Vida Ciência

Panela de pressão: física e perigos

Neste artigo, uma descrição da Física e dos perigos que podem ocorrer com uma máquina térmica, e tomaremos como exemplo a panela de pressão; artigo tem participação do físico Carlos Cesar Costa do LCN - Bio, do Campus da UFMA de Pinheiro

Antonio José Silva Oliveira / físico, doutor em Física Atômica e Molecular, pós-doutor em Jornalismo Científico. Professor da UFMA

Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

[e-s001]A ideia de escrever este artigo surgiu depois da história quase trágica contada pela Dona Maria - uma senhora moradora do povoado de Barreira Velha, no município de Barreirinhas (MA). A história é a seguinte: num certo dia - como de costume - a Dona Maria resolveu preparar para o almoço uma galinha caipira em seu fogão à lenha, utilizando a sua panela de pressão.
Acontece que a panela era antiga e já vinha apresentando problema de funcionamento na válvula de escape de vapor. Com isso, a Dona Maria teve um insight nada recomendável: o de colocar um tijolo sobre a tampa da panela de pressão enquanto cozia sua refeição. O resultado só não foi trágico, porque seu fogão a lenha se encontrava ao ar livre e, por sorte, na hora da explosão não havia ninguém por perto. O problema maior foi o fato de Dona Maria ficar sem seu almoço, haja vista que, por conta da explosão, pedaços da galinha foram parar até nas copas das árvores.

Acidentes domésticos como esse são mais comuns do que se imaginam. Basta uma pesquisada rápida na internet ou uma conversa com nossos vizinhos para constatarmos os inúmeros relatos de explosões que acontecem com a panela de pressão. Neste trabalho, abordaremos a física que está por trás do funcionamento da panela de pressão, bem como os cuidados que devemos ter com tal utensílio doméstico.

A panela de pressão é útil porque resolve o problema com o tempo de cozimento dos alimentos e também com o gasto de gás de cozinha ou qualquer outra fonte de calor (lenha ou carvão, ou indução, por exemplo). Justamente porque, na panela de pressão, o ponto de ebulição da água é mais elevado do que normalmente é, o que torna mais rápido o cozimento de qualquer alimento. Isso ocorre porque a pressão é mais alta em seu interior do que no de uma panela comum, onde a água entra em ebulição a 100 0C, quando a pressão atmosférica é de 1 atm ao nível do mar.

O princípio físico que rege o funcionamento de uma panela de pressão, em linhas gerais, é o mesmo das máquinas térmicas. É muito comum associarmos esse termo às máquinas a vapor. De fato, os barcos a vapor, certas locomotivas do passado, geladeiras, ar-condicionados e as panelas de pressão são exemplos de máquinas térmicas. São máquinas que funcionam com transformações ou transferências de calor, que é uma forma de energia. Você sabia que os veículos automotores também são máquinas térmicas? Principalmente, os motores de explosão (combustão interna), que utilizam a queima de gasolina, álcool ou diesel, são exemplos de máquinas térmicas desenvolvidas ao longo do século XX.
Na Física, temos a termodinâmica, que é constituída de um conjunto de princípios que regem a absorção e as transformações da energia. O prestígio da Física provém, em grande parte, de que, por meio das observações acumuladas, foi possível explicar, em poucos princípios gerais, todo o universo de fenômenos observados. Em particular, duas leis da termodinâmica regem, sem exceção conhecida, todos os fenômenos que envolvem transformações ou transferências de energia.

Como observa James Gleick em seu livro “Caos”, sobre a Segunda Lei da Termodinâmica:
[...] é uma espécie de má notícia técnica dada pela ciência, e que se firmou muito bem na cultura não científica. Tudo tende para a desordem. Qualquer processo que converte energia de uma forma para outra tem de perder um pouco dessa energia como calor. A eficiência perfeita é impossível. O universo é uma rua de mão única. A entropia tem de aumentar sempre no universo e em qualquer sistema hipotético isolado dentro dele. A Segunda Lei é uma regra que parece não ter exceção[CITATION Gle89 \p "295 - 296" \l 1046 ].

[e-s001] Nos processos espontâneos, o calor sempre passa do corpo mais quente para o mais frio. No caso ilustrado, considerando fonte de calor como corpo 1 e a panela de pressão como corpo 2, vamos constatar que o calor do corpo 1 sempre será transferido para o corpo 2. Nesses processos, com o sistema isolado, a quantidade de calor perdida pelo corpo mais quente é igual à quantidade de calor recebida pelo mais frio (Primeira Lei da termodinâmica), mas há uma grandeza que não é igual para os dois corpos. Veremos a seguir que essa grandeza é chamada de entropia.

Baseando-se nos conceitos de aumento da desordem e degradação da energia, o físico e matemático alemão Rudolf Clausius (1822 – 1888), no início da segunda metade do século XIX, desenvolveu uma relação matemática que expressa quantitativamente o aumento da desordem e a degradação de energia, alterações referidas como variação da entropia. A entropia (S), característica intrínseca de todo sistema, aumenta à medida que a desordem dos fenômenos aumenta. Já que, em todos os fenômenos naturais, tende-se a alcançar um estado de menor grau de ordenação, dizemos que há uma tendência ao aumento na entropia do Universo.

A variação de entropia depende dos estados inicial e final do sistema. Dessa maneira, podemos calcular a variação de entropia nos processos irreversíveis considerando-os compostos por uma sequência de processos reversíveis. Dizemos que a entropia do sistema aumenta (S  0) se o sistema absorve calor, e diminui (S  0) se o sistema cede calor.

