Fonte de renda e problemas: a Laguna da Jansen e suas peculiaridades
O crescimento desta parte da cidade, com o projeto de revitalização, também trouxe elementos negativos, como a construção desordenada de imóveis sem planejamento urbano
SÃO LUÍS - Com o projeto de revitalização encabeçado pelo Governo do Maranhão no início dos anos 2000, a Laguna (ou Lagoa) da Jansen passa a ser referência na estrutura de lazer e entretenimento da cidade. A maior presença de frequentadores atraiu empreendedores e possibilitou o surgimento de negócios voltados para a oferta de serviços, como bares e restaurantes. Além disso, os imóveis antigos elevaram seus custos no mercado.
No entanto, o crescimento desta parte da cidade, com o projeto de revitalização, também trouxe fatores negativos, como a construção desordenada de imóveis sem planejamento urbano, ausência de preparação da estrutura básica (como canais de descarte de esgoto) e insegurança aos usuários. São comuns as reclamações de assaltos frequentes no entorno da Laguna.
A formação hidrográfica também propiciou, ao longo das décadas, que comunidades ribeirinhas na Laguna sobrevivessem da pesca. Até hoje, alguns pescadores dependem do alimento encontrado na Laguna. Parte da produção é usada para subsistência (ainda que com restrições, pois a laguna recebe materiais de despejo sólido) e outra para revenda. A oferta dos peixes no local depende de fatores relacionados ao volume de chuvas e ao fluxo da maré que deságua na laguna.
Os pescadores que vivem da Laguna: a fonte de renda e consumo
Na comunidade no entorno da Laguna da Jansen, é possível encontrar vários pequenos barcos atracados e mantidos por pescadores que, diariamente, seguem com suas embarcações para capturar peixes na formação aquática. O mais comum, de acordo com os próprios, é a tainha (considerado um peixe popular e barato).
Segundo pescadores, o horário mais propício para o resgate de peixes na laguna é durante as madrugadas e início de manhãs. É neste período que as espécies saem dos seus “esconderijos” e se aproximam da superfície em busca de alimento.
Outro fator considerado para a pesca na laguna é o clima. Em meses mais chuvosos, o aumento no volume de água da laguna costuma propiciar o aparecimento de mais peixes. No entanto, esta referência é variável. Nos meses mais quentes, é registrada uma elevação no quantitativo de mortandade dos peixes, com a gradativa diminuição dos níveis de oxigênio nas águas.
Mesmo sob as recomendações de especialistas de perigos no consumo dos peixes oriundos da laguna, por falta de alternativas e com a alegação de baixa condição de renda, os pescadores sobrevivem e se alimentam dos peixes da laguna.
Histórias de vida não faltam.
Trabalhadores que cresceram pegando peixes na Laguna da Jansen
Em pleno fim de tarde, o pescador Carlos Magno Moraes, de 43 anos, prepara o seu pequeno barco para a captura do peixe nas primeiras horas do dia seguinte. Com um balde e instrumentos, o trabalhador retira o excesso de água da embarcação que penetrou devido a alguns furos na mesma.
Durante o conserto do barco, o pescador contou a sua história da vida a O Estado. Ele contou que sempre residiu no entorno da laguna. “Eu me lembro de quando isso aqui era somente um igarapé. Dava muito peixe. Vinha com meu pai e o ajudava. O ofício ficou”, disse.
Entre um e outro emprego em outro setor temporário, Carlos Henrique nunca abandonou a pesca na laguna. “Aqui, depende muito da época do ano. Tem período em que está bom de peixe, em outros não está. Depende também da abertura da comporta”, disse ao se referir à estrutura que faz o controle de vazão entre as águas da laguna e do mar.
A pesca não costuma gerar grandes quantitativos. “Dá apenas alguns quilos para revender e uma parte eu guardo ou consumo. Muita gente fala do risco de comer um peixe daqui, mas a gente precisa, é daqui que também tiro o meu sustento”, afirmou.
Ao lado de Carlos Henrique, está o filho dele, o jovem Carlos Nicholas, de apenas 5 anos de idade. A criança – que adora passear no velho barco do pai – já parece seguir os passos da geração da família na atividade pesqueira da laguna. “Com certeza, um dia, ele [Carlos, o filho] vem pescar aqui”, disse Carlos Henrique.
O também pescador José Carlos Silva, de 39 anos, disse que extraiu o ofício da pesca a partir das orientações do pai, José Henrique, nascido na Baixada Maranhense. Na região do Estado propícia para a pesca, José Henrique passou o gosto pela pesca ao filho que, por sua vez, quando comprou uma casa no entorno da laguna, passou a seguir a atividade. “Foi através do meu pai que passei a gostar de pescar na laguna. Só que a gente pega para vender mesmo, uma vez ou outra consumimos”, disse.
