Desmoronamento

"Tá muito humilhante porque a gente dorme no chão", revela mãe que perdeu emprego e apartamento no Residencial Piancó

Famílias aguardam auxílio do governo que pode garantir o aluguel de um espaço digno para viverem.

Neto Cordeiro/Imirante.com

Atualizada em 31/03/2022 às 12h13

SÃO LUÍS – Era noite quando Edinaldo dos Santos, de 36 anos, a esposa Viniele dos Santos, de 30, e os dois filhos do casal, de cinco e de dois anos, estavam na sala do apartamento em que moravam, no bloco 1 do Residencial Piancó IX, quando ouviram um estrondo. Foi o início de um pesadelo, que há um ano quando ocuparam o prédio, nem imaginavam que poderiam viver algo assim.

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“A gente foi averiguar, olhar daqui da janela e viu que tinha caído parte do muro. Aí a gente desceu. Tiramos nada de casa, saímos só com a roupa do corpo”, conta Edinaldo ao Imirante.com. Eles estão dormindo e se alimentando na casa da sogra dele, na Vila Embratel, mas o eletricista revela que é preciso vigiar os móveis no apartamento interditado pela Defesa Civil e Corpo de Bombeiros, já que há registros de roubos nos blocos atingidos pelo desmoronamento do muro. Ele conversou com a reportagem do Imirante nesta segunda-feira (31), direto no próprio condomínio.

Apartamentos atingidos por desmoronamento de muro. Foto: Neto Cordeiro/Imirante.com
Apartamentos atingidos por desmoronamento de muro. Foto: Neto Cordeiro/Imirante.com
Morador precisa vigiar móveis por conta de roubos.
Morador precisa vigiar móveis por conta de roubos.

O desabamento do muro de contenção na rua ao lado do Residencial Piancó IX, durante a chuva na noite da última quarta-feira (26), atingiu blocos do condomínio. Foi grande a destruição, mas todos os moradores conseguiram se salvar. O local está isolado, e a presença de maquinário no local demonstra o início dos serviços no condomínio.

Sem previsão de quando terão suas moradias reconstruídas ou liberadas para habitação, dezenas de famílias tentam seguir garantindo o básico para sobreviver. Um abrigo foi improvisado na Unidade de Educação Básica (U.E.B.) Piancó, que fica próxima ao residencial. Cerca de 15 famílias estão instaladas por lá, em três salas de aula. O cenário é de penúria. Colchões colocados no chão, sacolas de roupas em carro de mão, e outros utensílios domésticos em meio à mesa do professor e cadeiras de alunos que ali desenvolviam suas atividades escolares.

Uma das famílias que estão nessas condições é a de Kelly Santos, de 23 anos. Com o marido Gustavo, também de 23, e os três filhos, de um ano, de seis e de oitos, a mãe de família perdeu o emprego de auxiliar de Cozinha no meio de todo o caos neste começo do ano. “Perdi meu emprego porque eu não pude sair pra trabalhar com minha cabeça aqui, pensando nos meus filhos, na minha moradia, porque já começaram até a arrombar os apartamentos”, lamenta.

Famílias dormem em colchões no chão das salas de aula.
Famílias dormem em colchões no chão das salas de aula.
Kelly ao lado dos filhos no abrigo em que estão vivendo.
Kelly ao lado dos filhos no abrigo em que estão vivendo.

Kelly aguarda o pagamento de um benefício prometido pelo governo estadual. Por enquanto, é a renda do marido, que é barbeiro, que vai dar o sustento básico a eles. “Tá muito humilhante porque a gente dorme no chão, não tem privacidade. Tem um colchão para uma família”, relata. O auxílio precisa chegar com urgência, e a primeira coisa que as duas famílias pretendem fazer é alugar um lar para elas.

Desde que se mudou para o abrigo, Kelly tem ajudado na cozinha com a preparação das refeições para as famílias. “A alimentação aqui tem um horário. Por exemplo, se eu sair ‘pra’ resolver alguma coisa não chegar no horário certo, eu já fico sem almoçar porque é muita gente”, afirma.

