Artigo

Nepotismo principesco e Janja

Atualizada em 11/10/2022 às 12h22

Eu pensava que a influência de parentes e pessoas próximas de presidentes da República nos negócios da República, iria se encerrar após o mandato, ou os mandatos, de Jair Bolsonaro. Como se verá mais adiante, há motivos para duvidar-se disso. Por enquanto, a paciência do eleitor brasileiro com os filhos dele - pitorescamente chamados de 01, 02 e 03 - acabou, assim me parece, faz meses. Ninguém os elegeu para exercer os poderes presidenciais, mas é isso que eles fazem 24 horas por dia, 365 dias por ano, autorizados e, até, incentivados pelo pai, gerando mais dificuldades do que facilidades ao exercício da presidência, em momento de imensas dificuldades em todas as esferas da vida nacional, da econômica à moral.

Sim, eu tenho conhecimento do nepotismo como um comportamento instintivo dos seres vivos, não apenas dos humanos, de proteger e beneficiar seus descendentes diretos, pois assim conseguem passar às gerações seguintes sua própria herança genética, preservando a espécie. Eu até já escrevi aqui sobre o assunto, em crônica de 4/5/2005, com o título “Nepotismo”. Formalmente, do ângulo sócio econômico do assunto “Nepotismo é a prática pela qual uma autoridade pública nomeia um ou mais parentes próximos para o serviço público ou lhes confere outros favores, a fim de promover o prestígio da família, [...] ou ajudar a montar uma máquina política, em lugar de cuidar da promoção do bem-estar público”, como diz o Dicionário de Ciências Sociais, da FGV. É exatamente isso que Bolsonaro faz.

Por ter a prática natureza como essa, devemos aceitar o nepotismo como parte de características de uma sociedade civilizada? Não, claro. Civilizar-se é exatamente controlar os instintos. Se aceitássemos estes mansamente, deveríamos também aceitar o uso da força do mais forte contra o mais fraco nas comunidades humanas, ou o roubo puro e simples dos mais espertos nessa atividade nefasta, somente porque essas duas condutas são também instintivas? Não, de novo. Portanto, 01, 02 e 03, comportai-vos e comunicai ao papi que vós renunciais às três coroas de príncipes.

Mas o futuro também preocupa, pelo potencial nepótico de Janja. Quem e Janja? Ela, de 40 anos, é noiva de Lula e assumiu novas atividades, em adição e quase exclusivamente às outras, corriqueiras, de socióloga. Autorizada informalmente por um apaixonado Lula (vejam a força do amor!), que se inspirou em Bolsonaro, ela é agora a própria voz do homem mais honesto do Brasil, com o “nihil obstat” da família dele. Segundo a imprensa do Sul, ela agora dá ordens a dirigentes do PT e orientações a Haddad e Gleisi (quem diria!). Também formou um grupo subsacerdotes conhecido nos corredores do partido como panelinha. Na fila, quando das visitas a Lula na prisão (desculpem a menção a este constrangimento), ela tem passe livre e não precisa se acotovelar com os soldados do PT, passando direto até a cela.

Dirão alguns. Janja não é geneticamente parente de Lula; portanto, não haveria nepotismo no sonhado futuro. Enganam-se. Ela é potencial portadora de um rebento de Lula, que diz não ter encerrado sua carreira reprodutiva. Portanto, ele, na infeliz hipótese de retornar à presidência da República, terá todo o interesse em beneficiar Janja, satisfazendo ao mesmo tempo seu instinto de nepotismo. Seria um quase-nepotismo. No entanto, ninguém poderá acusá-lo de querer adotar tal prática na chefia do Executivo. Bolsonaro já o fez antes.

Lino Raposo Moreira

PhD, economista, membro da Academia Maranhense de Letras

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