Maranhão registra mais de 153 casos de violência sexual infantil em três meses
Ocorrências representam 52% dos delitos registrados pelo órgão durante o primeiro trimestre de 2019; dados foram apresentados durante o II Congresso de Conselheiros e Ex-conselheiros Tutelares da Região Nordeste
Entre os meses de janeiro e março deste ano, 153 casos de violência sexual infantil foram registradas pelo Centro de Perícia Técnica para a Criança e Adolescente (CPTCA) do Maranhão, órgão responsável por apurar, identificar e confirmar delitos cometidos contra crianças e adolescentes. Conselhos tutelares têm papel fundamental na proteção dos direitos dos mais jovens, mas insuficiência de recursos humanos e financeiros têm sido obstáculos na atuação dos órgãos de todo o estado. Situação foi exposta durante o II Congresso de Conselheiros e Ex-conselheiros Tutelares da Região Nordeste, realizado esta semana em São Luís.
Casos de violência sexual ainda são os crimes mais recorrentes cometidos contra crianças e adolescentes maranhenses. Conforme dados do CPTCA, tais ocorrências representam 52% dos delitos registrados pelo órgão durante o primeiro trimestre de 2019. Violência física e outros crimes – como maus tratos, ameaças, desaparecimento e preservação de direito – compõem, respectivamente, cerca de 23% e 25% dos casos de violação de direitos de crianças e adolescentes do estado.
Para combatar crimes desta natureza, se faz essencial a atuação dos conselhos tutelares, órgãos criados conjuntamente ao Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca), instituído pela Lei nº 8.069. O Conselho Tutelar é formado por membros eleitos pela comunidade para mandato de três anos e, nesse período, os conselheiros atendem crianças e adolescentes, além de aconselharem pais e responsáveis. Seu trabalho é basicamente norteado sob denúncias, por isso, sempre que se perceba abuso ou situações de risco contra menores, o órgão deve ser acionado.
Faltam recursos
No entanto, a insuficiência de recursos humanos, materiais e financeiros, comum à grande parte dos 230 conselhos municipais do Maranhão, tem dificultado a atuação plena de conselheiros, principalmente no interior do estado, como destacou o presidente da União dos Conselheiros e Ex-conselheiros do Maranhão (Unicectma), Darlan Mota. “Não temos um levantamento muito positivo em relação à atuação dos conselhos no estado, isto porque, apesar de alguns incentivos que foram criados recentemente, ainda enfrenta-se problemas relacionados à estrutura, aos recursos disponíveis aos conselheiros, mas ainda existem cidades em que os conselhos não têm veículo para se locomover, entre outros problemas. Mas, ainda assim, o conselheiro se mantêm disposto a atender a comunidade”, informou.
Em Sucupira do Norte, a 515 km de distância da capital, problemas semelhantes aos descritos pelo presidente da Unicectma são enfrentados por Manuela Elísio e a equipe de conselheiros do município que, apesar das dificuldades, lida constantemente com situações de negligência, evasão escolar e trabalho infantil, tidas como as principais ocorrências da cidade.
“Atualmente, a falta de recursos materiais e humanos são os principais obstáculos para que tenhamos um trabalho eficiente em nosso município. Além disso, faltam informações, como essas proporcionadas pelo congresso, para que possamos adquirir o conhecimento sobre as nossas atribuições e, de fato exercê-las dentro do estatuto sem violar os direitos de crianças e adolescentes que, na nossa cidade, costumam estar relacionados à negligência de pais e responsáveis”, explicou a conselheira.
Na capital
Diferentemente da maioria dos municípios maranhenses, que possuem apenas um conselho tutelar – exceto as cidades de Imperatriz, São José de Ribamar e Timon, que têm dois, cada – São Luís possui 10 conselhos tutelares divididos por áreas da cidade, no entanto enfrentam problemas semelhantes. De acordo com Marcos Japi, presidente do Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente de São Luís as unidades tentam superar as dificuldades da rede de órgãos que atuam no setor e, assim, identificar e solucionar situações de violação de direitos, principalmente casos de violência sexual.
