Opinião

Gelo nas asas

O acúmulo de gelo nos aviões não se restringe, porém, ao para-brisa

Aldir Penha Costa Ferreira - Médico, ex-professor da UFMA, membro da Sobrames e da Academia Vianense de Letras

Atualizada em 11/10/2022 às 12h37

É estranho que um cidadão de fora da área tenha o atrevimento de meter o nariz nesse assunto. Acontece, porém, que o cidadão, contaminado pelo aerococus desde a infância, não resistiu à tentação.

Primeiro, deve ser dito que o aerococus é um micro-organismo imaginário, criado pelos seguidores de Alberto Santos Dumont. É uma bactéria de alta virulência que “contamina” todos os aeronautas e entusiastas da aviação. Causa de uma “doença” incurável. Contra ela, não há vacina ou remédio. Quem se contaminou, adoece e permanece “doente”.

Quanto ao presente artigo, o seu tema foi objeto de notícia recente veiculada pela imprensa. É, sem dúvida, um tema curioso e interessante.

O problema, porém, não é novidade. O escritor norte-americano Ernest Gann, ex-piloto de aviões (Minha Vida no Céu) relata que, na década de 1940, voando na condição de copiloto de um DC-2, antecessor do famoso bimotor Douglas DC-3, teve de enfrentar uma dessas ocorrências. Diz: “O para-brisa ficou opaco. Nosso mundo termina num painel cinza a poucos palmos dos nossos rostos”.

O acúmulo de gelo nos aviões não se restringe, porém, ao para-brisa. Pode ocorrer no bordo de ataque (bordo anterior) das asas e de outras superfícies externas, e até nas tomadas de ar dos motores. Se durante o voo, o problema merece atenção, pois, além de aumentar o peso, pode interferir na aerodinâmica e comprometer a segurança.

Motivado por uma combinação de fatores, como regiões de clima frio, elevada umidade do ar e a temperatura sempre baixíssima das grandes altitudes, não é comum no Brasil, devido às nossas condições geográficas. Aconteceu recentemente em algumas cidades brasileiras, porém, devido à invasão das tais frentes frias que vêm do Polo Sul.

Em 1940, já havia, como se sabe, certos avanços na tecnologia da construção aeronáutica, mas alguns voos tinham, ainda, o sabor de aventura: “A noite é sinistra. Não há estrelas que a alegrem. Enquanto passamos entre nuvens, perdemos a sensação de voo e até mesmo a noção de uma existência orientada”.

As aeronaves atuais são, porém, verdadeiras obras de arte da engenharia, e tal fenômeno tem sido, naturalmente, objeto de muita pesquisa. Testes e mais testes, experiências e mais experiências. Quem vê e ouve uma aeronave deslizando no ar acima da sua cabeça não faz ideia. Como diz o engenheiro Ozires Silva (um dos fundadores da Embraer): “Os custos e os prazos requeridos para criar novo tipo ou modelo de avião são sempre altos e longos”. E mais: “Os aviões são produtos caros e sofisticados”. Segundo as estatísticas, o avião é o segundo meio de transporte mais seguro que existe, só perdendo para o elevador.

A formação de gelo nas superfícies externas dos aviões, quando eles estão no solo, é combatida com a aspersão de uma mistura de água aquecida à temperatura de 80ºC e etileno-glicol ou o propileno-glicol (espécies de álcoois). Nos grandes aeroportos, essas operações, conhecidas como “de-icing” (degelo) são executadas por equipes especialmente treinadas. Se o fenômeno ocorre durante o voo, existem dispositivos que lançam, nas asas e outros locais, jatos de ar quente oriundos dos próprios motores. Como se vê, em matéria de segurança do voo nada é esquecido.

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