Artigo

Combatendo a corrupção?

Atualizada em 11/10/2022 às 12h32

Com a divulgação do Índice de Percepção da Corrupção (CPI/2017), da ONG Transparência Internacional, parece que caminhamos a passos largos para nos tornar o país mais corrupto do mundo nos próximos 5 anos. É dizer, mantida em progressão aritmética a atual queda de posições no ranking, dentro de um quinquênio chegaremos à derradeira 180ª posição, atualmente ocupada pela Somália.

A resistência patrimonialista às iniciativas anticorrupção também robusteceu a piora da nota e posição brasileiras no CPI/2017, a exemplo da desfiguração pelo Congresso Nacional das 10 Medidas contra a Corrupção propostas pelo Ministério Público Federal (PLC nº 80/2016), elaboradas pelos responsáveis pela Operação Lava-Jato, inobstante o caráter acentuadamente punitivista das sugestões.

Vislumbra-se que o debate anticorrupção no Brasil encontra-se estribado em convicções sedimentadas exclusivamente sobre pessoas e penas. E, há de se envidar esforços cognitivos para discernir entre a prevenção de causas estruturantes e o enfrentamento aos efeitos da corrupção. As iniciativas legislativas que em geral gozam de popularidade direcionam-se aos efeitos (ex post facto), com viés repressivo-punitivo que não a evita, mormente voltado à responsabilização. Trata-se do combate simbólico, exemplar, específico e isolado, razão pela qual com baixo índice de reposição ao Erário e controverso poder dissuasório.

Sobreleva atentarmos, pois, para a magnitude das reformas institucionais vocacionadas à consolidação de tessitura republicana e democrática de promoção da transparência e da integridade no setor público. No dizer de Klitgaard, autor de famosa fórmula anticorrupção, falta aprimorar o “accountability”. Assim, exsurgem propostas alvissareiras, dentre as quais: 1) a abolição dos cargos em comissão, para que tenhamos uma Administração Pública integralmente profissional e permanente, avessa às sinecuras e negociatas de campanha eleitoral. Isso foi feito por Frederik III na Dinamarca do século XVII, que inovou nas admissões de servidores com base no mérito e não mais nos títulos de nobreza, objetivando aprimorar a arrecadação de tributos durante guerra com a Suécia; 2) a modificação dos critérios de composição dos Tribunais de Contas, para assegurar independência ao controle externo sobre gastos públicos, fulminando as premiações com cargos para políticos em final de carreira; 3) a autonomia administrativa, técnica e orçamentária da Advocacia Pública, para permitir o livre e desembaraçado controle de legalidade dos atos administrativos (PEC nº 82/2007); 4) a melhoria do sistema eleitoral, para permitir isonomia e barateamento das campanhas (v.g. vedação do financiamento privado e voto distrital misto); e 5) o combate aos privilégios de detentores de mandatos eletivos, inclusive as sucessivas reconduções, para desestimular da vida pública os arrivismos de toda ordem.

Essas providências ilustrativas atuariam na etiologia (ex ante facto), de modo complementar às punições simbólicas, impedindo na gênese a configuração de atos de corrupção. Portanto, não nos enganemos: somente as medidas de índole promocional impedem os desvios de recursos públicos, pois as medidas repressivo-punitivas geram efeitos sem imediatismo e ocorrem, como reza o ditado, “quando o leite já está derramado”. Enfim, há muito a fazer até 2022! Se falharmos, o Brasil tornar-se-á uma “Malebolge” (vala maldita) ou um “Lago Cocite” (abismo de Lúcifer), localidades alegóricas do inferno de Dante reservadas, respectivamente, aos corruptos e traidores.

Heron Garcez

Advogado e pesquisador do Mestrado em Direito e Instituições do Sistema de Justiça da Universidade Federal do Maranhão - UFMA

E-mail: herongarcez@hotmail.com

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