Cinco décadas de história

"Ponte da Esperança": o desenvolvimento do outro lado do Rio Anil

Conhecida popularmente como Ponte do São Francisco, peça da engenharia de 1970 completa, neste mês, cinco décadas de história

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h21

[e-s001]Foi a partir de uma visão do local onde despachava, ocupando o cargo de governador maranhense (entre 1966 e 1970), que José Sarney teve uma antevisão, ao olhar através da janela para um dos braços do Rio Anil, em direção ao antigo São Francisco. A iniciativa do gestor, que se tornaria presidente da República décadas mais tarde, serviu para alavancar o desenvolvimento de uma das áreas que se tornaria uma das mais valorizadas da cidade e possibilitou a construção da “Ponte da Esperança”, como fora definida por jornais e moradores da época.

A Ponte José Sarney – ou Ponte do São Francisco (em clara referência ao bairro fronteiriço à estrutura) – foi uma das obras mais marcantes do período desenvolvimentista (denominado de “Maranhão Novo”) vivido no final da década de 1960 e no início de 1970. No próximo dia 14, a peça da engenharia de 820 metros que interliga o Centro Histórico e adjacências aos bairros do São Francisco, Renascença, Ilhinha e boa parte da orla da cidade, completa 50 anos de história e O Estado ajudará a contar alguns capítulos de uma “ousada” jornada comandada por um grupo de engenheiros e outros visionários, que viram na construção da ponte a oportunidade de incluir o Maranhão no rol dos estados em franca ascensão no país.

Antes de entender o nascedouro da construção da ponte famosa na Ilha, é necessário voltar dois anos no tempo. Em 1968, a cidade viu ser entregue a Ponte do Caratatiua. Esta obra foi precursora na estratégia sarneyista de realizar diversas obras e possibilitar o erguimento de símbolos, configurando a ideologia do progresso e fomentando a transformação do que era abstrato (projetos) para algo concreto (obras em si).

O erguimento da estrutura fez parte de um macroprojeto que estava em andamento desde a década de 1950 e foi consolidado por Sarney. A partir do Plano de Expansão da Cidade de São Luís, um projeto ambicioso e elaborado por Rui Mesquita, responsável pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER) – órgão rodoviário dos estados e Distrito Federal – foi possível a construção, em 1968, da Ponte do Caratatiua que, nos planos do poder público, serviria como elo entre o núcleo central da cidade e as praias do Olho d’Água e adjacências.

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A Ponte do Caratatiua, iniciada durante a gestão do então governador do Maranhão, Newton Bello (1961-1966), foi entregue já no período de Sarney à frente do Estado. Era o símbolo de uma vontade da administração estadual, em parceria com a municipal, de evitar o estrangulamento das áreas centrais da cidade e contribuir com o papel expansionista urbano ludovicense.

A O Estado, o ex-governador e presidente da República, José Sarney, enfatizou a necessidade de criação de outras vias para se somar à Ponte do Caratatiua. “Havia, nesta época, um crescimento da cidade direcionado das partes mais altas às baixas, devido ao seu aspecto topográfico e peculiar. Era fundamental pensar no crescimento da cidade para outras áreas, além do São Francisco. Por isso, a Ponte [do São Francisco] foi importante e permanece como um grande legado”, explicou.

A partir deste panorama, duas eram as saídas da cidade: ou pensar no crescimento vertical, com o estímulo e fomento de políticas de prédios ou estimular a construção de novos acessos que superassem às barreiras físicas da cidade, cujo desenho era específico, por São Luís se tratar de uma ilha.

A ideia
Foi a partir da iniciativa do então governador José Sarney, respaldado tecnicamente por Rui Mesquita, que outros nomes foram convocados para a missão, como José Reinaldo Tavares e Vicente Fialho, este último membro do DER e que se tornaria, antes da inauguração da Ponte do São Francisco, prefeito da capital maranhense.

