BRASUIL - Vídeo falso usa imagens de garoto da África do Sul que perdeu os movimentos das pernas por causa de uma condição de saúde rara, a Mielite Flácida Aguda (AFM), para dizer que após a aplicação de uma dose da vacina Astrazeneca, em 2021, menino brasileiro ficou paralisado e desenvolveu mielite transversa, uma inflamação na medula espinhal.
No Brasil, a vacinação de crianças começou apenas em 2022 e o imunizante utilizado foi a Pfizer pediátrica. O diagnóstico da criança estrangeira não tem relação com vacinas ou com a covid-19.
Conteúdo investigado: Vídeo em português que mostra imagens de uma criança com dificuldades de locomoção e afirma que a condição teria sido causada por uma vacina contra a covid-19 aplicada fora do prazo de validade. O post alega que o menino de 7 anos se chamaria Vitor e teria ficado paralisado após receber a dose em 2021.
Onde foi publicado: X.
Conclusão do Comprova: Post viral utiliza imagens de uma criança que vive na Cidade do Cabo, na África do Sul, e perdeu os movimentos das pernas por causa de uma condição de saúde rara, a Mielite Flácida Aguda (AFM). O menino não é brasileiro e o diagnóstico não tem relação com a covid-19 ou vacinas. Por meio de busca reversa no Google, descobrimos que o post em português usa trechos de diferentes vídeos publicados originalmente em inglês nas redes sociais pela família do garoto sul-africano.
O menino nas imagens é Elijah Cottle, de 5 anos, que foi diagnosticado com AFM em 2022. A doença, que apresenta sintomas semelhantes à poliomielite, afeta o sistema nervoso e geralmente é causada por uma infecção viral. No Instagram e no TikTok, a família compartilha a trajetória do garoto e pede doações para que possam comprar um Trexo, exoesqueleto robótico que ajuda crianças com deficiência a andar.
No Brasil, fotos e vídeos de Elijah começaram a ser publicados em uma conta no Instagram. No perfil, alguém usava imagens da criança e dizia que ele se chamava Vitor e sofria de mielite transversa, uma inflamação na medula espinhal. A história contada aos seguidores era de que o menino havia ficado paralisado após receber uma dose vencida de vacina contra a covid-19. Os posts pediam doações via PIX. Após a repercussão do caso, o perfil foi configurado para funcionar como uma conta privada.
O vídeo alega ainda que o menino teria recebido a vacina da farmacêutica Astrazeneca em março de 2021. Porém, no Brasil, a imunização contra a covid-19 em crianças de 5 a 11 anos só teve início em 2022. Além disso, o imunizante da Astrazeneca não foi aplicado no público infantil. No país, a campanha de imunização para esse grupo utilizou a Pfizer pediátrica, que posteriormente, em 2024, passou a integrar o Calendário Nacional de Vacinação para crianças de 6 meses a menores de 5 anos.
O Comprova não conseguiu entrar em contato com o autor da postagem no X porque o perfil não aceita o envio de mensagens diretas.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 11 de abril, o vídeo no X já tinha 433,6 mil visualizações.
Fontes que consultamos: Google, por meio do qual foi feita a busca reversa utilizando frames do vídeo, as redes sociais de Elijah Cottle, o perfil no Instagram que se passava pelo garoto, o site e a assessoria de comunicação do Ministério da Saúde, além de sites de jornais brasileiros.
Efeitos adversos são raros
O vídeo verificado mostra manchetes sobre os supostos efeitos colaterais da vacina da Astrazeneca. Conforme já explicou o Comprova, no Brasil, qualquer medicamento ou imunizante precisa ser aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) antes de ser distribuído para a população. A vacina da Astrazeneca teve o registro aprovado pelo órgão em março de 2021.
Segundo a agência brasileira, o registro é dado quando evidências científicas mostram que os benefícios do medicamento superam os riscos potenciais. Esse é o caso da Astrazeneca e de outras vacinas, como aquela aplicada contra o papilomavírus humano (HPV), vírus causador do câncer de colo de útero.
Um dos efeitos adversos muito raros da Astrazeneca já registrados é a Síndrome de Trombose com Trombocitopenia (TTS). Em 2023, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que produz o imunizante no Brasil, esclareceu que eventos como a STT são extremamente raros e possivelmente associados a fatores pré-existentes em cada indivíduo. Um ano depois, em 2024, quando voltou a circular desinformação sobre o medicamento, o Ministério da Saúde reforçou que a vacina é segura.
Ministério da Saúde esclarece não haver associação causal
Questionado sobre o assunto, o Ministério da Saúde comunicou que não há evidências que sustentem uma associação causal entre a vacina contra a covid-19 e a ocorrência de mielite transversa em crianças. A pasta destacou que “embora existam relatos isolados na literatura médica de casos que ocorreram após a vacinação contra a Covid-19, isso não significa que a vacina tenha sido a causa”, sendo que “diversos estudos epidemiológicos já foram realizados e, até o momento, não há evidências científicas robustas que estabeleçam essa ligação”.
O governo federal ainda ressaltou que para que qualquer suspeita seja analisada com rigor, é fundamental que o caso seja formalmente notificado por um profissional de saúde. “Somente por meio da notificação e de uma investigação criteriosa é possível avaliar a situação com base em dados clínicos, exames complementares e contexto individual. Sem esses elementos, não é possível tirar conclusões seguras”, afirmou o Ministério da Saúde.
Vídeo usa matéria de 2021
O vídeo viralizado no X mostra uma reportagem publicada pelo jornal Folha de São Paulo em julho de 2021 que aponta que cerca de 26 mil doses da Astrazeneca fora da validade foram aplicadas em 1,5 mil municípios brasileiros. Na época, o Ministério da Saúde esclareceu que não distribui doses de vacina vencidas aos estados e Distrito Federal e acompanha rigorosamente todos os prazos de validade das vacinas contra a covid-19 recebidas e distribuídas.
O governo federal ainda explicou que de acordo com o Plano de Operacionalização da pasta, os estados e municípios que eventualmente tenham aplicado vacinas vencidas devem fazer a busca ativa e monitorar os casos, inclusive a possibilidade de eventos adversos. Além disso, os casos de pessoas que tenham sido vacinadas com data de validade fora do prazo devem ser notificados como um erro de imunização no e-SUS Notifica.
Depois da reportagem da Folha de São Paulo, prefeituras negaram a aplicação de vacinas vencidas e disseram haver erro de registro no sistema do governo federal.
Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova já mostrou que a desinformação sobre vacinas compromete a confiança pública nos imunizantes, que estudos mostram os benefícios da vacinação infantil contra a covid-19 e ainda desmentiu um post que contesta a segurança dos imunizantes contra o coronavírus. Além disso, o Estadão Verifica também já provou que o vídeo em questão é falso.
Notas da comunidade: Até a publicação deste texto, o post no X não apresentava notas da comunidade.
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