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COLUNA

Ibraim Djalma
Ibraim Djalma é procurador federal
Ibraim Djalma

Bolsas que consolam e assolam

É que nesse trajeto de remediações imediatas, o benefício de socorro que reduz a extrema pobreza pode se transformar no efeito inverso ao seu propósito principal, o combate à pobreza.

Ibraim Djalma

Reaberto há poucos meses a partir da transformação do Auxílio-Brasil, o Bolsa Família atinge atualmente mais de 21 milhões de famílias no Brasil.

A lei n.14.601/23 instituiu esse programa assistencial com alguns acréscimos do benefício anterior voltado para a população carente, numa perspectiva de política pública de inserção social e resgate de um mínimo de dignidade para as famílias de baixa renda.

O propósito foi dos melhores. Mas o resultado é sempre confuso.

Assim como diversas outras formas de regulamentação comportamental pelo Estado — como a tributação, a política criminal e a improbidade — a expansão de programas assistenciais inaugura sempre o risco de resultar num primeiro passo em solução para os beneficiários que realmente necessitam, mas por vezes a longo prazo estimula a ociosidade, num vício irrefreável de se receber sem querer trabalhar. Mesmo podendo.

E o mesmo se pode falar da informalidade, que passa dos 4 milhões de brasileiros com grande parcela querendo se manter assim para somar sua renda do trabalho com os programas assistenciais, que seriam cortados com o registro da carteira de trabalho assinada.

O Bolsa Família é um programa que paga a cada integrante de uma família uma renda mensal de R$142,00 se a renda média dessa família for abaixo de R$218,00 por pessoa. A chamada renda per capita. E ainda acrescenta mais R$150,00 se houver crianças de 0 a 7 anos e R$50,00 acima dessa idade. Essa soma nunca pode ser menor que R$600,00, pois o governo complementa se der abaixo.

Esse benefício ainda pode ser somado com o chamado Benefício Assistencial ao Idoso ou Deficiente, que equivale a um salário mínimo.

Sob a perspectiva de quem efetivamente precisa e vive abaixo da linha da pobreza sob condições desumanas e necessita de maneira vital das prestações do Estado — como saúde, educação e transporte — o consolo dessa bolsa realmente surge como oxigênio de sobrevivência, lhes resgatando um mínimo de dignidade humana.

É o reconhecimento de que existe determinada parcela da sociedade vivendo nessas condições e assim age como um paliativo de urgência enquanto as questões estruturais seguem embaraçadas por séculos de retóricas e esperanças sazonais. Eficaz de primeira ordem. Mas só de primeira ordem.

É que nesse trajeto de remediações imediatas, o benefício de socorro que reduz a extrema pobreza pode se transformar no efeito inverso ao seu propósito principal, o combate à pobreza, e assolar aquilo que realmente fulmina essa mazela, a produção de riqueza.

Nas lições iniciais de economia se sabe que a riqueza é construída por produção ou circulação de bens e serviços. Ou seja, a riqueza é comportamental e a renda é apenas um medidor dentre tantos outros.

Com o recebimento de benefícios de transferência de renda feitos para se diminuir as desigualdades e resgatar as dignidades das pessoas, há uma linha tênue que é muito difícil de ser traçada para se definir até que ponto esse consolo financeiro se transforma em desestímulo ao trabalho ou à formalidade, com menos arrecadação ao Estado, assolando assim a produção de riqueza.

Parece uma gangorra, mas coincidentemente quando os benefícios de concessão de renda aumentam, há uma diminuição na mesma proporção de buscas por emprego ou mesmo exigência de trabalhar só se não assinar a carteira.

Numa casa sem ninguém trabalhar se chega a receber mais de R$3.000,00 quando se soma com outros programas assistências, como o LOAS.

Trabalhar então soa como ousadia e risco de perder a única renda que se tem.

Culpados? Difícil dizer. Melhor ficar quieto em casa.

A perspicácia deve ser do Estado, que molda comportamentos a partir de suas políticas de várias maneiras.

Por enquanto vem apagando o incêndio da extrema pobreza, mas reduzindo os fatores de produção dos extintores.

Nada eleitoreiro. Emergencial.

Entretanto, os programas assistenciais devem atentar para os estímulos comportamentais que vem fazendo aos seus beneficiários. Inclusive a longo prazo.

O Bolsa Família é um consolo aos pobres, mas um assolo à riqueza.

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