Manipulação de resultados

Sinal, pênalti e cobrança: veja detalhes da investigação sobre zagueiro do Sampaio Corrêa e quatro ex-atletas do clube

Cinco atletas que defenderam o Tricolor na Série B de 2022 viraram réus após investigação do Ministério Público de Goiás.

Gustavo Arruda / Imirante Esporte

Atualizada em 17/03/2023 às 04h19
Allan Godói, zagueiro do Sampaio Corrêa, se tornou réu em investigação do MP-GO. (Foto: Ronald Felipe / Sampaio Corrêa FC)
Allan Godói, zagueiro do Sampaio Corrêa, se tornou réu em investigação do MP-GO. (Foto: Ronald Felipe / Sampaio Corrêa FC)

SÃO LUÍS - Em denúncia apresentada na tarde de quinta-feira (16), o Ministério Público de Goiás (MP-GO) deu detalhes sobre a participação de cinco atletas que defenderam o Sampaio Corrêa no Campeonato Brasileiro Série B de 2022 em uma suposta manipulação de resultados em jogos da última rodada da competição, com o objetivo de favorecer apostadores esportivos. De acordo com as investigações, os jogadores são os zagueiros Allan Godói e Paulo Sérgio, o lateral-direito Mateusinho, o volante André Luiz e o atacante Ygor Catatau. O caso foi inicialmente revelado pelo jornal O Popular, de Goiânia, e posteriormente confirmado pelo Imirante Esporte junto ao MP-GO.

A manipulação teve início com Luís Felipe Rodrigues de Castro, integrante do grupo de apostadores, entrando em contato com Ygor Catatau para que algum atleta do Sampaio Corrêa cometesse um pênalti durante o primeiro tempo do jogo entre o Tricolor e Londrina, no dia 5 de novembro, pela 38ª e última rodada da Série B. Luís Felipe prometeu um pagamento de R$ 150 mil, sendo que R$ 10 mil foram pagos antecipadamente como "sinal": de acordo com dados obtidos pelo MP-GO, o dinheiro foi depositado na conta do zagueiro Paulo Sérgio, que foi relacionado para a partida, mas não entrou em campo.

Apostadores conversam sobre atletas do Sampaio Corrêa. (Foto: MP-GO)
Apostadores conversam sobre atletas do Sampaio Corrêa. (Foto: MP-GO)

Em interrogatório, Paulo Sérgio negou participação no esquema de manipulação de resultados, disse que o pagamento poderia ter origem em jogos de pôquer e afirmou que não se recorda de participar de qualquer grupo para debater sobre apostas.

Dinheiro depositado na conta do zagueiro Paulo Sérgio. (Foto: Divulgação / MP-GO)
Dinheiro depositado na conta do zagueiro Paulo Sérgio. (Foto: Divulgação / MP-GO)

"Paulo Sergio diz que joga pôquer no Brasil inteiro, inclusive com Mateusinho, André Luiz e todos os meninos aí; e as vezes entra dinheiro na conta de um ou dois mil; sobre grupo de WhatsApp com outros jogadores, não lembra pois afirma que era de jogar videogame, pôquer, a respeito disso, mas nada de aposta; afirma que fazia alguma fé, mas jogava mais pôquer e videogame; não recorda do teor das conversas e reforça que não jogou a partida”, diz o depoimento de Paulo Sérgio ao MP-GO.

"Ficou lindo para o Mateusinho"

Na partida contra o Londrina, Mateusinho foi titular do Sampaio Corrêa e cometeu um pênalti aos 19 minutos do primeiro tempo, derrubando o meia Mossoró na grande área. Inicialmente, a arbitragem não assinalou a falta, o lance seguiu, e Gabriel Poveda marcou um gol a favor do Sampaio, porém, o árbitro Felipe da Silva Gonçalves Paludo anulou a jogada e marcou o pênalti cometido por Mateusinho após consulta ao árbitro de vídeo (VAR). A cobrança de Carpini, no entanto, foi defendida pelo goleiro Luiz Daniel. Na sequência da partida, o Londrina abriu o placar, mas o Sampaio Corrêa virou o jogo e venceu por 2 a 1.

Apostadores comentam pênalti cometido por Mateusinho. (Foto: Divulgação / MP-GO)
Apostadores comentam pênalti cometido por Mateusinho. (Foto: Divulgação / MP-GO)

Na conversa de WhatsApp obtida pelo MP-GO, os apostadores Ícaro dos Santos e Bruno Lopez de Moura acompanharam os jogos manipulados. Bruno revela a Ícaro que fechou com Ygor Catatau, e que o atacante fecharia com outro jogador do Sampaio Corrêa. Em conversa com outro interlocutor, eles mencionam que “ficou lindo para o Mateusinho” pois o “cara errou”, referindo-se ao pênalti desperdiçado pelo Londrina.

Cadê o dinheiro?

Depois da partida, Mateusinho, Paulo Sérgio e Ygor Catatau passaram a cobrar os apostadores sobre os R$ 140 mil restantes. As conversas no grupo de WhatsApp, que foi criado por André Luiz e contava ainda com Allan Godói, foram descobertas após a Polícia Civil apreender o celular de Mateusinho e fazer uma análise preliminar.

