Opinião

Carnaval, máscaras e Covid

Benedito Buzar

Atualizada em 11/10/2022 às 12h17
Fotografado pelo saudoso Azoubel, uma cena dos bailes de máscaras.
Fotografado pelo saudoso Azoubel, uma cena dos bailes de máscaras.

São Luís - Quem diria que cinquenta e cinco anos depois do prefeito de São Luís, Epitácio Cafeteira, proibir o uso de máscaras nos bailes populares da cidade, elas voltassem ao noticiário das mídias e objeto de decretos de autoridades governamentais do Maranhão.

Ainda que as máscaras, no passado e no presente, tenham sido alvos de atos oficiais, os motivos que levaram o prefeito Cafeteira e o governador Flávio Dino a se preocuparem com aqueles pedaços de tecidos pretos ou coloridos, se diferenciavam quanto aos objetivos e as repercussões.

Se Cafeteira acabou com as máscaras no carnaval a partir de 1966, em nome de uma falsa moralidade pública, Flávio Dino, proibiu as festas momescas deste ano, mas fez questão de obrigar carnavalescos e não carnavalescos a não abandonarem as máscaras, vendo nelas o instrumento seguro e importante para a população não ser contaminada pelo corona vírus.

Os Bailes de máscaras

Eram festas carnavalescas, de cunho populares, promovidas em casarões localizados no centro da cidade, que começavam a 31 de dezembro e terminavam no último dia do tríduo momesco.

Nesses bailes, as mulheres usavam máscaras, que funcionavam como fetiches e não serem facilmente identificadas pelos conquistadores.

Em sua grande maioria as mulheres eram recrutadas nos bairros da cidade e pertenciam aos estratos sociais mais pobres, sem esquecer que um bom contingente provinha das classes médias e radicadas no centro urbano: solteironas, mal casadas, balzaquianas, prostitutas e até homossexuais.

As mascaradas não pagavam para entrar nos bailes. Este ônus era cobrado dos homens, que para ali se dirigiam em busca de atraí-las para encontros amorosos ou programas sexuais.

Cafeteira, na época em que assumiu o cargo de prefeito de São Luís.
Cafeteira, na época em que assumiu o cargo de prefeito de São Luís.

A demagogia de Cafeteira

Nas eleições de 1965, o povo de São Luís, privado há anos de eleger o seu prefeito, nomeado pelo governador de plantão, reconquistou o direito de escolhê-lo, por iniciativa de um projeto apresentado na Câmara Federal pelo deputado Epitácio Cafeteira, que se beneficiou dessa lei para disputar e ganhar a eleição de prefeito da capital maranhense.

Mal sentou na cadeira de prefeito, Cafeteira assinou um decreto, sem tê-lo anunciado na campanha eleitoral, que proibia a realização de bailes de máscaras, sob a justificativa de “ocorrerem em ambientes que não possuem associados legalmente, razão pela qual é preciso o poder público agir em defesa dos costumes e da moralidade pública”.

O decreto de cunho demagógico e de falso moralismo, explodiu como uma bomba na cidade, causando imediata discussão e polêmica.

Em torno do assunto, a imprensa, o clero e o Movimento Familiar Cristão posicionaram-se, obrigando o secretário de Segurança, coronel Antônio Medeiros, a assinar Portaria, avocando a competência para disciplinar as festas populares e assegurando aos promotores dos bailes o direito de realizá-las, os quais buscaram na Justiça o remédio legal para livrá-los dos gigantescos prejuízos.

A politização das máscaras

Para não entrar direto na questão, o governador José Sarney autorizou o deputado Clodomir Millet e o vice-governador Antônio Dino a usarem os meios de comunicação para censurar o prefeito Cafeteira e defender a competência do secretário de Segurança para ditar as regras sobre as festas carnavalescas, ponto de vista rebatido pelo gestor da cidade, que, também, interpôs recurso na Justiça, contra a medida sob o argumento de a prefeitura ter o direito de zelar pelos costumes e fiscalizar as diversões públicas.

Com a cidade dividida quanto à questão dos bailes de máscaras, Cafeteira, do alto de sua esperteza, contrata com recursos da prefeitura, blocos e escolas de samba para manifestarem nas ruas o descontentamento contra o ato da secretaria de Segurança e a pressionarem a Justiça para ficar do lado do prefeito, baseada numa marchinha com o seguinte refrão: “Cafeteira não quer máscara neste carnaval”, que caiu na boca do povo.

Sarney entra na disputa

O governador José Sarney, que até então mantinha um respeitoso diálogo com Cafeteira, diante da movimentação diária e barulhenta na Avenida Pedro II, patrocinada pela prefeitura, decidiu entrar de cabeça no caso, no entendimento de que aquela fuzarca procurava jogar a opinião pública contra as autoridades estaduais.

Por isso, solicitou ao comandante do 24º Batalhão de Caçadores, coronel Alberto Braga, a abertura de inquérito policial-militar, com vistas à apuração dos atos e fatos e pedindo a sustação daquela folia, que tumultuava diariamente o centro da cidade e atrapalhava o funcionamento das repartições públicas.

A folia virou cinzas

Passaram-se os dias e a temporada carnavalesca chegou ao fim sem a conclusão do inquérito policial-militar e a Justiça em processo de procrastinação. Resultado: os bailes populares não aconteceram e a partir daquele ano as máscaras deixaram de ser um componente da tradição do carnaval maranhense, que, este ano, por decisão do governador e do prefeito de São Luís, proibiram a realização dos eventos momescos, mas exigiram, ao contrário de Cafeteira, que as máscaras não podem ser dispensadas pela população, como meio de combater o nefando Covid-19.

Em tempo: por causa dos bailes de máscaras, o governador José Sarney e o prefeito Epitácio Cafeteira, que se entendiam bem, romperam pessoal e politicamente. Só voltaram a dar as mãos em 1985, por ocasião da formação da Aliança Democrática.

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