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COLUNA

Euges Lima
Euges Lima é historiador, professor, bibliófilo, palestrante e ex-presidente do IHGM.
Euges Lima

O “herói obscuro” do 17 de novembro de 1889

O fuzilamento do dia 17," que foi uma grande onda de manifestações populares, compostas, principalmente por ex-escravizados, mestiços, negros e "pardos", ocorrida durante todo esse dia que abalou a cidade de São Luís.

Euges Lima

Um dia antes da proclamação da República no Maranhão (18 de novembro), dia 17 de novembro de 1889, antes de sua oficialização e instalação, ocorreu em São Luís uma forte reação popular ao novo regime – que estava na iminência de ser implantado – e ao suposto retrocesso que ele poderia vir a trazer, principalmente no que concerne a questão escravista. Esse episódio ficou conhecido como "Movimento popular 17 de novembro ou O fuzilamento do dia 17," que foi uma grande onda de manifestações populares, compostas, principalmente por ex-escravizados, mestiços, negros e "pardos", ocorrida durante todo esse dia que abalou a cidade de São Luís, concentradas nas imediações da Rua 28 de Julho (Rua do Giz), n.º 05, cruzamento como o Beco do Vira-Mundo, onde se localizava a redação do Jornal republicano "O Globo", que tinha como redatores, Paula Duarte e Casimiro Jr. 

Diante das inúmeras informações e boatos que circulavam na cidade, naquele 17 de novembro, sobre a queda da Monarquia e instauração da República no Rio de Janeiro; boatos de revogação da Lei Áurea e retorno da escravidão com o novo regime, as massas urbanas de ex-escravizados de São Luís, leais à monarquia, agora, homens livres, se organizaram em grandes manifestações e focaram em uma das principais lideranças do movimento republicano da capital, o bacharel em Direito e jornalista, Francisco de Paula Belfort Duarte, o famoso “Paula Duarte”, conhecido por sua eloquência, seus discursos inflamados em Praça pública e por ser um grande tribuno e agitador popular. 

O objetivo inicial desse movimento era impedir a ida de Paula Duarte para uma conferência com populares, convocada por ele que iria acontecer na Câmara Municipal, provavelmente para mobilizar a população para o fim da Monarquia no Maranhão e ascensão da República, trazendo certamente o conteúdo dos últimos telegramas do que ocorria na Capital do Império.

 

Hoje, vamos tratar como o título sugere, expressão usada por Dunshee de Abranches − no livro A Esfinge do Grajaú, 1959 − para denominar um dos supostos negros manifestantes que do alto da ladeira do "Vira-Mundo", hoje, escadaria, envolto da bandeira imperial teve o peito atingido por bala, aos gritos de "Viva a monarquia...!" 

Esse suposto personagem dessas manifestações pro-monarquia, compostas principalmente por negros, mestiços e "pardos," nesse alvorecer do regime republicano no Maranhão, foi citado pela primeira vez por Dunshee de Abranches que o chamou de "herói obscuro", obviamente por não conhecer sua identidade... Ou porque simplesmente tratava-se de um personagem simbólico, fictício que ele criou para dar um teor mais romântico e dramático para história? 

Segundo Abranches, “Era um negro; devera a liberdade à Lei Áurea de 13 de Maio; e, ao ver os soldados descerem em perseguição dos fugitivos, arrancou da haste a flâmula auriverde e, enrolando-se nela, com o peito já crivado de balas, com a voz forte e resoluta bradou;  " Viva a Princesa Redentora, viva a Monarquia! " Conclui Abranches, sugerindo a morte do manifestante negro: “Assim tombava na tarde trágica de 17 de novembro de 1889, em São Luís do Maranhão, aquele herói obscuro.” Na verdade, foi à noite o momento do fuzilamento, por volta das 19 horas, nas proximidades da Rua 28 de Julho, esquina com a Rua dos Barbeiros ou Ladeira do Vira-Mundo, no Bairro da Praia Grande.

De acordo com os Mapas dos feridos que deram entrada naquela sangrenta noite no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, fontes primárias, que tivemos acesso, cotejando com essa passagem de Abranches, podemos a princípio, tirar pelo menos duas conclusões: a primeira, o personagem “heroico” poderia ter existido, pois havia entre os feridos, certo Manuel da Silva Assunção que foi alvejado no peito direito; segunda, ao contrário do que pensou Dunshee de Abranches, sobreviveu aos ferimentos, foi internado e teve alta do Hospital no dia 21 de dezembro de 1889. 

Como podemos ter certeza? Porque das catorze vítimas, entre mortos e feridos desse massacre que deram entrada no dia 17 de novembro na Santa Casa, apenas um foi registrado com ferimento à bala no peito, foi ele, “O herói”, agora, não mais tão obscuro, Manuel da Silva Assunção. Todos os demais feridos e mortos, foram registrados com ferimentos em outras áreas do corpo, como pernas, braços e mãos, inclusive, vários sobreviventes, tiveram membros amputados. Os nomes dos quatro mortos foram: João de Brito (40 anos); Sérgio (22 anos); Martinho (29 anos) e Raimundo Araújo Costa (34 anos), todos “pardos” e pretos, vítimas da repressão a essas manifestações populares que ocorreram no dia 17 de novembro de 1889 em São Luís, pró-monarquia e contrárias a proclamação da República.

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