Após a elaboração do projeto, cuja construção seguiu a posição sugerida por Rui Mesquita (ou seja, com a ponte situada perpendicularmente à Avenida Beira-Mar), foi formalizada a contratação da empresa Itapoá, de Eduardo Torres.
A partir das pesquisas do presidente da Academia Maranhense de Letras (AML), Benedito Buzar – que também acompanhou o nascedouro e desenvolvimento da obra da Ponte José Sarney – foi possível localizar um depoimento registrado por Eduardo Torres sobre o cenário encontrado do “outro lado da ponte” antes de sua construção. “Quando eu passei de canoa para olhar do lado de cá, para saber onde é que eu faria o canteiro de obra, e tal, encontrei galinhas e porcos no meio da rua. Não tinha nada”, afirmou Eduardo Torres pouco antes da ordem de serviço.

[e-s001]De fato, o relato era próximo da precisão. Apenas alguns poucos pescadores com suas casas de taipa ocupavam a “grande área de mato” hoje conhecida como São Francisco. Por isso, além da pesca, os moradores também viviam do transporte por canoas, pelo braço do Rio Anil. Era uma forma de conseguir uma renda a mais, cujo valor era usado pelos próprios pescadores para adquirir produtos oriundos do Centro Histórico, como alimentos em geral.

Para incentivar o crescimento para a parte ainda desabitada da cidade, pensou-se na construção de uma ponte para estimular o acesso de veículos e, desta forma, o desenvolvimento na região. “Era uma obra engenhosa, com prazo curto e extremamente ousada para a época”, disse à época Vicente Fialho, ex-membro do DER e um dos nomes mais importantes para a execução da obra.

Segundo o ex-gestor, os serviços – iniciados em 1968 e financiados com recursos próprios do Estado - contaram com homens trabalhando incessantemente em regime de plantão. “Não foi possível contar com recursos do Fundo Rodoviário Nacional, entidade à época que estimulava obras do gênero no país”, afirmou Fialho.

Detalhes técnicos
Além dos valores e reunião de corpo técnico, era imprescindível planejar a fundação e solidificação de uma estrutura que receberia, diariamente, milhares de veículos de pequeno, médio e grande portes. Para isso, os engenheiros responsáveis elaboraram a execução de tubulões – tipos de fundações profundas de concreto – que se somariam às colunas de sustentação para, sob solo considerado mole, possibilitar que a pista suportasse o fluxo e peso dos veículos e fiação da iluminação pública.

Segundo Vicente Fialho, somente o suporte físico da ponte demorou quase metade do tempo de execução dos serviços. “Se fizemos tudo em pouco mais de dois anos, quase um ano foi usado somente para estas fundações, elementos imprescindíveis nos serviços”, afirmou.

De acordo com o ex-membro do DER, para suportar o alto peso, as fundações eram pressurizadas, o que, na engenharia, representa um procedimento padrão de fixação de estruturas submersas. Operários atuaram para fincar as fundações debaixo do solo em uma profundidade aproximada de 20 metros abaixo do nível do solo. “Era um trabalho intenso em prol do desenvolvimento e cumprimento de prazos”, disse Vicente Fialho.

Em paralelo, eram feitas do outro lado da margem do Rio Anil (onde é atualmente o São Francisco) as vigas que sustentariam a pista a ser feita. Além de integrantes do DER, técnicos de outros estados deram auxílio para as obras. “Apesar da ajuda externa, é possível afirmar que a estrutura foi feita basicamente a partir da mente de jovens políticos e demais auxiliares que, de forma corajosa, viabilizaram uma das estruturas mais conhecidas da cidade”, expressou Vicente.

Acompanhamento da obra
Durante a execução da obra, o então governador José Sarney fazia questão de atravessar, em embarcações, até o outro lado do Rio Anil para acompanhar os trabalhos. Segundo relatos, o objetivo era claramente verificar a aplicação dos investimentos e, ao mesmo tempo, incentivar a mão-de-obra. Na maioria das vezes, Sarney acompanhava os trabalhos durante a noite.


Dados técnicos

820 metros
3 pistas
2 anos, aproximadamente, o tempo de construção

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