(Divulgação)

COLUNA

Allan Kardec
É professor universitário, engenheiro elétrico com doutorado em Information Engineering pela Universidade de Nagoya e pós-doutorado pelo RIKEN (The Institute of Physics and Chemistry).
Desenvolvimento

O Corredor Centro Norte

Guerra é obviamente disputa de poder. Territorial. Mas principalmente disputa por controle de energia. É o que estamos vendo na Europa: a disputa pelo gás liquefeito.

Allan Kardec

Atualizada em 02/05/2023 às 23h38
Mapa da Hinterlândia do Porto do Itaqui
Mapa da Hinterlândia do Porto do Itaqui

Guerra é obviamente disputa de poder. Territorial. Mas principalmente disputa por controle de energia. É o que estamos vendo na Europa: a disputa pelo gás liquefeito. Quem vai vender gás para Alemanha? A Rússia, que fornece via um imenso gasoduto, o Nord Stream – que estava em vias de duplicação? ou os Estados Unidos, que se tornaram o maior produtor do planeta de gás liquefeito nos últimos 10 anos, e forneceria via Oceano Atlântico?

É conhecida pelos estudiosos a relação direta entre riqueza e alto consumo de energia e o contrário também: pobreza e baixo consumo. Essa característica pode ser observada nos mapas. Quando ainda diretor da ANP, iniciamos um estudo para entender a distribuição de combustíveis do Brasil. O mapa constatou a imensa desigualdade de nosso país: os postos estão majoritariamente distribuídos abaixo de Brasília e predominantemente concentrados no litoral.

É o que chamo de “política litorânea”. Algo que se repetiu nos últimos cinco séculos. O mais grave foi constatar que, junto à distribuição desigual de combustíveis, os gasodutos seguem margeando o litoral, além de nessa região estarem concentradas majoritariamente as rodovias e ferrovias.

Nas últimas décadas, sabemos também que houve um grande desenvolvimento de grãos em torno dos Estados mato-grossenses. Esse conhecido complexo de soja e milho pode ser entendido segundo dois cenários, segundo a Empresa de Planejamento e Logística: o de exportação e o de consumo interno. No cenário de exportação, a logística se concentra basicamente em rodovias rumo ao Sul e ao ocidente. Já a logística do consumo interno no eixo central oriental do Brasil: margeando novamente o litoral.

O mesmo acontece com os corredores logísticos de gasolina e diesel: ou se movimenta pelo litoral ou via a rede hidroviária da Amazônia brasileira. Ou seja, o sistema de distribuição de combustíveis do Brasil peca por não ter conexões entre os seus corredores e deixa o seu centro vazio.

O que há em comum nos casos dos grãos e dos combustíveis? A logística reforça a pobreza do interior do Brasil. Há 500 anos. Mas a boa notícia é que, nos dois cenários, há convergência para Maranhão. Mais ainda, há numa clara tendência de reversão no volume de exportação pelo Arco Norte - ao Norte de Brasília – para o Porto do Itaqui.

É como se tivessem virado o Brasil de cabeça pra baixo. Em vez de os produtos saírem ou entrarem pelo vigoroso Sudeste, há uma reversão nos gráficos mostrando o escoamento saindo pelo Porto do Itaqui.

O que fez isso acontecer? A Ferrovia Norte Sul, terminada ano passado em um trecho de 1500 km pela Rumo, entre Porto Nacional, no Tocantins e Estrela D’oeste, São Paulo. Veja bem, uma ferrovia essencial para o desenvolvimento nacional demorou quase 40 anos para ser construída! Enquanto isso, a Europa e os Estados Unidos resolveram suas vidas fazendo as suas redes ferroviárias e seus gasodutos para abastecer seus territórios. Os “Josés” Sarney e Reinaldo Tavares vislumbraram em 1985 o que hoje se concretiza.

Falei disso para falar da potência que é o Porto do Itaqui – e sua gigantesca importância para o Maranhão. Cresceu extraordinariamente na gestão Flávio Dino e Ted Lago. Vem se tornando de central importância para o Brasil com a sua hinterlândia – que é a área de influência. Hoje ela vai até o Mato Grosso, mas em 2027 deve alcançar a fronteira com a Bolívia.

E olha que não falamos do Porto Seco em Imperatriz, que exercerá papel central na logística de transporte ferroviário e rodoviário do país. Ou seja, o Maranhão se torna, a cada dia um “hub” logístico, de central importância para o desenvolvimento nacional.

Para se ter uma ideia, hoje transitam em torno de 600 caminhões diariamente no Porto do Itaqui. No pico da safra são de 1200 a 1800. Qual cidade ou estado brasileiro não gostariam de ter algo dessa envergadura!? Aliás, cabe a questão que muitos que trabalham na área fazem: porque São Luís não se reconhece como “cidade portuária”? 

Nesse cenário que nasce, cabe-nos indagar que papel os maranhenses jogarão nas próximas décadas. Que posições eles ocuparão nas empresas e organismos que aqui se instalam ou se instalarão. Creio que seja de fundamental importância que os órgãos de educação como universidades e escolas estejam atentos. Os cursos têm de estudar logística, prover disciplinas de logística. De outra forma, que dirão ou dizem os graduandos que chegam para trabalhar no entorno do Porto? Em grandes ou pequenas empresas? Igualmente, urge termos cursos de Engenharia Portuária e Engenharia Naval.

O Porto do Itaqui tomou a iniciativa de dar o passo inicial. Vai investir R$ 40 milhões de reais em pesquisa e desenvolvimento na área portuária. O público são justamente as universidades maranhenses. É um projeto ousado e único. Não existe em qualquer outro porto do Brasil!

A guerra acontece na Europa. Mas a reconfiguração que acontece é planetária. Os Estados Unidos se tornaram o maior produtor do mundo de petróleo & gás graças à sua Ciência e uma rede de gasodutos muito consolidada. E hoje enfrenta a Rússia (também) porque iria incrementar seu gasoduto pra Alemanha.

 O mundo não vive sem logística. E o Brasil passa pelos seus trilhos, rodovias e portos.

*Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP

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