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COLUNA
Sônia Amaral
Sônia Amaral é desembargadora do Tribunal de Justiça do Maranhão.
SÔNIA AMARAL

Segunda parte: “Dinheiro é apenas papel pintado.”

O Professor Antônio Carlos Porto Gonçalves, na disciplina de Macroeconomia, me ensinou o seguinte: “Dinheiro é apenas papel pintado”. Ou seja, dinheiro é um produto como outro qualquer.

Sônia Amaral

Atualizada em 02/05/2023 às 23h50
Sônia Amaral é desembargadora do Tribunal de Justiça do Maranhão
Sônia Amaral é desembargadora do Tribunal de Justiça do Maranhão (SÔNIA AMARAL)

Publiquei a primeira parte daquilo que pretendo fazer, uma trilogia acerca do funcionamento da economia, e comecei pela questão do endividamento do Estado via empréstimos bancários para cumprir compromissos políticos da agenda social. Entendo ser essa uma agenda extremamente relevante porque a pobreza, que muito brasileiros enfrentam, e nosso Estado é “pródigo” na pobreza, não pode ser aceita como natural diante dos avanços civilizatórios que têm a dignidade humana como direito fundamental. Passar fome é indigno. 

Pois bem, naquele artigo, que coloco à disposição aqui, tentei demonstrar como a opção pelo endividamento via empréstimos pode causar mais pobreza e inflação. Neste aqui, trato da outra forma possível, também não recomendada, pois que tende ao mesmo resultado do endividamento: baixo crescimento, desemprego e inflação.

O Professor Antônio Carlos Porto Gonçalves, na disciplina de Macroeconomia, me ensinou o seguinte: “Dinheiro é apenas papel pintado”. Ou seja, dinheiro é um produto como outro qualquer, que serve como objeto de troca entre o produto ou serviço que alguém oferece e o outro quer adquirir. Antigamente, essa troca era feita entre produtos, o chamado escambo. Desde o século VIII a. C, todavia, adotamos o dinheiro, em suas mais variadas formas, como objeto de troca.

Até a Primeira Guerra Mundial, quanto mais ouro tivesse o país em suas reservas, mais valor tinha a respectiva moeda. Hoje mudou e esse valor da moeda é conferido por toda a riqueza gerada no país. E aqui não se trata de riqueza natural, dessas que no Brasil abundam. 

Os oito países com maior renda per capita são, em ordem decrescente: Luxemburgo, Irlanda, Suíça, Noruega, Singapura, Estados Unidos, Islândia e Catar. Tirando a Noruega e o Catar, onde a riqueza vem do petróleo, ou os Estados Unidos, com território extenso e muitas riquezas naturais, os demais não dispõem de riquezas naturais e têm os territórios ínfimos, neles todo o desenvolvimento é fruto do investimento na maior das riquezas que o ser humano pode ter: a educação. Com educação, esses países geram tecnologia para o restante do mundo ou prestam serviços de excelência. Importante advertir que, mesmo nos países ricos em reservas naturais e/ou com vastos territórios, não é isso o que faz a diferença entre a riqueza e a pobreza. Se fosse assim, o Brasil estaria entre os de maior renda per capita, assim como a Índia e o continente africano. 

Dito isso, vejamos por que o dinheiro, como qualquer outro produto, sofre as intempéries da lei da oferta e da procura.  Se a Casa da Moeda imprimir mais papel-moeda, o seu valor cai. Você terá fisicamente mais dinheiro na carteira, mas, comprará menos. A mesma coisa que antes você comprava por 20 reais, passará a custar 100 reais, por exemplo. E isso acontece por uma razão simples, que a história também demonstrou exaustivamente: a produção de riquezas do País não conseguirá acompanhar a produção do papel-moeda. Logo, se tenho mais demanda (já que as pessoas têm mais dinheiro na carteira) e não tenho como entregar todos os produtos e serviços que querem comprar, é natural que esses preços aumentem. 

Vejamos com outro produto. Se eu, em uma determinada região, produzir 1 tonelada de tomates e o consumo for equivalente a isso, eu consigo vender os tomates com lucros razoáveis. Mas se eu produzo 3 toneladas e o consumo permanecer em 1 tonelada, o preço dos tomates despenca e, com certeza, terei que vender abaixo, até, do custo que tive para produzir. Tomates e moedas se desvalorizam a depender da oferta exagerada. A inexorável lei da oferta e da procura não perdoa. Muita procura e pouca oferta geram aumento de preços: inflação. E com a inflação, adeus crescimento e geração de emprego e renda. A inflação bagunça tanto o equilíbrio da economia, que as empresas não conseguem mais prever custos e preços e, daí, os pequenos quebram e os grandes fogem do país. Mais desemprego.

Outra coisa: as pessoas correm para comprar dólar, moeda forte e, com isso, mais inflação, pois muito do que precisamos é importado e, com a subida do dólar, inevitavelmente, teremos o aumento de preço em real desses produtos. Isso impacta até nos alimentos porque as máquinas utilizadas na lavoura e os pesticidas são comprados lá fora. Com a inflação perdem, principalmente, os beneficiários dos programas sociais e os mais pobres, que veem o pouco que recebem desmanchar no ar todas as vezes em que vão ao supermercado. Os que recebem mais, apesar de sofrer também, conseguem, pelo menos, empatar porque aplicam alguma renda que sobra ao final do mês e recebem juros. A história da Alemanha, após a Primeira Guerra Mundial, e as atuais Venezuela e Argentina são exemplos acabados. Mesmo o Brasil, antes do Plano Real, quando tivemos diversas moedas (cruzeiro, cruzado e cruzado novo), confirma a regra. 

Bem, para fechar a trilogia, no próximo artigo tratarei do pagamento da pauta social com o aumento de impostos. 

 

 

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