Ele lamenta a ausência de política de estado para a despoluição do local. “O mau cheiro por aqui a gente até se acostumou já. O que deveria acontecer era uma limpeza disso aqui. Já vi muito peixe morto por falta de limpeza”, disse.
Além de ser fonte de renda, a laguna também tem relação com parte da cultura popular da cidade.
A “cuidadora” da laguna: a serpente famosa
Em 2001, ao ser entregue, o projeto de revitalização do Parque da Lagoa (ou Laguna) da Jansen recebeu o acréscimo do trabalho concebido pelo artista plástico Jesus Santos. Com atuais 74 metros de comprimento, a estrutura em sua concepção original geraria movimentos com o balanço das águas que dariam maior realidade ao trabalho.
No entanto, o excesso de materiais orgânicos na laguna desmobilizou a ideia. Atualmente, a serpente ainda é vista na laguna, com face voltada para a avenida Mário Meirelles e parte inferior avistada às margens das comunidades no entorno.
No dia 26 de abril de 2018, O Estado publicou reportagem intitulada “Serpente da Lagoa da Jansen poderá ser revitalizada”. Na ocasião, a Secretaria de Estado da Infraestrutura (Sinfra) informou que “um levantamento estava sendo realizado para identificar as intervenções necessárias para sua recuperação”. No entanto, pouco mais de dois anos depois, o projeto não saiu do papel.
Até o fechamento desta edição, procurada, a Sinfra não informou se a serpente será recuperada. A torcida é que a reforma da serpente não vire uma lenda, tal qual é o animal para o imaginário da Ilha. Diz o causo que uma serpente encantada vive nas galerias subterrâneas da cidade e que, por seu tamanho abissal, cresce de tal forma que em alguns momentos o animal é avistado na superfície.
A beleza natural da laguna é aproveitada por frequentadores, no entanto, a área precisa de intervenções. Algumas delas já são realizadas pela atual gestão do governo estadual.
Faltam deques e mirantes e sobram reclamações
Durante as tardes, é comum ver pessoas acima dos 60 anos aproveitando o bom tempo para uma caminhada. No entanto, os usuários reclamam da ausência de policiamento na região da Laguna (Lagoa) da Jansen.
O aposentado Luzimar Sipaúba disse a O Estado que costuma ir à pista da Laguna da Jansen para praticar atividade física. Apesar de nunca ter sido assaltado, para ele, falta policiamento. “Isso é uma questão importante. Outro ponto é o descarte irregular de lixo às margens das águas”, disse.
Sobre a limpeza, apesar da regularidade no serviço de recolhimento dos resíduos sólidos pela Prefeitura de São Luís, infelizmente alguns moradores e frequentadores – sem consciência – ainda despejam sujeira na área ambiental. Quanto ao policiamento, o local registra ponto fixo de segurança. Sobre as ações realizadas para garantir o bem-estar dos frequentadores, o Governo do Estado não se manifestou até o fechamento desta edição.
Além da insegurança, as estruturas usadas anteriormente para a contemplação da laguna estão deterioradas, ou simplesmente não existem. Casos do mirante (retirado há alguns anos) e dos deques. De acordo com populares, os deques serão reformados. No entanto, não há no local nenhuma placa de aviso informando acerca das intervenções.
Contemplação e paisagem
Na área do Parque da Laguna da Jansen, é comum ver casais usando a bela paisagem para a produção de books. É o caso dos jovens Leilton Oliveira e Leonardo Câmara. “Nós sempre achamos bela esta paisagem da Lagoa [Laguna] da Jansen. Por isso, decidimos aproveitar. E as fotos ficam melhores com nós de modelos”, disse em risos Leilton Oliveira.
Passo a passo
Lei nº4.878 – De 23 de junho de 1988
Transforma a Lagoa de Jansen em Parque Ecológico do Estado, para fins de uso público, diversão, esportes e áreas verdes dentro dos limites a serem fixados pelo poder público
30 de dezembro de 2001
Entregue pela governadora Roseana Sarney o projeto de revitalização do Parque Ecológico da Lagoa da Jansen
Decreto nº 28.690 – De 14 de novembro de 2012
Fica o Parque Ecológico da Lagoa da Jansen, localizado no Município de São Luís, instituído pelo Decreto Estadual no 4.878, de 23 de junho de 1988, reclassificado como Unidade de Conservação de Uso Sustentável do tipo Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa da Jansen
Portaria nº51 – De 26 de março de 2013
Estabelece normas e procedimentos para o Licenciamento de Atividades e Eventos Temporários e Permanentes localizados na Área de Proteção Ambiental - APA da Lagoa da Jansen
Saiba Mais
- O passado, o presente e o desejado futuro da Lagoa da Jansen
- Quase 2 décadas da revitalização da Lagoa da Jansen e seus impactos
- Área da Lagoa da Jansen está esquecida pelo poder público
- 1000 pontos de lançamentos de esgoto identificados na Lagoa da Jansen
- Quiosques da Lagoa da Jansen estão abandonados
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