Grupo criado pelos cinco atletas do Sampaio Corrêa. (Foto: MP-GO)
Grupo criado pelos cinco atletas do Sampaio Corrêa. (Foto: MP-GO)

No grupo, os cinco jogadores então vinculados ao Sampaio Corrêa conversaram sobre a expectativa de receber o dinheiro, a existência da dívida e como seria feita essa cobrança. Os atletas manifestaram, por mais de uma vez, que teriam cumprido com sua parte no esquema ao cometer o pênalti e esperavam receber todo o valor prometido. "Se dá errado, nossa vida tava um inferno!", escreveu Paulo Sérgio.

Conversa entre jogadores do Sampaio Corrêa no WhatsApp após jogo contra o Londrina. (Foto: MP-GO)
Conversa entre jogadores do Sampaio Corrêa no WhatsApp após jogo contra o Londrina. (Foto: MP-GO)

Ygor Catatau fez o contato com Luís Felipe Rodrigues e realizou diversas cobranças, porém, o apostador explicou ao atacante que o êxito completo do esquema na última rodada da Série B dependia de um pênalti em um jogo do Vila Nova, o que não ocorreu. Luís Felipe disse a Ygor Catatau que o grupo de apostadores teve um elevado prejuízo, estimado em R$ 492 mil, e que esperavam receber esse valor de um jogador do time goiano para poder quitar a dívida.

Atletas planejam cobrança a grupo de apostadores. (Foto: MP-GO)
Atletas planejam cobrança a grupo de apostadores. (Foto: MP-GO)
Grupo cobra apostador por dinheiro. (Foto: MP-GO)
Grupo cobra apostador por dinheiro. (Foto: MP-GO)
Apostador justifica falta de pagamento. (Foto: MP-GO)
Apostador justifica falta de pagamento. (Foto: MP-GO)

Denúncia

Allan Godói, Paulo Sérgio, Mateusinho, André Luiz e Ygor Catatau foram denunciados pelo crime de corrupção ativa em competições esportivas, previsto no Art. 41-C do Estatuto do Torcedor, com pena de prisão de dois a seis anos e multa para quem "solicitar ou aceitar, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem patrimonial ou não patrimonial para qualquer ato ou omissão destinado a alterar ou falsear o resultado de competição esportiva ou evento a ela associado". Os denunciados terão 10 dias para apresentarem defesa.

Além dos cinco jogadores que estavam no Sampaio Corrêa em 2022, o MP-GO denunciou seis apostadores e outros três atletas: os meio-campistas Romário e Gabriel Domingos, ligados ao Vila Nova, e o defensor Joseph, que defendeu o Tombense na última Série B e está afastado do clube desde a revelação do caso. As investigações apontam que o grupo especializado em fraudes relacionadas a apostas esportivas atuou em pelo menos três partidas da última rodada da Série B de 2022: Sampaio Corrêa 2 x 1 Londrina, Vila Nova 0 x 0 Sport, e Criciúma 2 x 0 Tombense.

Investigação começou ainda em 2022

O MP-GO iniciou a investigação de manipulação de resultados na Série B em novembro de 2022, poucos dias após o encerramento da competição, graças a uma denúncia de Hugo Jorge Bravo, presidente do Vila Nova. No dia 14 de fevereiro, a Operação Penalidade Máxima foi deflagrada com mandados de busca e apreensão: na ocasião, o único ex-jogador do Sampaio Corrêa a ser alvo da operação foi o lateral Mateusinho, que já tinha saído da Bolívia Querida para defender o Cuiabá. Paulo Sérgio, Allan Godói, André Luiz e Ygor Catatau viraram réus no decorrer do processo, após a investigação apreender o celular de Mateusinho e descobrir conversas do quinteto no WhatsApp sobre o esquema.

Dos cinco atletas que estavam no Sampaio Corrêa em 2022 e foram citados pelo MP-GO na denúncia de manipulação de resultados, apenas o zagueiro Allan Godói continua no clube. Paulo Sérgio está no Operário Ferroviário, Mateusinho acertou transferência para o Cuiabá, André Luiz fechou com o Ituano, e Ygor Catatau foi para o Irã, onde defende o Sepahan. 

O Sampaio Corrêa ainda não se manifestou sobre a atualização da investigação do MP-GO em relação a Allan Godói e a quatro ex-atletas do clube. Em fevereiro, quando Mateusinho foi alvo da Operação Penalidade Máxima, a Bolívia Querida manifestou apoio às investigações, ressaltou que não compactua com fraudes no futebol e cobrou punição aos responsáveis.

Defesa

O advogado Ricardo Braga dos Santos, que defende Ygor Catatau, enviou uma nota ao jornal O Popular, onde afirma que o jogador “nega as acusações que lhe foram impostas e que jamais participou de qualquer tentativa de manipulação de resultado dos jogos da Série B”. Ygor Catatau afirmou ainda que sua inocência “será provada na Justiça”.

A defesa do lateral-direito Mateusinho, por sua vez, disse que ainda não acessou os autos do processo e vai se pronunciar após tomar conhecimento dos temas relatados.

A reportagem não conseguiu contatos de Paulo Sérgio, Allan Godói e André Luiz, nem de suas respectivas defesas até a última atualização. O espaço está aberto e a matéria será atualizada assim que houver uma manifestação.

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