Arte

A arte imortal de Antônio Almeida

Autodidata, artista plástico maranhense desenvolveu e apresentou diversas facetas de sua obra ao longo da vida; entre seus trabalhos, dois murais no Parque do Bom Menino que foram restaurados

Carla Melo/Da equipe de O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h19

SÃO LUÍS- Quando os filhos do artista plástico maranhense Antônio Almeida souberam da reforma do Parque do Bom Menino, no Centro da capital maranhense, entraram em contato com a Prefeitura de São Luís para que os dois murais do artista - “Bumba meu boi” e “Brincadeiras de criança” - que figuram naquele espaço público, pudessem ser restaurados. Acertados os detalhes, o trabalho de revitalização das obras, que foram produzidas em 1969, ano de inauguração do logradouro, tomou corpo e o resultado é a valorização de importantes obras do maranhense que foi muralista, pintor, xilogravurista, escultor, ceramista, ilustrador e entalhador, entre outras vertentes. Antônio Almeida foi, também, o precursor da arte urbana em São Luís.

De acordo com Holândia Almeida, filha do artista, a restauração trouxe de volta as características originais dos painéis que há muito tempo estavam deteriorados. “Assim que tivemos conhecimento da revitalização do Parque do Bom Menino entramos em contato com a Sempe (Secretaria de Projetos Especiais da Prefeitura de São Luís) para saber se os murais tinham entrado no projeto de revitalização. Com a afirmativa e a disposição do prefeito Edivaldo Holanda Junior em realizar a restauração, meus irmãos Olinda e Alberto, que sempre trabalharam com meu pai e sabiam das técnicas usadas por ele, se colocaram à disposição para restaurá-los. A preocupação maior era manter a originalidade dos murais, cor e figuras que tiveram que ser reconstruídas pois os murais estavam bastante danificados. E totalmente abandonados”, relata Holândia Almeida.

Sobre o resgate das cores, ela conta que são as originais e que foi possível pelo fato de os irmãos terem trabalhado por anos ao lado do pai e, assim, terem aprendido todas as técnicas usadas pelo artista. “O trabalho foi refeito da mesma forma que meu pai fazia. Ele fazia as tintas, a mistura de tintas até chegar à cor que queria. O trabalho estava totalmente descaracterizado das cores original que agora estão de volta”, observa Holândia destacando que os temas eram sempre uma escolha de Antônio Almeida, que nunca fez trabalhos seguindo a vontade de quem o contratava.

A restauração dos dois painéis durou cerca de 20 dias. Na primeira fase, os irmãos fizeram a raspagem de tintas antigas e restos de outros materiais que estavam nos murais e reconstruíram algumas partes danificadas. Na segunda, ocorreu a aplicação da pintura.

No mural “Bumba meu Boi” há predominância de tons telúricos como amarelo ocre e marrom sobre fundo azul claro. No “Brincadeiras de criança” as figuras ganham contorno preto em fundo branco. Em ambos, Antônio Almeida usou a técnica de relevo rebaixado, onde somente o contorno da figura é delineado. As obras de arte estão localizadas no anfiteatro e na entrada, Antônio Almeida deu destaque para as brincadeiras infantis. Na parte interna, à temática da festa mais popular do Maranhão, o bumba meu boi.

Mural
Mural "Brincadeiras de Criança" também no Parque do Bom Menino (Crédito: Paulo Soares)

Arte Urbana

Além dos dois trabalhos do Parque do Bom Menino, Antônio Almeida deixou sua assinatura em diversos pontos da cidade e que podem ser vistos em prédios como a sede do antigo Banco do Estado no mural “Trabalho, Crença e Festa” que ocupa uma área de 340 metros quadrados e traz elementos como as figuras do vaqueiro, do bóia fria e da mãe que também é quebradeira de coco. Ainda no Centro, há outro trabalho do artista representado na sede da Associação Comercial.

Há, ainda, o mural onde era a antiga rodoviária, no bairro Alemanha. No obelisco, Antônio Almeida apresenta os costumes locais com figuras humanas que simbolizam pescadores e o homem do campo. Residências e empresas privadas, como a sede do Grupo Mirante, também têm obras do artista.

Além disto, há um mural que atualmente está deteriorado, na Avenida dos Franceses, na sede da antiga Mardisa. É desejo dos filhos do artista resgatar e iniciar o processo de tombamento das obras de Antônio Almeida que contam sobre a história não só da arte no Maranhão, como também aspectos da vida cotidiana da cidade como os operários, as crenças e as festas populares do Maranhão tão bem representados pela sensibilidade do maranhense que era um autodidata tendo estudado somente até o antigo segundo ano primário mas que tinha com inspiração nomes como Cézanne, Matisse e Van Gogh.

Importância histórica

A contribuição de Antônio Almeida para a arte maranhense é inquestionável. Considerado um gênio das artes plásticas, ele era represente da arte moderna no estado.

A professora Geyse Nicácio, formada em Arte pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e pesquisadora das obras de Antônio Almeida, destaca as habilidades do artista em trabalhar nas mais diversas técnicas e estilos desenvolvidos a partir de muita pesquisa no acervo de livros de arte da Biblioteca Pública Benedito Leite e esforço próprio.

Ela explica que foi a partir de 1960 que o maranhense iniciou suas pinturas em grandes dimensões em murais e fachadas de prédios. “Sempre trabalhando com a temática regional, valorizando o trabalhador e a cultura popular. O primeiro convite foi por Odylo Costa, filho, para elaborar uma pintura mural em um prédio na Rua Grande, essa pintura, lamentavelmente, que não existe mais”, ressalta a pesquisadora.

Sobre a técnica aplicada nos murais ela diz que são composições representadas de maneira estilizada. “Sendo as formas separadas por contornos lineares, utilizando a técnica de sulco na parede: desbaste dos contornos das figuras e, em seguida, preenchidos pela cor”.

Antônio Almeida no mural da antiga Mardisa
Antônio Almeida no mural da antiga Mardisa

Uma vida dedicada à arte

Antonio Alves Almeida nasce em 27 de junho de 1922 e faleceu em 2 de janeiro de 2009 no no povoado Jacaré, município de Barra do Corda, filho de pai cearense com mãe piauiense é a síntese do homem nordestino. Passou sua infância em meio ao trabalho da roça e foi nesse cenário de cidade pequena que, aos 5 anos de idade viu, pela primeira vez, alguém desenhando. Aquela cena o impressionou e despertou-lhe o interesse pela arte, passando desde então, a desenhar com frequência. Experimentava estilos e técnicas com os materiais que tinha à mão, um autodidata que se se considerava um "intuitivo".

Almeida era um incansável pesquisador, ao longo da sua profícua carreira artística diversificou seus trabalhos nas mais variadas técnicas e estilos: pintura a óleo e crayon, colagens, esculturas em ferro, madeira e modelagem na argila e cerâmica, tapeçaria, mural. Produziu xilogravuras, pintou grandes painéis e foi um exímio ilustrador. Arriscou-se também no campo literário e escreveu versos com a mesma desenvoltura artística que pintava suas telas, ele se considerou um poeta por “acidente”.

Já estava com a saúde debilitada e cego quando faleceu, aos 86 anos de idade, deixando um vasto legado artístico onde se pode perceber, sobretudo belas obras em murais e prédios que compõem a arte urbana de São Luís.

Era membro das academia Maranhense de Letras e Barra Cordense de Letras. Ganhou, no decorrer de sua carreira, muitos prêmios como medalha de prata no Salão de Artes Plásticas do Ceará.

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