Artigo

Incompetência e má fé

Atualizada em 11/10/2022 às 12h26

Meus amigos. Sabemos nós que a Justiça do Trabalho é competente para o julgamento de certos litígios que surgem da desinteligência entre patrões e empregados e as vezes em outras situações, como, por exemplo, em caso de pequena empreitada sendo o empreiteiro operário ou artífice. Mas o caso que lhes irei relatar é de absoluta incompetência da Justiça do Trabalho e má fé de dois produtores reais. Vejamos.

Com efeito, dois produtores rurais promoveram u’a ação trabalhista e afirmaram que, em razão do contrato firmado em 2002 para a engorda de aves, investiram valores obtidos por meio de financiamento para a construção de um aviário de acordo com os padrões exigidos pela Sadia. A empresa, no entanto, parou de fornecer as aves sem qualquer aviso prévio e, em dezembro de 2005, anunciou que não tinha mais interesse na continuidade da parceria.

Em sua defesa a Sadia questionou a competência da Justiça do Trabalho para julgar o caso, mas o juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) - TRT, afastaram a alegação de incompetência. Entretanto, o TRT julgou improcedente o pedido de indenização porque os produtores não haviam demonstrado as despesas efetivamente realizadas e a rescisão estava prevista no contrato.

Após o trânsito em julgado da sentença, os produtores ajuizaram ação rescisória visando desconstituir a decisão. Dessa vez, foram eles que sustentaram a incompetência da Justiça do Trabalho, alegando não se tratar de contrato de trabalho. Segundo eles, a incompetência deveria ter sido declarada de ofício pelas instâncias ordinárias.

No julgamento do recurso ordinário contra a decisão do TRT que julgou improcedente a rescisória, o relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, destacou que a incompetência da Justiça do Trabalho para o julgamento do caso é absoluta em razão do evidente cunho societário presente no contrato de parceria rural. Segundo o ministro, as características próprias desse tipo de contrato afastam a caracterização do vínculo de emprego, sobretudo pelo caráter condicional da remuneração, vinculada ao resultado. “No contrato de trabalho, a obrigação patronal de remunerar o empregado é absoluta, independentemente de lucros”, explicou.

Apesar do reconhecimento da incompetência e do provimento do recurso, o ministro Douglas Alencar Rodrigues destacou, no julgamento, que o comportamento dos produtores rurais manifestado na ação original e na ação rescisória é “absolutamente contraditório e digno de censura”. Ele assinalou que, depois de procurarem a Justiça do Trabalho requerendo indenização por perdas e danos e de ter a pretensão julgada improcedente, eles, por meio da rescisória, questionaram a competência buscando nova análise do caso pela Justiça Comum.

“Tal comportamento viola o princípio da boa-fé objetiva, da lealdade processual e da vedação ao comportamento contraditório”, afirmou. Segundo o relator, a configuração da litigância de má-fé não impede o provimento do recurso porque a incompetência material da Justiça do Trabalho é questão de ordem pública. “Isso não os exime, todavia, do pagamento das multas previstas nos artigos 17 e 18 do Código de Processo Civil de 1973”, concluiu.

Assim a (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho - TST declarou a incompetência da JT para julgar pedido de indenização por perdas e danos decorrentes da rescisão de contrato de parceria rural firmado entre a Sadia S. A. com os produtores rurais. Embora declarando nulos todos os atos decisórios anteriores praticados no processo, a SDI-2 aplicou multa por litigância de má-fé aos produtores, que ajuizaram a ação rescisória com fundamento na incompetência de um juízo pelo qual eles próprios haviam optado. Até a próxima.

Prof. Dr. Fernando Belfort

E-mail: fbelfortadv@hotmail.com


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