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COLUNA

Marcos Silva
Marcos Silva Marcos Silva é assistente social, historiador e sociólogo.
Marcos Silva

Decretos do saneamento no governo Lula buscam a pacificação entre o público e o privado

O debate em torno do novo marco regulatório expressa uma batalha entre o desejo do crescimento da participação do capital privado em um ramo de atividade dominado pelo capital social.

Marcos Silva

No Brasil os valores cobrados pelas tarifas dos serviços de abastecimento de água são em média R$4,81 para cada metro cúbico de água, ou seja, a cada mil litros de água potável. Quando cobrado pelos serviços de água e esgotamento sanitário juntos o valor médio fica em R$4,51 por metros cúbicos. Quanto às despesas em que as empresas e organizações que atuam com a prestação dos serviços custa em média R$4,24 para produzir e distribuir cada metro cúbico de água. Isso leva a existência de uma suficiência de caixa na ordem de 115,31%. Assim assegurando um lucro de 15,31%.  Essa realidade mostra a viabilidade do negócio, abrindo os olhos e estimulando a ganância do capital privado para a exploração dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário enquanto uma mercadoria com valor de troca.

Portanto, o debate em torno do novo marco regulatório expressa uma batalha entre o desejo do crescimento da participação do capital privado em um ramo de atividade dominado pelo capital social. No ano de 2007 quando se instituiu o marco regulatório com base na lei 11.445/2007, o setor privado fez um prognóstico de expansão da participação do setor nos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em 10 anos na ordem de 20%. No entanto, até o ano de 2015 esse número beirava a casa dos 6% e boa parte das experiências das privatizações sendo questionadas judicialmente e politicamente por inadequações na forma de concessão e pela falta de clareza nos investimentos. Entretanto, o maior descontentamento surge em função dos aumentos das tarifas.

De tal maneira que após o golpe de 2016 contra a Presidente Dilma Rousseff (PT) uma das primeiras iniciativas do Governo Temer foi o impulso ao Programa de Parcerias Público-Privado PPI do saneamento. A referida atitude tinha o claro objetivo de estimular a participação privada. Assim buscou envolver os estados brasileiros na ideia de investimentos obtidos por parcerias com o capital “privado” entre aspa. Pois os recursos em que se pretende contratar são dos fundos públicos, do FGTS e do BNDES.

INDICADORES DE SANEAMENTO NO BRASIL SNIS

Embora a hidrometração chegue à casa dos 91,27% e a macromedição 80,04%. No entanto, a realidade ainda leva a existência de perdas na distribuição na ordem de 40,25% e isso equivale a 333,93 litros de água a cada dia por cada ligação. O consumo per capito é de 150,66 litros por habitante. Vale destacar que atualmente os indicadores de abastecimento de água chegam a 93,46% na área urbana e um total de 84,2% no geral, urbano e rural. O setor de saneamento emprega mais de 230 mil pessoas. O grande desafio é avançar nos serviços de esgotamento sanitário que ainda alcança o atendimento na área urbana de somente 64,8% e no geral de 55,81% da população já tem acesso aos serviços de saneamento/esgoto.  A situação do saneamento básico no Brasil ainda persiste em 37,56% de perdas no faturamento.

INDICADORES DE SANEAMENTO NO NORDESTE

No Nordeste brasileiro a tarifa média de água por metro cúbico chega R $4,45 para uma despesa em média de R$4,42 por metro cúbico distribuído. Isso garante uma suficiência de caixa na ordem de 108,15%, o que leva a um lucro de 8,15%. No entanto, ainda convive com perdas no faturamento de 41,17%. A hidrometração atinge 87,05% das economias e a macromedição chega a 67,14%. O que ainda deixa uma perda na distribuição na ordem de 46,15%. A região tem graves problemas de escassez hídrica e ainda tem perdas de 343,59 litros por ligação dia, isso diante de um consumo per capita de 117,21 litros de água por habitante por dia.

O atendimento urbano de água potável na Região Nordeste chega a 90,11% e o total de domicílios atendidos atinge o percentual de 74,72%. Emprega mais de 50 mil pessoas. O Nordeste ainda padece da carência nos serviços de esgotamento sanitário. Pois somente 39,19% dos domicílios urbanos possuem atendimento e no total 30,20%.

