Mudanças

Para procuradores, mudanças podem esvaziar lei de lavagem de dinheiro

Modificações na legislação vem sendo propostas por grupo de juristas (formado em setembro deste ano) que compõem a comissão designada na Câmara dos Deputados para a atualização da lei de lavagem de dinheiro

Atualizada em 11/10/2022 às 12h18
: Grupo de advogados, que formam a comissão, propõe que lavagem de dinheiro deixe de ser crime autônomo
: Grupo de advogados, que formam a comissão, propõe que lavagem de dinheiro deixe de ser crime autônomo (Câmara dos Deputados)

BRASÍLIA

As duas primeiras reuniões da comissão de juristas designada pela Câmara dos Deputados para discutir a atualização da lei de lavagem de dinheiro deixaram surpresas as autoridades de órgãos de controle que acompanham a discussão. Alguns advogados têm defendido mudanças que representam, para procuradores, retrocessos em um campo em que o país tem evoluído nos últimos anos e que contrariam convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. Além disso, as mudanças podem levar à anulação de condenações.

O grupo de juristas foi formado em setembro, a pedido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, para formular um relatório com propostas de mudanças para a lei de lavagem. Esse relatório deve resultar em um novo projeto de lei legislativo, alterando as regras atuais.

Há propostas para que a lavagem de dinheiro deixe de ser um crime autônomo e só possa ser punida se houver condenação por um crime antecedente. A ideia é encampada por Gamil Föppel, advogado do ex-ministro Geddel Vieira Lima, condenado por lavagem de dinheiro. Outra sugestão lançada foi a de descriminalizar a ocultação de bens e valores.

Essa medida tornaria impune, por exemplo, o depósito fracionado e constante de pequenas quantidades de dinheiro, prática habitual entre adeptos do crime de colarinho branco e de "rachadinha", mas também poderia levar à anulação da condenação do próprio Geddel, sentenciado pelo Supremo por ocultar R$ 51 milhões em um apartamento em Salvador. Assim, ficaria como crime apenas a lavagem na modalidade dissimulação de valores - para dar um exemplo, isso ocorre quando um pagamento é feito por um serviço não prestado.

Frente

Em outra frente, o advogado Antonio Pitombo, que atuou no mensalão e também já defendeu Jair Bolsonaro enquanto deputado federal, propõe a diminuição da pena máxima de lavagem de dinheiro 10 para 6 anos. Outra sugestão, do advogado Juliano Brêda, que defendeu empreiteiros da OAS na Operação Lava Jato, é para que a pena máxima pelo crime de lavagem de dinheiro não seja superior à do crime antecedente.

Advogados que integram a comissão também querem prever expressamente que o recebimento de honorários advocatícios não configura lavagem de dinheiro sob qualquer hipótese; o argumento é que os advogados estão sendo punidos pelo simples recebimento de seus honorários.

Essa medida blindaria advogados que estão na mira da Lava Jato no Rio de Janeiro, diante de suspeitas de que houve contratos fictícios para lavagem de dinheiro.

A comissão de juristas, formada por 44 integrantes, tem 24 advogados, e as autoridades ligadas a órgãos de controle são minoria. Não há representantes, por exemplo, do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), órgão reconhecido como fundamental para o avanço de algumas das mais importantes investigações do país envolvendo lavagem de dinheiro, nem da Receita Federal.

Retrocesso

Para procuradores, propostas configuram retrocesso no combate à lavagem de dinheiro

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fabio George Cruz da Nóbrega, aponta que essas propostas da comissão de juristas citadas pela reportagem são prejudiciais à prevenção e à lavagem de dinheiro no país. "Seria um retrocesso enorme nessa longa caminhada que o Brasil trilhou para adequar a legislação aos parâmetros internacionais", disse

A Lei de Lavagem foi aprovada no Brasil em 1998, prevendo, entre outros pontos, a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), e sofreu uma importante alteração em 2012, quando ficou estabelecido que qualquer delito que gere bens, direitos ou valores agora poderá resultar em lavagem de dinheiro Isso permitiu avançar no rastreamento e confisco de dinheiro do financiamento de organizações criminosas. L

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Preocupação

Uma das preocupações de quem acompanha a comissão de reforma da Lei de Lavagem é que, agora, a Câmara decida modificar as competências do Coaf ou a forma de trabalho, de um modo que torne menos efetivo o órgão. Desde o mensalão, até hoje, passando pela Operação Lava Jato, o Coaf assumiu um papel de enorme relevância na investigação sobre crimes de colarinho branco, como corrupção e lavagem.

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