Como já assinalamos anteriormente, nos processos que ocorrem espontaneamente, o calor sempre irá do corpo de maior temperatura para o de menor temperatura, e, desde que o sistema esteja isolado, a quantidade de calor perdida pelo corpo mais quente (maior temperatura) é igual à quantidade de calor recebida pelo mais frio, e isso é o que caracteriza a Primeira Lei da Termodinâmica. Porém há uma grandeza que não é igual para os dois corpos. Portanto o quociente da expressão deve estar ligado a alguma coisa que sempre aumenta naqueles processos. Ora, o que sempre aumenta, nesses casos, é a desordem. Ou seja, é uma medida da variação da desordem num corpo ou num sistema. Os físicos deram a esse quociente o nome de variação da entropia. Esse conceito nos leva a mais uma formulação da Segunda Lei da Termodinâmica: Num sistema isolado, a entropia nunca decresce.

Portanto, quando a pressão aumenta, as moléculas de vapor se tornarão mais rápidas (energéticas) e exercerão bastante pressão para evitar o colapso das bolhas no interior da panela. Essa pressão adicional pode ser conseguida ou indo mais abaixo da superfície do líquido, ou aumentando a pressão do ar acima da superfície líquida. E é assim que funcionam as panelas de pressão, pois possuem válvulas bem-vedadas que não permitem que escape o vapor até ele alcançar certo valor de pressão interna, geralmente maior do que a pressão atmosférica, que é 1 atm.

Quando a pressão de vapor aumenta no interior da panela de pressão fechada, a pressão exercida sobre a superfície líquida também aumenta, o que impede que o líquido entre em ebulição. Nesse caso, o responsável pela pressão de vapor é justamente o movimento das moléculas de vapor em uma bolha de vapor que gera uma pressão do gás (pressão de vapor) que se contrapõe às pressões sobre a bolha, geradas pelo vapor de água pressurizado e pela própria água dentro da panela.

Desse modo, as bolhas que normalmente se formariam são “comprimidas”. Continuando o aquecimento, a temperatura da água vai para além dos 100 °C. A ebulição não acontece até que a pressão de vapor dentro das bolhas em formação supere a pressão aumentada que atua sobre a água. O ponto de ebulição é, portanto, elevado. Mas, se a pressão for menor (como em lugares de altitudes elevadas), o ponto de ebulição da água diminui, e a água vai ferver em temperaturas abaixo dos 100 °C.

Assim, uma panela de pressão alcança temperaturas mais elevadas de ebulição porque impede a ebulição ordinária, o que de fato impede o seu resfriamento. Então, a ebulição é um processo de resfriamento!

A explosão de uma panela de pressão é extremamente violenta, podendo levar a graves ferimentos e até à morte. Por isso não se descuide! Sempre retire a válvula de escape de vapor com pino e lave-a com água corrente, enfiando um arame ou palito de dente bem fino por seus orifícios para retirar todo o excesso de alimento acumulado. Abaixo, listamos quatro dicas úteis a serem observadas ao se utilizar a panela de pressão.

I - Cuidado com as válvulas de segurança. Ao usar a panela de pressão, sempre observe o funcionamento da válvula de escape de vapor com pino, aquela que fica sobre a tampa da panela. O mau funcionamento dessa válvula é o principal motivo que ocasiona a explosão da panela de pressão. Por isso verifique se a válvula está soltando fumaça (vapor) e fazendo barulho. Caso contrário, faça a substituição desta com um profissional qualificado e que observe as instruções do fabricante. Jamais utilize parafusos ou qualquer outro artifício nos lugares das válvulas de segurança das panelas.

[e-s001]II - Nunca esqueça a panela no fogo. O esquecimento é um dos principais motivos que leva à explosão da panela. Fique atento para o tempo certo de cozimento dos alimentos e não ultrapasse esse tempo limite. Decorrido um certo tempo no fogo, a panela emite um alerta: a válvula de pressão começa a produzir um chiado, para sinalizar o cozimento do alimento.

III - Espere a panela esfriar para abri-la. Algumas pessoas têm o hábito de colocá-las debaixo da água que sai da torneira para acelerar o resfriamento. Porém tenha muito cuidado para não deixar a válvula de escape de vapor com pino exposta à água corrente. Essa observação evita riscos de queimaduras.

IV - Nunca encha demasiadamente a panela. Nunca ultrapasse o limite de 2/3 da capacidade volumétrica da panela. O excesso no volume pode provocar o entupimento das válvulas e ocasionar a explosão da panela, sem produzir o chiado característico do cozimento. Siga sempre as recomendações dos fabricantes.

Na cozinha ou na Física, entre outras coisas, as leis da termodinâmica nos ajudam a compreender a razão pela qual - para nos mantermos vivos - necessitamos ingerir todos os dias alimentos que tornem possível, pela energia deles advinda, conservar a temperatura de nosso corpo em aproximados 37 0C, trabalhar, irradiar calor, pensar, sonhar, etc.

Por fim, podemos dizer que a Dona Maria viu, na prática, as consequências do aumento da entropia ao preparar sua galinha caipira ou simplesmente abordar tal questão de outra perspectiva: de que uma boa Culinária e a Química estão entrelaçadas.

Assim sendo, citaremos um fato ocorrido durante a Revolução Francesa, no século XVIII. Antes de ser condenado ao patíbulo por traição, o químico francês Antoine Laurent Lavoisier (1743 – 1794), também considerado o “pai da Química Moderna”, exortou o aspecto mais fundamental da Natureza, que é a sua transformação, por meio de sua célebre frase: “Na Natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.

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