Uma semana gonçalvina
Decorrido quase um mês da “semana gonçalvina” organizada pela Academia Maranhense de Letras em torno do bicentenário de nascimento do Poeta Maior, faz-se mister algumas breves considerações sobre a importância de tais festividades.
Decorrido quase um mês da “semana gonçalvina” organizada pela Academia Maranhense de Letras em torno do bicentenário de nascimento do Poeta Maior, faz-se mister algumas breves considerações sobre a importância de tais festividades — diria mesmo sobre a sua importância em relação ao papel das letras maranhenses no âmbito da cultura brasileira.
A “semana” propriamente dita consistiu na programação de conferências que tiveram lugar na Academia Maranhense, entre os dias 07 e 17 de agosto. Infelizmente, não pude assistir às exposições do acadêmico e escritor Manoel Aureliano Ferreira Neto, da romancista Ana Miranda e do professor Weberson Fernandes Grizoste, mas estou a par de sua excelência. Quanto ao mais, muito abrilhantaram a “semana” outros três grandes nomes, não por acaso três grandes poetas — Marco Lucchesi, o mestre de Bizâncio, tradutor emérito de Vico, São João da Cruz, Rilke e Hölderlin (“o que permanece, fundam-no os poetas”), entre outros, e professor e ensaísta de nomeada; Antônio Carlos Secchin, artesão do verso, herdeiro de Afrânio Coutinho na cátedra universitária e ensaísta de rara sensibilidade, que aproveitou o ensejo para lançar dois livros em que reuniu diversos ensaios de crítica literária, discursos e entrevistas (Papéis de poesia II e Papéis de prosa: Machado & mais. São Paulo: UNESP, 2022), em cujas páginas já me embrenhei; e, por fim, o escritor José Sarney, cujos altos méritos literários sempre é necessário realçar, pelo muito que o acossam, por motivos menores, figuras igualmente menores da vida brasileira.
Tanto quanto a eminência dos conferencistas, há que referir a programação editorial levada a bom termo pela Academia, graças aos esforços dos acadêmicos representados na pessoa do presidente Lourival Serejo, insaciável em seus cuidados gonçalvinos, e que logrou a publicação de importantes obras — em parceria com a Universidade Estadual do Maranhão, uma edição fac-similar da biografia do Poeta Maior pelo seu amigo Antônio Henriques Leal; a reedição do quase esquecido Ana Amélia e Gonçalves Dias, a versão escrita de uma conferência ministrada pelo historiador Mário Meireles, em 1948, no Teatro Arthur Azevedo; um número comemorativo da Revista da Academia Maranhense de Letras, que deverá sair nos próximos dias, e no qual tive a honra imerecida de colaborar com um ensaio sobre “Gonçalves Dias e a luso-brasilidade”; e, também em parceria com a UEMA, a reedição de todos os Cantos do Poeta da Raça. Todos esses títulos constituem um feito editorial da Casa centenária.
Tais festividades ainda comportaram um achado documental altamente significativo, a indicar os muitos talentos de Gonçalves Dias e sua condição de frondoso polígrafo — o desembagador Lourival Serejo, que une o talento do escritor à operosidade do pesquisador, encontrou nos velhos arquivos do Tribunal de Justiça os originais de uma antiga peça processual assinada pelo causídico “António Gonçalves Dias”. Semelhante descoberta só ampliará o leque dos estudos acerca do autor das “Sextilhas de Frei Antão”, ao menos no que concerne aos seus aspectos biográficos. Os originais da peça foram doados pela Academia à Fundação Biblioteca Nacional, de que é presidente Marco Lucchesi.
Concluo estas breves considerações com uma reminiscência egrégia — quando, na última sexta-feira, estive com o presidente Sarney, velho cultivador do vício imprudente da bibliofilia, mostrou-me, com entusiasmo juvenil, o surrado exemplar de sua última aquisição: a raríssima editio princeps do Ana Amélia e Gonçalves Dias, publicada, em tiragem modesta, em 1949. Folheei o opúsculo com emoção, sob o olhar marejado do mestre de Norte das Águas e O dono do mar. Eis aí a alegria — parafraseando quem não carece de apresentação — que “fica, eleva, honra e consola”.
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