RIO DE JANEIRO - O grande número de faltas cometidas durante as partidas da Copa do Mundo, com atletas lesionados – o caso mais recente foi o do atacante Neymar, da seleção brasileira, atingido por uma joelhada no jogo contra a Colômbia, no último dia 4, que resultou em fratura de uma vértebra da coluna - pode trazer problemas graves no médio e longo prazos. A advertência foi feita pelo médico neurologista Abouch Krymchantowski, da Polícia Militar (PM) do Rio de Janeiro, em entrevista à Agência Brasil.
Ele esclareceu que, dependendo do trauma e do local da lesão, o jogador, no curto prazo, fica sem poder jogar e incapacitado para se mexer por um período. “O problema maior das lesões traumáticas do esporte, na minha opinião, são as consequências a médio e longo prazos, porque cada vez que você lesa tecido ou célula no organismo, tem uma recuperação da lesão com formação de tecido fibroso”, destacou.
Krymchantowski disse que mesmo que não haja abertura externa, há lesão interna, com sangramento e inchação de algum tecido, que pode ser músculo, tendão, articulação e até osso, como ocorreu com a vértebra do Neymar. Ele ressaltou que, a longo prazo, as cicatrizações com tecido fibroso vão inviabilizando a função daquele tecido. A repetição da lesão em vários músculos, ou mesmo em outros tipos de tecido, pode levar esses órgãos a deixar de ser funcionantes. “E isso, no futuro, vai provocar sequelas graves”, apontou.
Um bom exemplo disso é o lutador de boxe, segundo ele: “Vai levando pancada na cabeça. Se na hora da luta, ela não for muito forte, ele vai aguentando. Depois de algum tempo, porém, ele acaba apresentando sequelas, como ocorreu com o ex-pugilista norte-americano Cassius Clay (o Muhammad Ali), que apresentou [doença de] Parkinson pós-traumático. De tanto levar pancada a região acaba deixando de funcionar. Se for o cérebro, isso traz consequências desastrosas”.
Se a lesão for em um músculo grande da coxa, as consequências no longo prazo podem ser dor, quando há mudanças de temperatura, quando a pessoa pratica exercícios físicos, ou até mesmo quando está sentada, sem fazer nenhum movimento, informou.
Ele reiterou que as repetidas lesões vão levando à formação de tecido fibrótico que não tem a mesma função do tecido original. Chamou a atenção, em especial, para os traumas na cabeça, como os registrados durante a Copa com o zagueiro da Holanda, Bruno Martins, que sofreu traumatismo craniano no jogo contra a Austrália, ou do jogador uruguaio Álvaro Pereira, que levou uma joelhada na testa, na partida contra a Inglaterra, e caiu desacordado no campo.
Segundo o médico, outro esporte que traz riscos para o atleta é o futebol americano. Abouch Krymchantowski citou que somente agora a medicina começou a demonstrar, de forma clara, que o preço pago pelas lesões sofridas é absurdo. A partir da década de 1990, percebeu-se que ocorre uma mudança de comportamento nas pessoas lesionadas ao longo do tempo. A chamada psicose do futebol pode aparecer aos 40 anos de idade no jogador dessa modalidade esportiva, disse ele, e acrescentou: “Depois de analisarem alguns cérebros de jogadores pós-morte, viram que tinham degenerações importantes na célula do sistema nervoso central. É muito ruim pancada. E mais ainda pancadas, ao longo do tempo, na cabeça”.
O neurologista admitiu, entretanto, que na área esportiva não há como evitar agressões. Insistiu que mesmo que não haja lesões aparentes em exames, elas acabam comprometendo a função da região atingida, no decorrer do tempo.
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