“Em todo o Maranhão há, apenas, duas estruturas da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, a DPCA, uma em São Luís e outra em Imperatriz. Então, sempre que há um caso identificado nos demais municípios, as vítimas são encaminhadas para uma dessas cidades para receber atendimento necessário, o que acaba sobrecarregando as delegacias e, como consequência, muitos casos ficam impunes. Além disso, a maioria dos conselhos não possuem cedes próprias. Aqui em São Luís, por exemplo, dos 10 conselhos, 7 estão instalados em espaços alugados e, vez ou outra, o pagamento atrasa e os proprietários pedem os prédios de volta, obrigando uma mudança que acaba fragilizando nosso trabalho”, destacou Japi.
Os conselhos tutelares atuam por meio da articulação de ações e da integração operacional entre os órgãos corresponsáveis que compõem a rede de proteção à criança e ao adolescente. Além dos conselhos, a rede é constituída por órgãos como a DPCA, Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Centro de Referência de Assistência Social (Cras), Centro Municipal de Proteção à Criança e ao Adolescente (CMPCA), Conselho Estadual dos Direitos da Criança e Adolescente (CEDCA), Judiciário e Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE-MA), representado no congresso pelo defensor público Davi Veras, membro do Núcleo de defesa da Criança e do Adolescente, que, na ocasião, ressaltou a importância da parceria entre os órgãos que integram a rede.
“Os concelheiros são, muitas vezes, referenciais da comunidade, normalmente é o primeiro a identificar uma situação de violação e essa parceria que existe é uma aproximação da Defensoria com os conselhos, mas, também, uma vinculação legal para garantir a atuação da rede organizada. Nossas ações são diárias, tanto para garantir a defesa da criança, buscar medidas de proteção para crianças e adolescentes que tem seus direitos violados e ainda em atuações estratégicas de fiscalização, controle e fomento de políticas públicas de educação e saúde por exemplo e, neste sentido, entendemos que temos dados passos importantes em São Luís e nos mantemos juntos para dar mais celeridade aos mecanismos da defesa infantil”, destacou.
Outro lado
Procurada para comentar sobre as alegações referentes à capital, a Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social (Semcas) informou que tem buscado garantir as melhores condições de trabalho para a realização das atividades dos Conselhos Tutelares da capital, entre as ações destacam-se: entrega de novos equipamentos na área de informática, no ano de 2018; garantia de veículos para os 10 Conselhos Tutelares de São Luís com combustível e dois motoristas disponíveis; intervenções de reformas na infraestrutura das unidades; busca por novos espaços com melhores condições; capacitação permanente dos conselheiros e no momento tramita um novo processo de licitação para aquisição de bens permanentes.
A Semcas destacou, ainda, que São Luís passou a ser uma das primeiras capitais brasileiras a ter um Conselho Tutelar para cada 100 mil habitantes, e a partir dessa nova realidade foram entregues as unidades Cohab/Cohatrac, São Francisco/Cohama e Anil/Bequimão. Por último, a Secretaria esclareceu que o número de conselheiros é definido via Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), a depender do porte da capital. Em São Luís, foram empossados 50 novos conselheiros tutelares, na eleição unificada em 2015. De acordo coma as normativas, está prevista nova eleição unificada para Conselheiros Tutelares de todo o país em 06/10/2019.
SAIBA MAIS
Você sabe o que é o Conselho Tutelar?
O Conselho Tutelar é um órgão municipal responsável por zelar pelos direitos da criança e do adolescente. Este foi criado conjuntamente ao Estatuto da Criança e do Adolescente instituído pela Lei 8.069 no dia 13 de julho de 1990. É um órgão permanente, ou seja, uma vez criado não pode ser extinto, e possui autonomia funcional, não sendo subordinado a qualquer outro órgão estatal.
Para que servem os conselhos?
Cabe ao Conselho Tutelar aplicar medidas que zelem pela proteção dos direitos da criança e do adolescente. No entanto, o Conselho Tutelar não tem competência para aplicar medidas judiciais e não pode julgar nenhum caso e não age como órgão correcional. Desta forma, quando um adolescente, por exemplo, pratica algum crime, este será direcionado à Polícia Militar. O Conselho Tutelar poderá atuar somente com aconselhamento. Também não é função não é função do conselho tutelar fazer busca e apreensão de crianças e/ou adolescentes, expedir autorização para viagens ou desfiles, determinar a guarda legal da criança. O Conselho Tutelar é apenas um órgão zelador.
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