TARIFAS E INDICADORES DE SANEAMENTO NO MARANHÃO

A situação no estado do Maranhão com relação aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário ainda são indicadores que demonstram uma precariedade na oferta dos serviços. Embora o estado seja rico em recursos hídricos, se mantém pobre em políticas públicas de abastecimento de água, além de ofertar baixos indicadores de coleta e tratamento de esgoto. Ou seja, cuidamos poucos dos córregos, riachos, lagos e rios. Tal atitude reflete na falta de controle e cuidado dos mananciais superficiais e subterrâneos.

No estado do Maranhão o preço da tarifa média é de R$3,53 por metro cúbico distribuído para uma despesa de R$4,21 para cada metro cúbico produzido e entregue aos usuários. Essa equação gera uma suficiência de caixa na ordem de 63,54%, ou seja, prejuízos em mais de 35%. Vale destacar que o preço da tarifa praticada pela CAEMA principal operadora com capital majoritário do Governo do Estado é ainda abaixo da média estadual, pois o valor é de R$2,49 por metros cúbicos, sendo a menor tarifa praticada no país.

O atendimento urbano chega a 78,47% e no total a 55,80% dos domicílios com os serviços de abastecimento de água. Aqui destacamos que a CAEMA mesmo cobrando a menor tarifa, entretanto é a organização que oferece melhores indicadores dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário. O que ainda está distante de garantir melhorias nos Índices de Desenvolvimento Humano/IDH.

INDICADORES SÃO LUÍS/MA

Por exemplo, na região metropolitana operados pela CAEMA São Luís já possui atendimento a 52,78% dos domicílios urbanos e 49,85% do total, com relação ao abastecimento de água a área urbana conta com 91,48% de atendimento e o total 86,41%.

INDICADORES PAÇO DO LUMIAR/MA

Enquanto Paço do Lumiar operados pela BRK privatizado há 9 anos apresenta 42,29% de atendimento urbano e 31,85% do total de domicílios e referente ao abastecimento de água 90,44% possui atendimento e no total em função da zona rural ser atendida por uma autarquia municipal o Serviços Autônomo de Água - SAA o percentual chega a 76,61%.

INDICADORES SÃO JOSÉ DE RIBAMAR/MA

São José de Ribamar também operados pela BRK possuem 39,93% de atendimento urbano e somente 9,24% do total dos domicílios do município tem a oferta dos serviços de esgotamento sanitário, com relação ao abastecimento de água na área urbana a cidade Santuário de Ribamar atende 96,38% dos domicílios, mas em função de não atender a zona rural o total de atendimento fica no ridículo 22,29%.

Aqui destaca-se que nestes dois últimos municípios os serviços de esgotamento sanitário resultam dos empreendimentos financiados pela Caixa Econômica Federal que já foram entregues com sistemas de esgotamento sanitário e os metros de redes de esgoto são resultados de investimentos anteriores à privatização.

INDICADORES DE IMPERATRIZ/MA

O segundo maior município em população no estado do Maranhão é Imperatriz que já possui 31,84% dos serviços de esgotamento sanitário oferecidos aos domicílios na área urbana e 30,17% na área total do município. Serviços operados pela CAEMA. Quanto ao abastecimento de água, a Princesa do Tocantins oferta na área urbana 92,44% e no total 87,60%.

INDICADORES DE TIMON/MA

Já o município de Timon operado pelo setor privado há mais de 10 anos oferece somente 3,66% dos serviços de esgotamento sanitário para a área urbana e 3,18% no total. Relativo ao abastecimento de água no município na área urbana já universalizou os serviços com 100% da população atendida, no total incluindo a população rural onde opera um SAA já se chegou a 93,20%.

Percebe-se que os municípios que privatizaram os serviços de água apresentam bons indicadores na área urbana e na área rural somente os que contam com a participação das prefeituras conseguem ter um bom resultado. Outro elemento é que quando foram privatizados já encontraram as áreas urbanas com uma certa quantidade de serviços, mas temos que reconhecer um certo investimento em substituição de redes e perfuração de novos poços pelo setor privado. No entanto cobrando uma tarifa elevada para a realidade socioeconômica dos municípios.

De tal forma que o discurso de privatização para avançar na universalização aqui no estado do Maranhão fica fragilizado. Pois a maioria dos esforços com investimentos para a expansão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário têm sido realizados pelo Governo do Estado do Maranhão como proponente e a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão/CAEMA como executora interveniente e operadora dos serviços.

QUAIS OS CAMINHOS MAIS SEGUROS PARA UNIVERSALIZAR OS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO, ÁGUA E ESGOTO NO ESTADO DO MARANHÃO?

