redação de O Estado, ainda uma tímida repórter. Lembro-me dele no corre corre das pautas, mantendo a placidez diante do caos. Ele era o sorriso calmo que a gente precisava nas horas de pressão por causa do fechamento do jornal.
Era a fala tranquila, a grandeza de coração apesar do seu corpo diminuto. Seu Alfred era unanimidade entre os colegas; não se encontra quem não gostasse de seu jeito doce.

A calma e tranquilidade só eram quebradas quando tinha jogo. Aí eram explosões de fúria ou felicidade, dependendo dos lances, resultados. Era um vascaíno apaixonado (talvez seu único defeito, penso eu). Certa vez me disse que daria uma rede do Vasco para Malu. Eu pedia que fosse do Flamengo,mas ele, como bom vascaíno, implicava com o meu rubro-negro. Seu Alfred era de gestos
carinhosos, como chegar mansamente na minha mesa e colocar um bombom perto do teclado do meu computador. “Para dona Manu” (não tinha jeito, ele sempre confundia o nome da minha filha). Acarinhava a todos na redação, às vezes com uma notinha na sua coluna no jornal (eu mesma já saí algumas vezes).

Mesmo depois de ter que deixar o jornal O Estado, seu segundo lar, mantinha os laços com os antigos colegas repassando, vez ou outra, alguma informação no grupo do WhatsApp, ou mesmo perguntando do estado de saúde de algum amigo convalescente. Hoje, fomos nós, seus antigos colegas, que informamos uns aos outros sobre sua partida. Incrédulos, chorosos, perplexos. Sim, todos
iremos um dia, mas seu Alfred ainda tinha muito a zanzar pela Liberdade, com sua roupa social, seus óculos pendurados no pescoço e sua simpatia inconfundível.

As andanças pelo bairro querido, antes tão inofensivas, tiraram-lhe a vida. Seu Alfred não era de se deixar aprisionar, nem mesmo por causa de um vírus. Um pouco como tantos que julgam os riscos menores do que de fato são. Não foi culpa dele gostar
tanto daquilo que nomeava o bairro onde morava: Liberdade. Creio que ele é livre agora, em plenitude, nos braços do Pai, embora custe-nos crer que não teremos mais aquele doce sorriso. Não terei mais eventuais mensagens perguntando “Dona Poliana, como está dona Malu?”.

“E a nossa Liberdade, seu Alfred, como está?”.
Daqui pra frente ficarei sem a resposta.

Jornalista, mestra em Cultura e Sociedade, especialista em
jornalismo Cultural na Contemporaneidade

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.