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COLUNA

Marcos Silva
Marcos Silva Marcos Silva é assistente social, historiador e sociólogo.
Marcos Silva

Plano Diretor de São Luís, qual a cidade que queremos?

Marcos Silva, Assistente Social, Historiador, Sociólogo, Especialista em Gestão de Cidades e Planejamento Urbano e Mestre em Desenvolvimento Socioespacial e Regional.

Marcos Silva

Atualizada em 02/05/2023 às 15h58
Marcos Silva, Assistente Social, Historiador, Sociólogo, Especialista em Gestão de Cidades e Planejamento Urbano e Mestre em Desenvolvimento Socioespacial e Regional.
Marcos Silva, Assistente Social, Historiador, Sociólogo, Especialista em Gestão de Cidades e Planejamento Urbano e Mestre em Desenvolvimento Socioespacial e Regional. (Ipolítica)

O atual modelo de urbanização resulta da expansão do capitalismo em um processo contínuo de mais de 4 séculos. As cidades dos países hoje ditos desenvolvidos já passaram por problemas semelhantes aos enfrentados na atualidade por países com economias capitalistas em desenvolvimentos e até as cidades de economias subdesenvolvidas. Ausência de saneamento básico e moradias em péssimas condições sanitárias, tanto Londres na Inglaterra como Paris na França foram cenários deste quadro vivenciados na maioria das cidades do Brasil, na África e Ásia.

O capitalismo no Brasil começou a se expandir a partir de meados do século XX, o que levou a uma explosão demográfica aumentando a população urbana. De forma que também surgiu as favelas e os bairros periféricos como local de moradia da jovem classe operária brasileira. De acordo com Farias (2005), em torno de 165% no período de 1970 ao ano de 2000. O autor destaca ainda que a população no país cresceu em 82% no mesmo período.

De acordo com Marx (1848) o capitalismo possui entre as suas principais contradições o trabalho coletivo e a apropriação privada do resultado do trabalho social. Tal realidade se denomina “A questão Social” e que reproduz “as expressões da questão social” configuradas a partir das desigualdades na distribuição do capital produzido socialmente. Ou seja, os espaços de moradias dos segmentos empobrecidos e dos operários não recebem as mesmas condições de bem-estar social iguais aos espaços de moradias dos segmentos enriquecidos. Para os pobres é quase que naturalizado a falta de saneamento básico e de infraestrutura urbanizada.

Como diz Santos (2005) a urbanização não é um processo natural, no entanto é resultado de fatores políticos, sociais e econômicos, o qual pode gerar desigualdades. De tal maneira que as melhorias no processo de urbanização que assegure condições de vida com desenvolvimento econômico, defesa do meio ambiente e redução das desigualdades entre as classes sociais, são partes da luta socialista democrática forjada na batalha pelo desenvolvimento nacional.

No Brasil existe um processo histórico de luta popular continua no enfrentamento das expressões da questão social, a exemplo, a luta por uma cidade mais igualitária nas condições de moradias e uso dos recursos naturais. Bem como, a universalização das políticas públicas, das tecnologias e do emprego. Pois não por acaso foi consolidado na Constituição Federal de 1988, nos artigos 183 e 184, os instrumentos constitucionais para assegurar o pleno desenvolvimento urbano para serem praticados pelos municípios brasileiros com o objetivo de garantir o desenvolvimento urbano e a função social da cidade. O que vai resultar na Lei 10.257/2001, que institui o “Estatuto das Cidades”.

A experiência de planejamento urbano no Brasil antecede a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto das Cidades. No entanto, tais instrumentos são resultados de um longo debate na sociedade em busca de responder aos desafios de uma reforma urbana nas cidades brasileiras.

A experiência de planejamento urbano de 1975 na cidade de São Luís tinha como objetivo responder à onda de crescimento urbano no país nos anos 60 ao início do século XXI. Ou seja, a capital maranhense como exemplo: saiu de 159.628 mil habitantes em 1960 para mais de 1 milhão de habitantes no ano de 2010. Esse crescimento se deu em função do êxodo rural provocado pelo emprego na construção civil nas obras de habitação e infraestruturas em desenvolvimento na capital maranhense.

O retrato da cidade de São Luís produz uma ocupação Socioespacial com degradação ao meio ambiente e a existência de moradias em áreas inapropriadas com a destruição de rios e manguezais. O poder público construiu os instrumentos de planejamento urbano muito distante de resultar em uma ampla participação popular. Claro que ter uma cidade bem definida com seu plano diretor e macrozoneamento ecológico e econômico organizado é o melhor cenário político. Além da construção dos planos setoriais, a exemplo do saneamento básico, ambiental e uma firme postura na socialização do uso e ocupação do solo levando em consideração a defesa dos recursos naturais, se torna o grande desafio dos gestores políticos, parlamentares e da sociedade civil organizada.

