Artigo

Educação, escola e libertação

Atualizada em 11/10/2022 às 12h33

Nos dias atuais, o ser humano já paga alto preço por não saber operar uma calculadora, um celular, um smartphone. Como pensar sair à rua, andar por um shopping sem poder ter acesso à informação escrita, sem interpretar a sinalização, um cardápio, um atendimento eletrônico? Pior que isso é não saber ler ou escrever. Como Pedagoga e Professora da área de Educação na formação de Professores, vejo essa questão com bastante preocupação.

A título de ilustração, recupero na memória um episódio vivido na fase da minha militância no movimento sindical quando por meio do meu Sindicato apoiávamos uma mobilização de trabalhadores rurais na sede do Incra e ali pude observar uma cena comovente. Falas e palavras de ordem agitavam o público, mas não chegava a incomodar um militante sentado no meio fio, com o olhar fixo no jornal como se estivesse a fazer uma leitura da melhor notícia do dia. Me aproximei daquele leitor concentrado e logo vi que o Jornal estava de cabeça para baixo. A cena causou em mim uma grande emoção. Então refleti sobre quanta falta faz ao ser humano a sua escolarização. Disfarçando, afastei-me do compenetrado “leitor” que permaneceu por mais um tempo iludido de estar se inteirando do que se passava no mundo.

Era hora de perguntar, onde estavam as políticas públicas de Educação que deixaram de fora aquele trabalhador? Que escola não o recebeu ou o expulsou? Como ser capaz de lutar e reivindicar direitos e liberdade, com apenas uma leitura ingênua e parcial do mundo? Foram muitas as reflexões e questionamentos que aquela cena patética deflagrara em mim, sentindo o descaso de governantes com direitos à educação, numa perspectiva libertadora que, sem ela, faz desses homens e mulheres, “massa de manobra”.

O meu leitor anônimo voltou para sua terra sem sequer ter notado a minha presença. Por sua condição de analfabeto, talvez nem tenha a dimensão da luta da sua classe. Quanto a mim, saí dessa experiência com um propósito de representar a todas as Marias e Josés nos espaços onde seja possível reivindicar para eles, a escolarização que reflita conquistas de cidadania e que seja capaz de elevar a consciência de cada um a patamares críticos, a uma visão de mundo esclarecida para perceber a necessidade das grandes mudanças que o mundo ainda precisa fazer para se tornar mais humano e justo, com liberdade.

Portanto, não me refiro a qualquer “educação”, mas à Educação Humana, que se oponha a unilateral, absoluta no processo de formação de pessoas. Aquela que concebe o educando em sua omnilateralidade. Logo, não será qualquer escola que poderá cumprir esse papel, mas, aquela que se comprometa com a educação dos alunos nas suas múltiplas dimensões, ou seja, uma educação integral, com o signo libertador.

Finalizo parafraseando o grande educador Paulo Freire, para quem Educação guarda estreita relação com o humanismo crítico, um humanismo que, recusando tanto o desespero quanto o otimismo ingênuo, é, por isto, esperançosamente crítico. E sua esperança crítica repousa numa crença também crítica: a crença em que, fazendo e refazendo as coisas; podem transformar o mundo, os homens podem superar a situação em que estão sendo um quase não ser e passar a ser um estar sendo em busca do ser mais. Essa seria a contribuição da educação, através das escolas onde professores e alunos gozem da liberdade de se tornarem um ser mais.

Marise Piedade Carvalho

Doutoranda do Programa de Pós graduação em Educação em Ciências e Matemática. professora de educação do Instituto Federal do Maranhão IFMA, Campus Monte Castelo

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