Com os novos decretos do governo Lula fica claro que a titularidade dos serviços é dos municípios, ressalvados em regiões metropolitanas e em microrregiões de saneamento. O município pelo novo marco regulatório opera de forma direta ou lícita os serviços. Também o município pode aderir as microrregiões de saneamento e esse arranjo passa a ser o titular dos serviços e responsável pelo planejamento e investimentos para a universalização e por decidir sobre a quem conceder a operação dos serviços, tendo o direito de operar diretamente por meio de estrutura da administração direta e indireta.

Não temos dúvidas de que o governo de Lula em 2007 constituiu um marco regulatório com espaço para a participação do setor público e do setor privado na operação dos serviços de saneamento básico. Entretanto com o passar do tempo as iniciativas de privatização foram se desmoralizando e fracassando frente aos investimentos. Assim as Empresas de economia mistas estaduais foram se fortalecendo com os projetos de expansão dos serviços.

Diante do exposto acima o governo Bolsonaro foi construído um ambiente privatista e que resultou na lei 14.026/2020. Tal legislação entrava a continuidade da prestação dos serviços por uma parte significativa das empresas de sociedades de economia mista que optaram por vir praticando uma política de tarifas acessíveis à população e ao mesmo tempo acumulou-se os problemas de ineficiência na manutenção dos equipamentos, o que levou ao desgaste dos sistemas de abastecimento reduzindo a capacidade de investimentos com recursos próprios em pequenos projetos.

A CAEMA é um exemplo dessa realidade, onde frente ao novo marco regulatório não tem como comprovar a capacidade econômica e financeira para a universalização dos serviços. Porém possui uma grande capacidade de operação dos serviços a baixo custo para os usuários. Então sendo a principal ferramenta para os municípios garantir uma operação com a cobrança de tarifas que expresse a realidade financeira da população maranhense.

Dito isso, o caminho para o governador Carlos Brandão buscar a universalização dos serviços de saneamento básico sem penalizar a população com tarifas altíssimas é a instituição das microrregiões de saneamento e garantido a CAEMA como operadora dos sistemas de água e esgotamento sanitário. Isso não significa a impossibilidade de realização de uma parceria público-privada para o setor de esgotamento sanitário.

Será importante que o governador Carlos Brandão aproveite o ambiente de pacificação entre o Público e o Privado constituído pelo Governo Lula. 

Como diz Araújo e Bertussi apud Scriptore e Toneto Júnior (2012), os provedores públicos podem alcançar com maior probabilidade determinados objetivos de natureza social, enquanto os provedores privados podem ser mais capazes de alcançar eficiência técnica ou financeira. Isso não significa que o setor público não tenha capacidade técnica, mas sim, em função da flexibilidade nas contratações de profissionais e compras dos demais insumos. Agora a privatização de serviços essenciais para a saúde pública e para a defesa do meio ambiente não me parece uma alternativa adequada.

O certo é que não se pode pensar o Desenvolvimento Humano no Estado do Maranhão sem a expansão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Não por acaso lá no ano de 1966 quando São Luís possuía apenas 130 municípios e as cidades com mais de 5 mil habitantes recebiam recursos e apoio técnico da Fundação/SESP para os serviços de saneamento básico. No entanto, os municípios com população inferior a 5 mil habitantes foram abandonados à própria sorte. Então o recém-empossado Governador do Estado, José Sarney, orientado pelo visionário jovem Engenheiro Civil o Francisco Salles Baptista Ferreira foi até o estado do Paraná conhecer a experiência da SANEPAR para então constituir a CAEMA, que inicialmente operava somente o município de Chapadinha e ao passar destes 56 anos foi se transformando nesta grande organização que hoje opera em 138 cidades maranhenses e vem colaborando para a melhoria dos indicadores de saneamento básico.

GOVERNANÇA DA ÁGUA E DO SANEAMENTO

Agora é preciso organizar a governança da água e das políticas públicas de saneamento para que possamos ter a gestão das diretrizes e programas de proteção dos recursos hídricos e o avanço da universalização dos serviços de saneamento básico. O estado precisa proteger os rios e suas águas. O Estado precisa realizar investimentos apoiados no governo federal juntamente com as prefeituras em soluções de drenagem urbana e remoção de moradias construídas em áreas de alagamento para evitar os constantes prejuízos materiais e até perdas de vidas em função dos períodos de intensas chuvas.

O Estado precisa auxiliar na busca do perfeito gerenciamento dos resíduos sólidos e a sua adequada destinação, investir em serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário para garantir a expansão da qualidade de vida da população e melhorias no IDH.

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