História

O Brasão da França Equinocial

Euges Lima*

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15

Era um sonho da França, colonizar terras no Novo Mundo, a América. Durante muito tempo, os franceses disputaram com Portugal, o Brasil. Francisco I, rei da França, nunca reconheceu os termos do Tratado de Tordesilhas (1494), que dividia a América entre Portugal e Espanha. É famosa a máxima histórica, atribuída a ele, que “gostaria de ver o testamento de Adão que teria excluído a França da partilha do Novo Mundo”.

Nos séculos seguintes, vários súditos do rei da França, tentaram criar colônias no Brasil. A França Equinocial, foi uma dessas experiências no norte do Brasil, no Maranhão, ocorrida nos primeiros decênios do século XVII.

Claude d’Abbeville, padre capuchinho que integrou a missão religiosa vinda com a expedição, oficialmente imperativamente católica e colonizadora de la Ravardière e Razilly em nome do Rei da França, Luís XIII para a Ilha de Upaon-Açu dos Tupinambás, a Ilha do Maranhão. Ao retornar para França, dois anos depois, em 1614, publicou em Paris, a seguinte crônica: “História da Missão dos Padres Capuchinhos e Terras Circunvizinhas na Ilha do Maranhão”.

O padre escritor chamou essas novas terras situadas na América que estavam sendo ocupadas pelos súditos do rei da França de “França Equinocial” ou “Nova França Equinocial”, por estarem localizadas além da Linha Equinocial (Linha do Equador), na região dos trópicos.

Em 2014, o Blog “Brasiliana Heráldica”, editado por Leonardo Piccioni, fez um interessantíssimo achado, cujo teor passou despercebido durante todo esse tempo, diria, durante séculos por historiadores e estudiosos do assunto.

Embora bem conhecida essa obra do Padre capuchinho, tendo diversas reedições, traduções. Anotada, prefaciada, comentada e citada em inúmeros textos, este surpreendente achado, demonstra que esse livro, guarda ainda em seu bojo, vários “enigmas” a serem desvendados sobre a “Nova França Equinocial”.

A descoberta que mencionamos acima é o “Brasão da França Equinocial”, que foi publicado do frontispício da “História da Missão dos Padres Capuchinhos”, sendo feito referência a ele no prefácio dessa obra, conforme verificamos claramente nos fragmentos abaixo do livro.

“Não és tu o Reino dos Lírios, ó França? E não adornam esses lírios o Reino de França? Do mesmo modo essa França Equinocial é, entre os demais, o Reino do Sol, e o sol o embeleza especialmente, pois daí não se retira jamais e aí se deita perpetuamente. Porque, pois, não colocar no frontispício deste livro: Indis sol splendet, splendescunt lilia Gallis [O Sol da Índia brilha, or lírios franceses brilham](ABBEVILLE, 1975, p. 72).

“Esse grande Deus, ó França, honrou-te dando-te por armas de teu Reino três belos lírios em campo azul; portanto não lhe desagradará que se dê a esse reino da nova França Equinocial um sol de ouro fino em campo de azul, a fim de que a unidade da Essência Divina figure misteriosamente no escudo assim com a trindade das três pessoas divinas se representa em tuas armas. E assim como reconheces que o esplendor de teus lírios depende do esplender de Deus, verdadeiro sol de justiça, doravante terás também a alegria de veres o esplendor desse belo sol da França Equinocial brilhar em virtude da beleza de teus lírios. E terás a alegria não só de contemplar o teu rei como o rei do Sol, ele que já é o rei dos lírios, mas ainda como o verdadeiro hieróglifo da Majestade Divina (ABBEVILLE, 1975, p. 72).”

De forma muito perspicaz, Piccioni, percebeu que no frontispício desse livro, havia dois brasões nos cantos superiores, um do lado direito e outro do lado esquerdo. O do lado esquerdo identificou facilmente, “bem óbvio, era o do Reino da França, à esquerda, timbrado com a coroa real da França e cercado pelos colares da Ordem de São Miguel e da Ordem do Espírito Santo”.

No entanto, o outro brasão, do canto oposto, que ele chamou de “misterioso”, não conseguiu identificar a principio. Mas lendo atentamente o prefácio da obra, encontrou o que estava procurando, as referências e descrições dos elementos a respeito do “misterioso” brasão que estava estampado no canto direito, sendo atribuído à França Equinocial, o Reino do Sol da Ilha do Maranhão, em oposição ao Reino da França, o Reino dos Lírios.

Assim, Claude D’Abbeville, misteriosamente ou não, legou para história do Maranhão - além do texto seminal do seu livro - no frontispício de sua principal obra, agora, recentemente revelado, após exatos quatro séculos (1614/2014), a sua ideia do que seria o brasão do sonhado “Reino do Sol”.

Historiador, professor, membro correspondente dos Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB), Instituto Histórico, Geográfico, Genealógico de Sorocaba (IHGGS), Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão (CIJVS/Portugal) e Presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM) / eugeslima@gmail.com

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