Entrevista

Sarney Filho: Bolsonaro deu sinal verde para desmatar

Ex-ministro do Meio Ambiente, em entrevista ao Valor Econômico, fez críticas a falta de política de meio ambiente do Governo Federal

Valor Econômico

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23
Sarney Filho, em entrevista, fez críticas ao presidente Bolsonaro
Sarney Filho, em entrevista, fez críticas ao presidente Bolsonaro (Sarney Filho)

Valor: Estamos vivendo um aumento nos índices de desmatamento e de queimadas, com grande repercussão internacional. Como chegamos até aqui?

Sarney Filho: Desde que o novo governo começou a dar declarações que fragilizaram a política de comando e controle ambiental, eu já previa que o desmatamento iria ficar desenfreado, como de fato está. A relação entre queimadas e desmatamento é muito clara na Amazônia: dificilmente os incêndios são espontâneos; a grande maioria é criminosa. O fato de os dez maiores municípios desmatadores também terem focos de incêndio dá conta desta vinculação direta. Quando o governo questiona o próprio Ibama, sinaliza que multas podem ser revistas, minimiza as unidades de conservação e prega a mineração e o plantio de soja em terras indígenas, ele fragiliza todo o pilar da política ambiental. Além disso, diminuiu recursos.

Valor: O que é necessário fazer, de pronto, para conter esse cenário?
Sarney Filho: Para começo de conversa, retomar os recursos. O orçamento do Ibama é minúsculo. É um órgão que precisa retomar seu respeito. E o governo ainda descartou o investimento milionário da Alemanha e da Noruega no Fundo Amazônia. Lógico que, com tudo isso, não poderia se esperar outra coisa. Tem que ter monitoramento eficiente, servidores bem remunerados, órgãos preparados, com recur­sos. Devem ser feitas parcerias com governos estaduais e com a Polícia Federal, cuja atuação está aquém do esperado no combate ao desmatamento ilegal.

Valor: Se todos os órgãos ambientais funcionassem a contento, a situação seria outra?
Sarney Filho: Já é difícil conter o desmatamento com todos os órgãos funcionando adequadamente. À medida que o presidente fragiliza esses órgãos, ele fortalece o grileiro, o pecuarista ilegal, dando sinal verde para que tudo isso possa acontecer. Bolsonaro prejudica mais a política ambiental pelas suas falas do que pelas ações. As ações são ruins, mas as falas são piores. Os sinais, na questão do combate ao desmatamento são muito importantes. Se o próprio presidente dá sinais de desconstrução da política ambiental, ele incentiva o desmatamento, com todas as suas consequências.

Valor: Como o sr. avalia a competência das pessoas que hoje chefiam órgãos ambientais no governo?
Sarney Filho: Não gosto de citar nomes, mas Bolsonaro está cercado de conselheiros atrasados, ignorantes e, alguns deles, com interesse na ilegalidade. Ele ouve opiniões e reproduz uma série de ideias malucas, colocando o Brasil em situação vexaminosa. São pessoas que não têm tradição na área ambiental. Querem tirar proveito imediato de tudo. Estão chefiando postos-chave. São pessoas que não representam ninguém, não têm conhecimento técnico, mas feeling de negociante do século passado.

Valor: Que conselho o sr. daria ao governo sobre a política ambiental?
Sarney Filho: Ter vontade política. É importante que o ministro do Meio Ambiente [Ricardo Salles] e o presidente Bolsonaro tenham determinação política de conter o desmatamento da Amazônia. A maioria das queimadas é ilegal, é tirar madeira nobre, tocar fogo e colocar pasto para a atividade pecuária. É isso que está ocorrendo agora. Quem vai comprar carne proveniente de desmatamento ilegal na Amazônia? Vai prejudicar a economia. É uma percepção pública que até o agronegócio já sentiu.

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