Comércio

Consumidor ainda desconfia de descontos da Black Friday

Evento de descontos no varejo brasileiro será em 30 de novembro; governo investiga se as lojas aumentaram os preços no período que antecedia a Black Friday do ano passado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h28
A Black Friday deste ano deverá acontecer em meio a um cenário de lentidão na retomada da economia
A Black Friday deste ano deverá acontecer em meio a um cenário de lentidão na retomada da economia (Comércio/Divulgação)

BRASÍLIA - A 8ª edição da Black Friday, data oficial de “superdescontos” oferecidos por varejistas para fiscar os consumidores, será no dia 30 de novembro. Apesar de a Black Friday ter se tornado a segunda maior data do varejo brasileiro, a adesão dos consumidores brasileiros ao evento esbarra na desconfiança em relação aos descontos.

Segundo pesquisa do Google com 1.500 consumidores de 18 a 54 anos, das classes A, B e C, de todas as regiões do país, em julho deste ano, para 37% dos entrevistados, a confiança nas promoções ainda é o principal motivo para não participar da Black Friday.

Muitos consumidores nunca compraram na Black Friday e não pretendem participar da data de descontos deste ano. O motivo apontado é a desconfiança com as reduções de preço.

O Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, está investigando se as lojas aumentaram os preços no período que antecedia a Black Friday do ano passado.

A abertura da investigação foi motivada por uma reportagem da "Folha de S.Paulo". Durante um período de 15 dias, o jornal acompanhou os preços de 6.875 itens à venda nas principais redes de varejo do país e verificou aumento nos valores antes da Black Friday. Essa alta dos preços pode indicar que boa parte dos descontos anunciados nos sites dessas lojas não representa, de fato, redução.

Segundo o ministério, o DPDC teve acesso aos preços de diversos produtos, antes e durante as promoções da Black Friday, e está individualizando e apurando a conduta das empresas envolvidas. Se a investigação chegar à conclusão de que há indícios de irregularidade, o procedimento se transforma em processo administrativo sancionatório e as redes de lojas podem ser multadas em até R$ 9,5 milhões.

A Black Friday vai acontecer em meio a um cenário de lentidão na retomada da economia. No ano passado, segundo a Ebit, empresa de dados sobre o varejo eletrônico brasileiro, a Black Friday gerou faturamento de R$ 2,1 bilhões para o e-commerce, alta de 10,3% em relação a 2016. Para este ano, os organizadores ainda não divulgaram a expectativa de vendas.

Propaganda enganosa

Balanço do Reclame Aqui, site que reúne queixas de consumidores, endossa os motivos de os consumidores ainda terem pé atrás com a Black Friday. A propaganda enganosa foi o principal motivo das reclamações nas últimas três edições do evento, segundo a empresa.

Esse problema recorrente inclui a maquiagem de preços, que levou os consumidores a apelidarem o evento de “Black Fraude” nas edições anteriores. A prática da maquiagem, também conhecida como "metade do dobro", consiste em aumentar os preços antes da data do evento para depois baixá-los e nomeá-los como “superdescontos”. A propaganda enganosa também inclui a diferença dos preços anunciados no momento da compra e na hora do pagamento do pedido.

‘Sobem para depois baixar’

A psicoterapeuta Angélica Bersch Boff, de 44 anos, diz que quando coincidiu de precisar de algum produto perto da Black Friday, a diferença de preço realmente não existia. “Os lojistas sobem o valor dos produtos para depois baixarem. Sobretudo quando se trata de produtos de maior valor, como eletrodomésticos”, afirma.

Ela diz que não espera pela data de promoções para comprar. “No ano passado procurei uma geladeira duplex, queria realmente fazer o investimento. Ia tirar dinheiro da poupança e pagar à vista. Mas a diferença de preço era de R$ 100. Aí acabei não comprando”, conta.

A professora de educação física, de 45 anos, conta que cerca de três anos atrás viu uma máquina de lavar com anúncio de desconto na Black Friday, mas na verdade era o mesmo preço que ela havia pagado antes da data da promoção.

“Eles querem que você ache que está pagando com desconto. Mas na realidade o preço anunciado é o mesmo de antes”, diz. Samira diz que irá ignorar as promoções da Black Friday deste ano.

