SÃO PAULO - Caso as experiências de outros Estados se repitam em solo gaúcho, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) enfrentará um difícil obstáculo quando implantar o sistema de cotas , a partir de 2008.
Em instituições que adotaram a medida, professores e universitários acumulam dezenas de queixas sobre a resistência de grupos contra os cotistas. Os insatisfeitos consideram que a reserva de vagas, em vez de estimular a redução das desigualdades sociais e raciais, tornou-se um privilégio.
"O surgimento de reações assim é uma tendência, porque muitas pessoas consideram que aquela vaga é ocupada por alguém que não tem mérito", argumentou o pró-reitor de Graduação da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Francisco Newton Freitas.
Um semestre depois de adotar as cotas na instituição, Newton observou que a oposição à medida apareceu com maior força em faculdades disputadas como medicina, que não recebia alunos de escola pública desde 1994. Mas as divergências não se resumem às salas de aula mais concorridas. Na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), o universitário Anisio Borba, 23, deparou com hostilidades no curso de ciências sociais.
" O preconceito chega ao ponto de algumas pessoas não falarem com você", relatou o jovem, estudante do 5º semestre e morador do Complexo da Maré, na periferia do Rio. Para enfrentar a resistência, Borba e outros cotistas recorreram ao apoio mútuo: formaram um grupo de estudo para compensar lacunas sentidas por eles na educação básica, com reforço na discussão das lições do ensino superior. A estratégia serviu para solidificar os vínculos de amizade, enfrentar a resistência de opositores e não desistir da universidade.
A evasão é outro desafio das universidades com cotas, na opinião de especialistas. O coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade de Brasília (UnB), Nelson Inocêncio, entende que as instituições precisam criar as condições para que os alunos beneficiados por cotas cheguem ao final do curso, já que possuem um perfil de menor condição financeira e uma educação de pior qualidade. "Não adianta a gente garantir o acesso, se não nos preocuparmos com a permanência deles", ressaltou.
Na Universidade Federal do Piauí, o pró-reitor de Graduação concorda com a ponderação de Inocêncio, mas reclamou das dificuldades financeiras para dotar o estabelecimento com uma estrutura que dê incentivos aos cotistas, como biblioteca atualizada e restaurante universitário adequado.
Mesmo com a falta de recursos, as instituições buscam saídas. A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), por exemplo, paga a cotistas como Rosângela Luz Ramos, 23 anos, uma bolsa mensal de R$ 300. É uma ajuda para que ela consiga bancar as despesas com a faculdade de enfermagem e se manter na capital paulista, a 550 quilômetros de casa. Esse apoio contribui para que Rosângela possa fazer relatos diferentes de colegas de outros Estados. "Aqui, não senti preconceito. Muita gente sequer sabe quem é ou não cotista", contou.
Embora acredite na possibilidade de ocorrerem atos isolados de discriminação contra cotistas na UFRGS, o líder do movimento contra as cotas, o estudante de ciências contábeis, Anderson Gonçalves, espera que estudantes e professores gaúchos tenham uma reação igual àquela que ocorreu na universidade paulista. "A gente pode discordar do sistema de cotas, mas precisa entender que a pessoa não pode ser punida se ela entrou de acordo com a regra do jogo", avaliou.
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