Preconceito

Quase 100% dos jovens acham o Brasil um país racista

É o que mostra pesquisa inédita realizada pela Microcamp com 2.624 alunos da rede, cuja maioria aponta a falta de políticas públicas e as discussões nas redes sociais como entrave para o avanço na solução do problema

- Atualizada em 11/10/2022 às 12h17
Discriminação racial é uma realidade no Brasil
Discriminação racial é uma realidade no Brasil (racismo)

São Paulo - Quase a totalidade dos jovens brasileiros (98,8%) acha que existe racismo no Brasil, mas apenas 3,7% admitem ser racista. A maioria (77,1%) também concorda que faltam políticas públicas para enfrentar o preconceito racial com seriedade no país e 51.21% pensam que as redes sociais causam muita discórdia e pouco avanço na solução do problema. É o que aponta pesquisa realizada pela rede de escolas de informática Microcamp, entre seus alunos.

A discrepância entre os que acham o país racista e os que confessam ter preconceito racial justifica-se pela dificuldade das pessoas admitirem que são racistas, segundo Jacqueline Damasio Amando, gestora do Centro de Referência dos Direitos Humanos na Prevenção e Combate ao Racismo e Discriminação Religiosa, serviço ligado à Secretaria Municipal e Assistência de Campinas. Conforme Jacqueline, muitas pessoas acham que racismo é só aquilo que é feito com intencionalidade, e o que não é intencional, não é considerado racismo. "Na maioria das vezes o xingamento, a discriminação declarada e ações de silenciamento, ações leves de discriminações que já fazem parte do racismo estrutural, que já está naturalizado, as pessoas não consideram como racismo", exemplifica.

Ser racista, reforça a gestora, é muito mais que xingar o outro de macaco, é compactuar com o racismo. Para ela, precisamos ser muito mais que não racista, precisamos ser antirracismo, "o que significa ter o entendimento de que todos somos racistas sim nas nossas práticas, e precisamos deixar de ser racistas no cotidiano."

A pesquisa ouviu 2.624 jovens, entre os dias 11 e 16 de janeiro, em 63 municípios do país onde a empresa mantém unidades. 46,8% deles se declaram brancos, 37,6% pardos, 12,7% pretos, 1,8% amarelos e 1,1% indígenas. A maioria dos entrevistados (50,3%) é do sexo masculino, tem entre 15 a 19 anos (53%) e cursa o Ensino Médio (54,4%).

Ainda em relação às redes sociais, onde o tema é recorrente e os jovens estão muito presentes, 35,9% acham que elas estimulam a discussão do tema positivamente e 13% acreditam que elas incentivam um ativismo virtual exagerado e nada prático.


Nesse aspecto, o que acontece, na avaliação de Jacqueline Damasio, é que os jovens sabem que a discussão é coerente, proveitosa e necessária, "só que nós estamos vivendo num momento em que os jovens, principalmente os periféricos, eles querem a prática antirracista, porque de discurso todo mundo já está de saco cheio", pondera.

Isso explica porque a militância que fica só nas redes sociais, está perdendo espaço para o ativismo. "Estamos falando de atividades, quais vão levar para essa população que geralmente é preta e periférica, uma outra condição de vida".

Quanto à falta de políticas públicas apontada por 77,1% dos jovens como um problema para enfrentar o preconceito racial com seriedade, Jaqueline Damasio acredita que os municípios estão se atentando para a pauta racial agora, também é uma demanda nova no campo político, mas ressalta que este é um trabalho de formiguinha. "Nós temos muitos discursos de que somos todos iguais e este discurso acaba nos inviabilizando, é um contra discurso. Nós não somos todos iguais e precisamos avançar nas diferenças que nós temos. Se o discurso é que somos todos iguais, então não tem por que uma política pública específica. Na verdade a gente precisa ressaltar as diferenças e a partir dessas diferenças averiguar quais são as demandas e aí sim ter condições de pensar em políticas públicas específicas para a população negra, tanto na educação, na saúde, aí sim a gente vai começar avançar um pouco mais".


Dos pesquisados, 40,9% admitem que já foram vítimas (ou algum familiar) de algum tipo de preconceito, discriminação, humilhação ou deboche por causa da cor ou raça. A maioria (56,9%) também diz que já presenciou algum tipo de discriminação racial contra outra pessoa. Nesses casos, 92,8% defende que a atitude a se tomar é denunciar, pois é uma forma de enfrentar o problema. Já 2,3% preferem ficar quietos, por achar que não resolve e 4.9% não souberam responder.

A pesquisa mostra ainda que o preconceito racial também se manifesta na desigualdade social, de oportunidades e de tratamento entre negros e brancos no Brasil. Para 63% dos entrevistados, os negros no Brasil não têm as mesmas oportunidades e diretos que os brancos, enquanto 28,5% acham que sim e 8,6% não souberam responder. Por outro lado, 71,7% dos jovens acreditam que os brancos têm mais chance de conseguir emprego no Brasil.

A maioria (86,9%) também acha que no Brasil as chances de uma pessoa negra ser abordada de forma violenta ou ser morta pela polícia são maiores que os brancos.

Quanto às cotas raciais nas universidades, 61% dos entrevistados se dizem favoráveis pois acreditam que a medida ajuda a minimizar a desigualdade, enquanto 17,4% são contra pois acreditam que a medida além de protecionista, não resolve o problema, e 21,6% são indiferentes.

Em relação ao Coronavirus, apesar dos estudos apontarem que a Covid 19 matou mais negros que brancos, a maioria dos jovens (46,9%) acredita que a pandemia atinge a todos indistintamente. Já 39,8% acham que ela afetou mais os negros, pois grande parte da população negra é mais vulnerável social e economicamente.

A pesquisa também quis saber se os jovens hoje são menos racistas que a geração de seus pais. 48,7% acham que são menos racistas, 26,1% mais racistas, e 25,2% são tão racistas quanto. Ou seja, apesar de toda discussão em torno do tema e dos avanços, a soma dos que acham a nova geração mais ou tão racista quanto as anteriores, ainda prevalece.

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