‘Nunca valeu a pena’

A aposentada Fatima Laterça diz que também não acredita na Black Friday. “É tudo enganação, não tem desconto, nunca comprei”, diz. Ela até olha os preços pela internet durante a Black Friday, mas, “nunca valeu a pena”.

“Costumo pesquisar maquiagem e perfumes. Se não estiver precisando do produto com urgência espero um pouco para ver se na Black Friday vai estar mais barato, mas aí vejo que nunca compensa”, afirma.

Para esta Black Friday, ela até pensa em dar uma espiada nas ofertas, mas não tem intenção de comprar nada. “Posso até olhar, já comprar acredito que não”.

‘Jogada de marketing’

Para a professora Isabela Martins, de 22 anos, a data de promoções é “apenas uma jogada de marketing”. “Os preços caem na semana anterior ou apenas trocam a etiqueta por uma vermelha com o mesmo preço”, opina.

A professora já olhou preços em edições anteriores da Black Friday, mas achou que não valia a pena porque ou os descontos eram muito baixos, em torno de R$ 10, ou porque eram inexistentes.

Ela não pretende comprar nesta Black Friday. “Não vejo também sentido em consumir sem precisar, só por achar que está barato”, afirma.

Isabela diz que costuma evitar comprar também perto de datas comemorativas como Natal porque acha que antes os preços estão mais baixos.

É possível se dar bem

De acordo com Edu Neves, CEO Brasil do Reclame Aqui, os consumidores que se dão bem na Black Friday são aqueles que acompanham os preços antes da data de promoções e compram aquilo que eles já estavam desejando. “Se está precisando de algo e está com 20% de desconto, é um bom negócio.” Neves afirma que o desconto médio tem sido de 25%, mas é possível achar barganhas de 40% até 70%.

Para Neves, mesmo com o desaquecimento da economia, a retração do consumo, e desemprego, inadimplência e juros em alta, as empresas têm necessidade de vender os estoques. Ele acredita que a crise leva ao alinhamento da indústria com o varejo, o que ajuda a trazer mais descontos na Black Friday.

“Fabricante e varejista se unem, o que acaba beneficiando o consumidor, pois a negociação leva a preços melhores. Quando o mercado está muito aquecido, o varejista ganha muito poder”, explica.

Segundo ele, esse alinhamento já tem ocorrido, por exemplo, entre a indústria automobilística e as concessionárias. E pode ser que isso aconteça com as fabricantes e varejistas no caso de celulares e TVs. “O alinhamento gera vantagem agressiva”, diz.

De acordo com o CEO do Reclame Aqui, uma prática que o varejista brasileiro faz é colocar em promoção os modelos de produtos mais antigos e deixar o modelo novo com o mesmo preço sugerido pelo fabricante. Aí o varejo aproveita para vender o que está encalhado no estoque impulsionado pelo lançamento de um modelo mais avançado. Isso acontece muito com smartphones e TVs, segundo ele.

“Saiu o iPhone 10, o preço em todos os sites é igual ao do fabricante, mas o iPhone 8 está mais barato. O varejista vende mais o que está encalhado”, explica.

Para Neves, se o consumidor deixasse de comprar o produto mais antigo, os lojistas poderiam passar a colocar o modelo novo em promoção.

O CEO afirma que vale a pena adiantar os presentes de Natal na Black Friday, desde que fique atento ao prazo de entrega. “Em 2015 venderam muito e não conseguiram entregar aquele volume gigantesco. Já no ano passado os grandes varejistas escalonaram a entrega, organizando de acordo com a região”, diz.

Neves pondera que os pequenos e médios varejistas, que contam mais com os Correios para fazer a entrega, podem estar mais vulneráveis a atrasos pela dependência do desempenho da estatal.

Têm ganhado espaço também na Black Friday boas promoções em gêneros de primeira necessidade, como produtos perecíveis. Segundo Neves, como o giro é alto, o setor de supermercados tem mais manobra para dar descontos.

O executivo explica que o Brasil tem um grande problema, que é a questão tributária. A cadeia do produtor até o destino final embute impostos não visíveis ao consumidor, o que acaba por subir o preço do produto. “Não adianta sonhar em ter o mesmo desconto dos Estados Unidos porque lá o sistema tributário é diferente e flexível”, diz.

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