Golfo de Omã

Irã, Rússia e China realizam exercícios navais inéditos

Manobras que reúnem os três países pela primeira vez têm como objetivo ''garantir a segurança coletiva''; região esteve à beira de um conflito em 2019; os exercícios, chamados de "Parceiro Sincero 2019", devem durar quatro dias

Atualizada em 11/10/2022 às 12h21
Barco de patrulha da Guarda Revolucionária iraniana patrulha a embarcação britânica Stena Impero
Barco de patrulha da Guarda Revolucionária iraniana patrulha a embarcação britânica Stena Impero (Reuters)

Legenda/Reuters
Barco de patrulha da Guarda Revolucionária iraniana patrulha a embarcação britânica Stena Impero

TEERÃ — Rússia, Irã e China começam na sexta-feira,27, um exercício militar inédito em águas que, este ano, foram marcadas pela iminência de um conflito de grandes proporções: a região entre o Golfo de Omã, porta de entrada do Golfo Pérsico, e o norte do Mar da Arábia. É o primeiro exercício na região envolvendo os três países — China e Irã já realizaram manobras do tipo em 2017.

As manobras, chamadas de “Parceiro Sincero 2019”, devem durar quatro dias e foram anunciadas em outubro. Na época, o chanceler russo, Sergei Lavrov, afirmou que o objetivo era colocar em prática técnicas contra terrorismo e pirataria, algo corroborado pelo chefe da Marinha iraniana, almirante Hossein Khanzadi.

"O objetivo desses exercícios é para garantir a segurança coletiva e ajudar a aumentar a segurança na parte norte do Oceano Índico, onde vários incidentes, incluindo ataques de piratas, estão ocorrendo", afirmou à agência iraniana Tasnim, em novembro.

Já o porta-voz do Ministério da Defesa chinês, Wu Qian, declarou que as manobras servirão também para “aprofundar as trocas e cooperação entre as Marinhas dos três países”.

" Eles (os exercícios) não estão necessariamente contectados a uma situação regional".

Ele ainda revelou que os chineses enviarão à área o destróier Xining, conhecido por sua capacidade de lançamento de mísseis antiaéreos e de precisão. Os exercícios acontecerão entre os dias 27 e 30 de dezembro.

Teerã tem aumentado a cooperação militar com Pequim e Moscou em meio às fortes sanções econômicas americanas retomadas após o governo de Donald Trump se retirar do acordo nuclear entre o Irã e potências ocidentais — assinado por seu antecessor, Barack Obama. Visitas de enviados da Marinha do Rússia e da China ao Irã aumentaram nos últimos anos.

Ano de tensões

O Golfo de Omã, área compartilhada por Omã, Emirados Árabes Unidos, Paquistão e Irã, é o ponto de entrada para as embarcações que chegam ao Golfo Pérsico, área por onde passam cerca de 20% de todo o petróleo do planeta e 35% de todos os carregamentos feitos por via marítima. Uma região vital para a economia do planeta, mas desde meados do século VII a.C., quando piratas assírios atacavam mercadores vindos do Oceano Índico, é considerada de alto risco.

Em meio à tensão no Golfo Pérsico, países dizem que manobras servem como preparação para ameaças, além de incrementar a cooperação. Em tempos mais recentes, além da pirataria, as embarcações estão sujeitas às (muitas) intempéries políticas da região. Nos anos 1980, no auge da guerra Irã-Iraque, ataques contra petroleiros eram cenas constantes, seja pelas forças iraquianas, de Saddam Hussein, seja pelo Irã, país que se considera uma espécie de “guardião” do Golfo de Omã e do Estreito de Ormuz. As ameaças de bloqueio desta faixa de navegação eram constantes.

Desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca, em 2017, e sua política de pressão sobre o Irã, as águas do Golfo de Omã se tornaram cada vez mais perigosas. As patrulhas iranianas, conhecidas por seu comportamento que beirava a provocação, passaram a andar cada vez mais perto de navios militares americanos e embarcações internacionais. Com a saída dos EUA do acordo sobre o programa nuclear do país, em 2018, e o virtual bloqueio à todas exportações de petróleo iraniano, em abril de 2019, a situação se deteriorou de forma rápida.

Primeiro o que eram ameaças se tornaram ataques diretos, como em maio e junho, quando petroleiros foram atacados com explosivos perto do Estreito de Hormuz, em incidentes creditados a Teerã mas jamais assumidos pelo governo. As imagens dos navios em chamas trouxeram à memória a chamada “Guerra dos Petroleiros”, em 1987 e 1988, e renovaram o temor de um conflito de grande escala entre inimigos de quatro décadas, Irã e EUA. O Pentágono aumentou o contingente militar na região e os discursos ficavam cada vez mais violentos. Na época, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, disse que somente iria negociar com Teerã se o governo “começasse a se portar como um país normal”.

Dez minutos antes

O ápice da tensão, contudo, não viria pelo mar. Em 20 de junho, um drone americano foi abatido pelos sistemas de defesa aérea do Irã, após ser acusado de invadir o espaço aéreo do país. Um ataque de retaliação dos EUA chegou a ser aprovado pelo presidente Trump, que, segundo relatos do New York Times, desistiu da ação dez minutos antes, com os aviões já no ar. Segundo o jornal, ele recuou diante das estimativas de mortos no Irã, por volta de 150.

Um mês depois, um drone iraniano foi derrubado por um navio dos EUA, mas a guerra indireta ganhava um novo front. No começo de julho, um petroleiro usado pelo Irã, o Grace 1, foi interceptado perto da costa de Gibraltar, acusado de transportar combustível para a Síria, o que violaria as sanções da União Europeia contra Damasco.

Uma retaliação era dada como certa, e no dia 20 o Stena Impero, que opera a serviço do Reino Unido, foi capturado perto do Estreito de Ormuz, acusado de colidir com uma embarcação iraniana. Um segundo navio também foi interceptado mas liberado horas depois. Os casos foram resolvidos após mediação de vários países e as tripulações acabaram seguindo viagem.

Embora não relacionado ao Golfo de Omã, o último capítulo de um ano marcado pela iminência de um conflito ocorreu em setembro, quando drones e mísseis atingiram uma das principais unidades petrolíferas da Arábia Saudita. O Irã foi imediatamente acusado, muito embora não tenha assumido responsabilidade. Novas sanções foram aplicadas contra o país, incluindo contra altos integrantes do regime e entidades ligadas ao governo.

Mensagem aos EUA

Além de cumprir os seus objetivos oficiais o “Parceiro Sincero 2019” serve como uma mensagem política para a região, especialmente por parte dos chineses. O país era um dos principais compradores do petróleo iraniano antes da imposição de sanções pelos EUA e seguiu com as importações mesmo com os bloqueios, embora em volume bem menor. Em maio, Pequim deu uma dura declaração contra as sanções, dizendo que elas eram uma “jurisdição de braço longo” e apoiando o direito do Irã de “salvaguardar seus legítimos direitos e interesses”.

O exercício também pode ser visto como uma resposta à iniciativa americana de criar uma coalizão internacional para patrulhar as águas da região e vista pelos iranianos como mais uma forma de pressão sobre o país.

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