SÃO LUÍS – Por meio da Procuradoria-Geral do Município (PGM), a Prefeitura de São Luís ingressou com um recurso extraordinário no Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) solicitando ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma nova análise da constitucionalidade da lei municipal que reajustou o salário do prefeito Eduardo Braide (PSD) de R$ 25 mil para R$ 38 mil e redefiniu o teto do funcionalismo público municipal
O objetivo é reverter uma decisão do TJMA que considerou válida a norma aprovada pela Câmara Municipal. A decisão afeta a remuneração de controladores e auditores fiscais em São Luís (entenda mais abaixo).
No pedido, a Prefeitura sustenta que a lei é inconstitucional tanto no aspecto formal - por supostos vícios no processo legislativo - quanto no aspecto material, devido a um impacto financeiro estimado em R$ 28.851.409,37 por ano, segundo alega a Prefeitura.
As alegações da Prefeitura
A Procuradoria Geral do Município (PGM) afirma que a tramitação da lei desrespeitou regras constitucionais obrigatórias, especialmente no que diz respeito à anterioridade da legislatura e à falta de estudo prévio de impacto.
Anterioridade da legislatura
O Município argumenta que a Constituição exige que a fixação do subsídio de agentes políticos valha apenas para a legislatura seguinte. Embora a votação tenha ocorrido em 2024, a lei só foi promulgada em 26 de março de 2025 e publicada em abril, já na legislatura em curso. Para a Prefeitura, a fixação só se completa com a publicação - e, por isso, a norma violaria o princípio da previsibilidade.
Ausência de estudo prévio de impacto
Outro ponto contestado é a falta de um estudo de impacto orçamentário efetivamente apresentado durante a tramitação. A Procuradoria afirma que o documento técnico da Câmara foi assinado sete minutos antes do autógrafo ser encaminhado ao Executivo, o que indicaria que os vereadores deliberaram sem acesso prévio à análise financeira, contrariando o art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
Uso inadequado de “emenda”
A Prefeitura também critica a técnica legislativa utilizada. A lei que reajustou o subsídio foi aprovada como uma “emenda” para alterar a Lei nº 7.701/2024, já sancionada e publicada. Segundo o recurso da Prefeitura, uma emenda serve para alterar projetos de lei em tramitação, não leis já vigentes, o que configuraria vício formal insanável.
Inconstitucionalidade material
O Município também aponta desproporcionalidade no novo valor do subsídio. Com o reajuste, o salário do prefeito de São Luís ficou em R$ 38 mil, apenas R$ 39 abaixo do subsídio do prefeito de São Paulo, a maior capital do país.
A Procuradoria argumenta que esse patamar não condiz com a realidade econômica, populacional e arrecadatória de São Luís, e que o valor gera risco real de um “efeito cascata” sobre o teto remuneratório de todo o funcionalismo municipal.
Segundo o recurso, essa elevação poderia comprometer a saúde financeira do Município e atingir áreas essenciais como saúde, educação e previdência.
Decisão do TJMA e pedido subsidiário
No julgamento contestado, o TJMA entendeu que:
- o ato de fixar subsídio ocorre no momento da votação, não da publicação;
- o valor de R$ 38 mil é inferior ao subteto anterior (R$ 41.845,49);
- não há desproporcionalidade evidente no reajuste.
Caso o STF mantenha a constitucionalidade da lei, a Prefeitura pede que a aplicação financeira da decisão seja apenas prospectiva para evitar pagamento retroativo e risco de desequilíbrio fiscal.
A origem do impasse salarial
O conflito teve início em novembro de 2024, quando decisões judiciais relacionadas ao teto constitucional provocaram reduções significativas nos vencimentos de auditores fiscais, controladores e outras categorias que recebiam acima do limite municipal.
Até então, esses servidores ganhavam cerca de R$ 37,5 mil, valor superior ao salário do prefeito, que é de R$ 25 mil. O pagamento acima do teto ocorria devido a uma emenda na Lei Orgânica Municipal que vinculava o limite ao salário de desembargadores do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA).
Porém, em novembro de 2024, o TJ-MA declarou a emenda inconstitucional e determinou que o teto salarial deve seguir o Estatuto dos Servidores Municipais - que proíbe qualquer servidor de ganhar mais que o prefeito. A decisão representou corte de aproximadamente R$ 12,5 mil para diversas categorias.
Desde então, sindicatos e entidades passaram a contestar os cortes na Justiça e a cobrar do Executivo a aplicação das leis municipais específicas que regem as carreiras, alegando que as reduções violam normas vigentes.
