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COLUNA
Kécio Rabelo
Kécio Rabelo é advogado e presidente da Fundação da Memória Republicana Brasileira.
Kécio Rabelo

Um ano para duzentos

Poetas não morrem, vão fazer poesia em outro lugar.

Kécio Rabelo

A imortalidade dos poetas é mais aceita que a dos deuses. Seus nomes, sempre pronunciados em tons de exaltação, vão se entrelaçando às obras, a elas sedimentadas como história.

De terras férteis para as letras, o Maranhão se consagrou como grande celeiro literário, presenteando o Brasil e o mundo com poetas que marcaram o próprio tempo, contribuindo de forma significativa com nossa identidade e patrimônio cultural. Assim é a terra de Antônio Gonçalves Dias, poeta, teatrólogo, educador, etnólogo e jornalista, nascido em Caxias 200 anos atrás. 

Passado todo esse tempo desde o nascimento do poeta, os nossos olhares se voltam para a vida e a obra do “esperançoso menino do Maranhão”, que cruzou fronteiras e desbravou horizontes, a tantos e muitos levando o nome do Maranhão, saudade sempre presente, embora uma realidade eternamente distante.

Poetas não morrem, vão fazer poesia em outro lugar. Suas palavras são sementes que germinam, florescem e se deixam fecundar no campo da esperança, da beleza, da saudade e mesmo da dor. Talvez por isso, quis a providência divina que nas águas mornas da baía de Cumã, na costa do Maranhão, o poeta filho de Caxias quisesse descansar para sempre, eternizando-se na imensidão do oceano, grande como foi a sua obra, profunda como o amor por sua terra natal, um laço que o eterniza enquanto aproxima dos maranhenses, que nela se reconhecem. 

As celebrações do Bicentenário de Gonçalves Dias, constituem-se em memória viva, e como que atualizam nos nossos sentimentos e propósitos, o amor pelo Maranhão –  terra sagrada que, para além das palmeiras onde canta o sabiá, tem a exuberância natural da Chapada das Mesas, dos campos alagados da nossa Baixada e a beleza indescritível dos Lençóis Maranhenses, que tingem o Maranhão de raríssima beleza e de encantos a se guardar no coração como verdadeiras impressões digitais de memórias, afetos, saberes e amores.

Celebrar Gonçalves Dias, é reparar a história, realçando-o para torná-la maior e ainda mais significativa. É interromper qualquer hiato de esquecimento que, por descuido ou ingratidão, tenhamos tido para com a memória do nosso poeta maior. E é também uma celebração, das mais bonitas e oportunas, ao jeito de ser e de viver, do maranhense por ele traduzido em forma de prosa e poesia, de onde emergimos todos, como alma e corpo.

A Fundação da Memória Republicana Brasileira, cuja missão institucional é a guarda, a preservação e o fomento da cultura brasileira, se junta a outras instituições para capitanear estas comemorações, tendo como cenário principal, o secular Convento das Mercês, onde abriga-se a memória de um dos períodos mais significativos de nossa história recente, um testamento e testemunho eterno da redemocratização do País, tecida e engenhosamente conduzida pelas mãos de outro ilustre maranhense, filho da Baixada, o presidente José Sarney. Orgulho para todos nós e, ao mesmo tempo, imposição de um comprometimento firme e intransigente pela defesa da Democracia, nosso maior patrimônio, tão aviltado em tempos recentes. A ideia de um Brasil Nação, defendido por Gonçalves Dias consolidou-se em definitivo com a volta da normalidade democrática de outrora e de agora, com uma dimensão ainda maior do que representa para cada um o ideal de liberdade que, como dizia a Pastora dos Sonhos, não há quem não compreenda e persiga como desejo final. 

Com uma programação intensa, diversa e inclusiva, a Fundação da Memória Republicana Brasileira proporcionará o conhecimento, a descoberta e aprofundamento sobre vida, obra e legado de Gonçalves Dias, através de publicações, exposições, feiras, simpósios, sessões solenes na Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional, dentre outras ações. É preciso mais! Mais que um ano para celebrar o Poeta, é preciso que seu nome seja conhecido e sua obra revisitada, redescoberta, reeditada e popularizada e, em cada esquina no Maranhão e em todos os recantos do Brasil, havendo palmeiras ou não, seja o ouvido o canto do sabiá, agora ressignificado por esse resgate necessário e tão oportuno.

Enquanto escrevo, avisto os arcos nostálgicos que circundam o claustro do Convento e peço, pois, licença ao poeta para encerrar citando o padre Vieira, hóspede desta casa, que em 31 de janeiro de 1654 proferiu o Sermão de São Pedro Nolasco. Uma conclamação! Verdadeira profecia que plasmou o destino destas paredes e definiu para sempre a vocação deste lugar. “Aqui venhamos, aqui continuemos, aqui acudamos, nos trabalhos, para o remédio, nas tristezas, para o alívio, nos gostos, para a perseverança, e em todos nossos desejos e pretensões, aqui tragamos nossos memoriais, aqui peçamos, aqui instemos, e daqui esperemos todas as mercês do céu, e ainda as da terra, que, sendo mercês da Senhora das Mercês, sempre serão acompanhadas de graça, e encaminhadas à glória.’ 

Viva o Maranhão e seus poetas! 

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