HOJE É DIA DE

Frutas, frutos & infrutescências

JOMAR MORAES

Atualizada em 13/10/2022 às 12h04

Este ano, o provérbio que exalta a esperteza dos que voltam com as castanhas enquanto outros ainda se dirigem em busca dos cajus, deixou de cumprir-se plenamente, porque aquelas e estes não compareceram com a costumeira abastança, antiga e generosa desde tempos imemoriais. Fruto nativo da região, e abundante nesta terra, que ressumava uberdade quando aqui aportaram os primeiros europeus, cujos olhos maravilhados proclamaram-na "bonita, agradável e deleitosa", conforme testemunho de frei Claude d'Abbeville, o primeiro dos que aqui chegaram a louvá-la sem restrições numa importante obra - História da missão dos padres capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas, escrita em tempo recorde e publicada em Paris no ano de 1614. No capítulo 38 desse livro pioneiro de nossa bibliografia colonial, capítulo esse intitulado "Das cousas que se encontram comumente na Ilha do Maranhão e circunvizinhanças e em primeiro lugar das árvores frutíferas", entre cerca de meia centena de itens do gênero pacientemente arrolados, inicia a consistente nominata o caju, cujas flores o frade descreve como pequenas, avermelhadas e perfumadas, que de longe exalam seu odor muito suave. Do fruto, distingue quatro variedades, a saber:caju-eté, caju-pirá, cajuí e caju-açu, obviamente "maior que todos os outros e ótimo de gosto", com época de maturação de agosto a dezembro e até janeiro. O período de maturação indicado por Abbeville é, grosso modo, coincidente com a média por mim apurada durante três a quatro anos de anotações semanais acerca da frutaria encontrada nos principais mercados da cidade, e das conversas que mantive com a gente do ramo. Tudo isso para fundamentar os meus conhecimentos relacionados com a antecipação ou tardança da estação chuvosa e ainda com a intensidade e freqüência dela, pois tudo influi ponderavelmente na florescência das árvores e no desenvolvimento de seus frutos, cabendo registrar que aos anos seguidos de fartura intercalam-se.algum de produção menor ou quase nenhuma. Porque vigorosas e frondentes que sejam as árvores não chegam a ser de ferro. O caju, que ofereceu motivo para um excelente livro de Mauro Mota (O cajueiro nordestino), que a propósito do fruto, igualmente tratou da árvore, mereceu de Simão Estácio da Silveira, navegador português que aqui chegou em abril de 1619, trazendo uma leva de açorianos que dobraram a população de São Luis e lhe permitiram organizar a Câmara Municipal, afirmou ser o caju superior às uvas e que, de certo modo preparado, é tão bom quanto

elas "na formosura e efeitos".

Mais uma palavra sobre o caju, cujo fruto é a castanha, e não seu pedúnculo hipertrofiado, de que são feitos sucos, refrescos e doces. Seu período de maturação é, normalmente, iniciado em setembro, mês em que também tem início o tempo de outros frutos, a exemplo de abiu, cupuaçu, guajeru, juçara, jaca, abacaxi, bacaba, e a quase extinta fruta-pão, que há tempos não tenho o prazer de reencontrar.

Todas as delícias enumeradas são frutos ou infrutescências (casos de fruta-pão, jaca e abacaxi), mas a todas elas o vulgo iletrado chama fruita, corno prova de que é cioso e fiel guardião de formas clássicas da língua, pouco se lhe dando que há muito se hajam arcaizado.

Este ano de safras regradas pela tardança das chuvas e também para descanso das árvores frutíferas, às tristes noticias que nos vieram de Turiaçu, acudiu, providencialmente, o saudável contraponto dos sabores cativantes e dos delicados odores do abacaxi ali produzido, famoso e admirado a justíssimos motivos.

Fruto ou infrutescência, para com mais acerto dizer, pela generalidade dos cronistas coloniais chamado o melhor do Brasil,

mereceu fartos louvores de prosadores e poetas. Entre estes, frei Manuel de Santa Maria

Itaparica, que assim lhe faz o louvor: "E sustentando c'roa levantada / Junto com a vestidura decorosa, / Está mostrando tanta gravidade, / Que as frutas lhe tributam majestade."

Para terminar, estas duas observações curiosas de frei Francisco de Nossa

Senhora dos Prazeres Maranhão, na Poranduba maranhense. Sobre o tamarindo, disse o religioso que seu fruto é uma "vagem grossa e parda, que encerra 2 ou 3 favas rodeadas de massa pegajosa, melada e de um ácido agradável, a qual é detersiva, laxativa e adstringente, tempera o calor da febre, mitiga a sede, e com o ácido que tem, modera a alteração dos rumores desabalados." Quanto ao mamão, descreve-o apropriadamente e julga ter a chave para a origem do nome, afirmando que "na extremidade assemelha-se a peito de mulher, e por isso lhe chamam mamão."

Onde o frade recolheu elementos para sua informação, não está dito.

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