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EC nº 105/2019: um novo desafio sobre o controle dos recursos

Atualizada em 11/10/2022 às 12h21

Entre tantos desafios envolvendo o controle dos recursos públicos, surge o repasse de emendas individuais ao Orçamento Federal para Estados, DF e Municípios, haja vista a recente modificação, advinda com a Emenda Constitucional nº 105/2019, promulgada em 12/12/19, e já em vigor desde 1º/1/20.

A EC 105/19 acrescentou o artigo 166-A à CF/88, instituindo duas novas modalidades de transferências: -Transferência Especial e a Transferência com Finalidade Definida. A primeira foi criada com uma natureza jurídica nova, que não se amolda completamente à natureza das transferências constitucionais obrigatórias (a exemplo do FPM ou do FPE) tampouco às voluntárias (tais como convênios), apesar de ter com cada uma destas alguns pontos de semelhança.

A nova transferência especial tem natureza e traços próprios, autorizando o repasse direto de recursos para as contas do FPM e do FPE, dos entes beneficiados, indicados pelos parlamentares, sem exigir firmar convênio ou outro instrumento. Adotou-se forma menos burocrática, de repasse mais célere, permitindo que recursos de fontes e regras de uso diferentes sejam misturados numa mesma conta bancária. E, ainda, incorpora tal recurso ao patrimônio do ente beneficiado desde o ato da transferência, deixando a competência de fiscalização destes a cargo dos órgãos estaduais ou municipais de controle (Tribunais de Contas dos Estados, DF e Municípios), sem fixar uma regulamentação.

Tal previsão discrepa totalmente do rito anteriormente utilizado para tais repasses, das “transferências voluntárias” (artigo 25 da LRF), que exige condições, que auxiliam no controle, como: a apresentação e submissão à aprovação de projeto e plano de trabalho; assinatura de instrumentos; abertura de conta específica; monitoramento pelo SINCOV; prestar contas em prazo e forma próprios; etc. Conservam a natureza de recurso federal e, por isso, são fiscalizados pelos órgãos de controle federais, com regras já implementadas.

Tais mudanças, representam alteração de regras de controle, sem regulamentação prévia e sem garantia de que serão mais eficientes à sociedade. Além disso, sugere a dispensa, desta nova modalidade, da limitação que é imposta às transferências voluntárias em ano eleitoral (intransferíveis 3 meses antes do pleito - Artigo 73, inc. VI, a, Lei nº 9.504/97), o que preocupa os órgãos de controle, por aparentar ser uma forma mais propícia à malversação dos recursos.

O próprio art. 2º da nova EC estipula que, pelo menos, 60% de tais transferências devam ser executadas ainda no 1º semestre deste ano, que é ano eleitoral, sem definir se haverá proibição de repasse dos outros 40% nos 3 meses que antecede o pleito, como é restringido aos casos das transferências voluntárias.

A nova transferência especial precisa de regras próprias sobre prazo e forma de prestar contas, que sejam diferentes das aplicáveis aos recursos de FPM ou FPE, pois apesar de entrarem diretamente nas contas destes, diferem deles na forma de como gastá-los ou de como devem ser somados à receita. As transferências especiais, por exemplo, devem ser gastas, pelo menos, 70% com despesas de capital (ex: obras).

São muitas as peculiaridades que merecem maior reflexão e análise por parte dos órgãos de controle, bem como do Ministério Público, a fim de que, o quanto antes, adaptem-se a essas novas regras e estabeleçam normas e instrumentos que permitam o controle destes repasses, que passarão a ser transferidos de forma direta desde já.

Débora Coelho Costa

Assessora do Ministério Público de Contas do TCE-MA, bacharel em Direito pela UFMA, pós-graduada em Direito Constitucional Aplicado pelo UniCeuma

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