“A única coisa que trouxe pra cá foi um colchão... Porque o corpo de bombeiros acompanhou, então eu só tirei um colchão, minha televisão e mais umas coisas. Minhas contas estão penduradas, e nós ‘tamo’ aqui vivendo de doação. Não sei mais nem o que fazer. Por mim, eu voltava ‘pro’ meu apartamento, mas eu não posso. Eles não dão uma decisão certa ‘pra’ gente. A Secid veio aqui só uma vez, deu cesta básica, tão querendo ‘pra’ gente se acomodar na escola. A gente também tem que ter nossa moradia”, pontua Kelly.

Ainda no dia seguinte ao desabamento, a Defesa Civil Municipal realizou o cadastramento das famílias moradoras dos imóveis afetados e, em parceria com a Secretaria Municipal de Segurança Alimentar (Semsa), entregou 150 cestas verdes do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Os reparos dos blocos de apartamentos afetados serão realizados pela Secretaria de Estado das Cidades (Secid), por ser uma habitação de interesse social do governo do Estado.

Um laudo técnico que está sendo elaborado pela Defesa Civil deverá determinar as medidas a serem adotadas no Residencial Piancó, que permanece isolado e com a presença permanente dos bombeiros.

Muro desabou na noite de quarta-feira (26).
Muro desabou na noite de quarta-feira (26).

O Residencial Piancó Paraíso faz parte do programa Minha Casa, Minha Vida. São 304 unidades habitacionais, que tem como ente financeiro o Banco do Brasil. O condomínio foi construído em um terreno pertencente ao governo Estado, responsável pelo edital de chamamento que definiu a empresa que construiria o empreendimento e todos os trâmites do projeto.

Doações

As famílias estão precisando de doações de alimentos e roupas, principalmente para crianças. Também há necessidade de fraldas e produtos de higiene. As doações podem ser entregues diretamente na Unidade de Educação Básica (U.E.B.) Piancó, onde estão abrigadas as famílias, na área Itaqui-Bacanga.

O que dizem as autoridades

Procurada pelo Imirante.com, o governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado das Cidades e Desenvolvimento Urbano (Secid), em nota, informou que desde a última quinta-feira (27), realiza intervenções iniciais na estrutura do local, como a impermeabilização e escoramento da área atingida. Uma equipe de engenheiros avaliou os danos estruturais e decidiu pela recuperação da edificação.

Ainda segundo a Secid, os trabalhos estão em curso, desde a sexta-feira (28), com mais de 70 profissionais atuando junto ao escritório permanente da secretaria, que foi montado no residencial. O prazo para a conclusão das obras é de 90 dias (nesse tempo, os moradores serão atendidos pelo Aluguel Social);

A secretaria também informou que as famílias receberam cestas básicas e kits de higiene distribuídos pela Secid.

A Secretaria possui o mapeamento das 281 famílias atingidas e já iniciou o processo para inseri-las no programa Aluguel Social, cuja previsão de pagamento da primeira parcela é a próxima quarta-feira (2);

O órgão ressalta que o Residencial Piancó foi ocupado irregularmente desde 08/02/2021 e passa por medidas jurídicas de reintegração. A Secid faz o acompanhamento do processo junto ao Banco do Brasil, que é a incorporadora do projeto. Após audiência na Vara de Interesses Difusos e Coletivos e pareceres do Corpo de Bombeiros do Maranhão, já havia sido emitido o alerta de desocupação em 17/12/2021 (segue pareceres em anexo), em virtude de problemas na estrutura que apresentavam risco à vida.

Também procurada pelo Imirante.com, a prefeitura de São Luís, por meio da Secretaria Municipal de Segurança com Cidadania (Semusc) informou que a Defesa Civil de São Luís produziu um laudo coletivo sobre a situação no Residencial Piancó, e o documento foi enviado à Secid, para que esta tome as necessárias providências.

A Semusc também informou que todas as questões com relação às famílias, incluindo abrigo e auxílio moradia, estão sob a responsabilidade da Secid.

Emergência

Em casos de alerta e riscos em áreas neste período chuvoso, a população pode entrar em contato pelo atendimento da Defesa Civil Municipal, nos telefones (98) 99107-3550 e 3212- 8473.

Já para a remoção de entulhos, a solicitação é feita pelo número 0800 098 1636.

Veja mais fotos registradas por Neto Cordeiro do Imirante.com:

"Tá muito humilhante porque a gente dorme no chão", revela mãe que perdeu emprego e apartamento no Residencial Piancó

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