Agora a discussão sobre o Plano Diretor de São Luís carece de um entendimento sobre a luta por espaços, entre os segmentos da classe trabalhadora e os empobrecidos contra os que planejam o desenvolvimento econômico e obviamente as cidades como expansão do capital. Ou seja, é preciso organizar espaços para o mercado imobiliário e para a implantação das indústrias e do comércio. Essa tendência é natural no modo de produção capitalista.

No entanto, o Plano Diretor necessariamente não deve gerar prejuízos ao desenvolvimento econômico nos municípios. Mas faz-se necessário a implementação de Planos Diretores que atentem para a preservação dos recursos naturais e a proteção dos espaços de atividades da agricultura, da pecuária e da pesca. A cidade precisa de um espaço para produção de alimentos, a cidade precisa de fontes de água, a cidade precisa de rios e lagos para a dessedentação de animais e as melhorias climáticas. Ou seja, a cidade precisa do meio ambiente artificial, mas preservando o máximo, o meio ambiente natural.

Então, não podemos ter de um lado um segmento que só pensa na cidade como forma de produzir ganhos económicos, assim como não devemos deixar de afirmar que é importante o desenvolvimento económico. A geração de empregos por meio da construção civil e a industrialização da cidade de forma sustentável são elementos imprescindíveis ao desenvolvimento econômico. Entretanto, cabe ao poder público, prefeitura e poder legislativo buscar por meio da participação popular a construção de um Plano Diretor focado no desenvolvimento sustentável, o que significa construir uma cidade socializável para todos.

Quanto ao texto transformado no PL 174/2019 que foi encaminhado à Câmara de Vereadores e colocado em discussão nas audiências públicas por iniciativa do Parlamento Municipal é progressista ao definir no Art. 2º o estabelecimento das seguintes definições:

I – FUNÇÃO SOCIAL DA CIDADE é a função que deve cumprir a cidade para assegurar a plena realização dos direitos de todos os cidadãos à moradia digna, aos serviços públicos de saneamento ambiental, infraestrutura, transporte, educação, saúde, cultura, esporte, lazer, trabalho, segurança, acessibilidade e mobilidade, informação, participação e decisão no processo de planejamento territorial municipal;

II – FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE é atendida quando o uso e a ocupação da propriedade urbana e rural correspondem às exigências de ordenação do Município, ampliando as ofertas de trabalho e moradia, assegurando o atendimento das necessidades fundamentais dos cidadãos, proporcionando qualidade de vida, justiça social e desenvolvimento econômico sem o comprometimento da qualidade do meio ambiente urbano e rural;

III – DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL é o desenvolvimento local equilibrado e que interage tanto no âmbito social e econômico, como no ambiental, embasado nos valores culturais e no fortalecimento político-institucional, orientado à melhoria contínua da qualidade de vida das gerações presentes e futuras;

IV – SUSTENTABILIDADE SOCIOAMBIENTAL é entendida como o equilíbrio dos fluxos socioambientais através de um modelo de desenvolvimento economicamente eficiente, ecologicamente prudente e socialmente desejável;

V – ÁREA URBANA corresponde à parte do território municipal em que predominam as atividades econômicas secundárias e terciárias existindo uma legislação urbanística que disciplina o uso, o parcelamento e a ocupação do solo; área caracterizada, ainda, pela maior densidade populacional e viária, pela maior fragmentação das propriedades imobiliárias, e onde os serviços e equipamentos estão consolidados e contínuos;

VI – ÁREA RURAL é a parte do território municipal em que predominam as atividades econômicas primárias, com potencial agrícola, pecuário, aquícola, pesqueiro, extrativista e agroindustrial; caracteriza-se, também, pela presença de enclaves urbanos e pela descontinuidade espacial da extensão dos serviços e equipamentos públicos;

VII – URBANIDADE é o resultado das relações entre os modos de viver na cidade, a cultura urbana e sua materialidade, ou seja, a forma do espaço urbano. Considera-se que as formas que a cidade assume estão vinculadas a diferentes modos de vida.

Pois bem, diante deste entendimento cabe a realização posterior de um trabalho técnico para definir as características socioeconômicas e socioespaciais existentes nas áreas do território de São Luís, assim finalmente definir com clareza o que é urbano e o que é rural. Neste trabalho técnico também deve-se levar em consideração as áreas de comunidades tradicionais existentes no município de São Luís e que vem sofrendo pela ausência do poder público com a garantia de direitos e incentivos à produção, tal fato tende a transformar muitas comunidades tradicionais em territórios de difícil sobrevivência econômica.

A São Luís precisa construir um grande Conselho de Políticas Urbanas com a participação do poder público e da sociedade civil organizada, além da colaboração da comunidade académica para juntos construirmos a cidade que queremos.


 

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