Para tentar solucionar o impasse, vereadores de oposição promulgaram, em dezembro de 2024, a Lei nº 7.729/2025, que reajustou os salários do prefeito, vice-prefeita e secretários municipais a partir de 2025 e redefiniu o teto remuneratório no município.
A norma elevaria o salário do prefeito para R$ 38 mil, aproximando-o da remuneração que os auditores recebiam antes dos cortes. A vice passaria a receber R$ 22 mil, e os secretários, R$ 22 mil.
A lei incluía ainda um parágrafo permitindo que o chefe do Executivo renunciasse ao próprio salário, devolvendo o valor aos cofres públicos. Eduardo Braide, no entanto, acionou a Justiça contra o reajuste, afirmando que o aumento não seria devido e que poderia gerar despesas extras ao município.
Servidores contestam essa interpretação e alegam que, ao não aplicar o novo teto, o prefeito manteve cortes considerados ilegais mesmo após a vigência da lei - o que, segundo eles, fere princípios da legalidade e da isonomia.
No STF, Dino rejeitou argumento do Ipam e afirmou que lei do teto segue válida
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), confirmou em agosto um entendimento jurídico que favorece os auditores fiscais de São Luís.
Dino analisou uma reclamação apresentada pelo Instituto de Previdência e Assistência do Município (Ipam) de São Luís. O órgão contestava decisão da 7ª Vara da Fazenda Pública, que havia determinado o imediato cumprimento da Lei nº 7.729/2025, responsável por reajustar o subteto salarial no município.
O Ipam alegou que a decisão local contrariaria um entendimento do ministro André Mendonça, que suspendeu a aplicação de leis sobre revisão geral anual de subsídios em diversas cidades. A gestão municipal argumentava que o teto de São Luís estaria incluído nesse escopo.
Flávio Dino descartou a tese. Segundo o ministro, a lei que redefiniu o teto municipal permanece válida e deve ser aplicada enquanto não houver revogação ou declaração de inconstitucionalidade.
“Verifico que, pelo princípio da continuidade normativa, a Lei n. 7.729/2025 permanece em vigor até que sobrevenha sua revogação ou seja declarada a inconstitucionalidade. Portanto, o novo teto municipal deve ser aplicado”, afirmou Dino.
Para o ministro, a situação de São Luís “não guarda identidade material” com o processo analisado por Mendonça, afastando a tentativa de vincular o caso à suspensão nacional de leis de revisão geral anual.
Denúncia na Câmara pede a cassação do mandato de Braide
A Câmara Municipal de São Luís deve analisar futuramente um pedido de cassação do prefeito Eduardo Braide (PSD) por suposta infração político-administrativa e crime de responsabilidade. A denúncia envolve cortes salariais a servidores municipais e acusa o prefeito de descumprir a legislação local.
Braide nega qualquer irregularidade, classificando o caso como motivação política.
A representação é assinada pelo auditor fiscal aposentado Carlos Alberto Machado, que atua em nome de cerca de 400 auditores e controladores. O documento acusa o prefeito de:
- Descumprir leis municipais, especialmente a Lei nº 7.729/2025;
- Aplicar o teto salarial de forma seletiva, mantendo cortes considerados ilegais;
- Causar prejuízo financeiro a servidores, aposentados e pensionistas desde novembro de 2024;
- Cometer suposta infração político-administrativa e crime de responsabilidade.
A denúncia foi encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e à Comissão de Orçamento para análise prévia, antes da votação em plenário.
A defesa de Eduardo Braide
Em um vídeo divulgado nas redes sociais, Braide afirmou que o pedido de cassação tem caráter político e seria motivado por sua recusa em aceitar o reajuste definido na lei promulgada pela Câmara.
"Essa semana entraram com um pedido de cassação do meu mandato. Sabem por quê? Justamente porque eu não aceitei aumentar o meu salário. Parece brincadeira, mas é verdade", disse o prefeito.
O que diz a Câmara Municipal
A Câmara informou que recebeu a representação na última terça-feira (2), protocolada por um auditor aposentado e apoiada por um grupo de aproximadamente 400 servidores.
O documento aponta suposto descumprimento da Lei nº 7.729/2025 e cortes considerados ilegais nos vencimentos de servidores, além de alegar prejuízos financeiros ao município e possíveis irregularidades que também estão sendo avaliadas pelo Tribunal de Contas do Estado.
A tramitação segue os ritos do Decreto-Lei 201/67, que trata da responsabilidade de prefeitos, garantindo contraditório, ampla defesa e transparência.
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