Violência

Agressores de mulheres devem ressarcir custos de atendimento médico

Lei que estabelece a medida está publicada no Diário Oficial da União, ontem, 18; a responsabilização financeira do agressor, mesmo antes do fim do processo, faz parte de uma lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro na terça-feira, 17

Atualizada em 11/10/2022 às 12h23
O Brasil registrou 180 casos de estupro e 720 agressões em contexto de violência doméstica por dia em 2018
O Brasil registrou 180 casos de estupro e 720 agressões em contexto de violência doméstica por dia em 2018 (Divulgação)

BRASÍLIA - O agressor de violência doméstica terá que ressarcir ao Sistema Único de Saúde (SUS) os custos médicos e hospitalares com o atendimento à vítima de suas agressões. A Lei nº 11.340, que estabelece a responsabilização, sancionada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, está publicada no Diário Oficial da União de ontem, 18. A proposta foi aprovada pela Câmara dos Deputados em agosto

De acordo com o texto, "aquele que, por ação ou omissão, causar lesão, violência física, sexual ou psicológica e dano moral ou patrimonial a mulher fica obrigado a ressarcir todos os danos causados, inclusive ao Sistema Único de Saúde (SUS)". Os recursos arrecadados vão para o Fundo de Saúde do ente federado responsável pelas unidades de saúde que prestarem os serviços de atendimento à vítima de violência doméstica.

O documento diz ainda que os custos com o uso de dispositivos eletrônicos de monitoramento também deverão ser ressarcidos pelo agressor. A portaria determina ainda que os bens da vítima de violência doméstica não podem ser usados pelo autor da agressão para o pagamento dos custos e nem como atenuante de pena ou comutação, de restrição de liberdade para pecuniária.O texto não prevê punição criminal para o agressor caso ele descumpra a decisão.

Já era prevista a cobrança de acordo com a interpretação dos juízes, mas a previsão na legislação, na visão de técnicos do Palácio do Planalto, ajuda a difundir a "cultura" da cobrança e enfraquece teses da defesa. Conforme o texto da proposta, o agressor fica obrigado a ressarcir todos os danos causados, inclusive ao Estado. Além disso, a proposta estabelece que os agressores também serão obrigados a ressarcir o Estado por dispositivos de segurança usados para casos de "perigo iminente" e em casos de monitoramento das vítimas por ação de medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha.

Atos de violência

Ao sancionar o texto, o presidente Bolsonaro justificou que a medida é necessária para "obrigar o agressor familiar/doméstico a responder pelos seus atos de violência contra a mulher, não só na esfera penal e na criminalização de sua conduta, mas também por meio do ressarcimento aos danos materiais e morais causados pela sua conduta ilícita".

"Ademais, por meio desta medida busca-se reforçar a legislação e as políticas públicas que visam coibir a violência contra as mulheres e, consequentemente, garantir a proteção à família", afirma a justificativa do presidente.

A presidência ressalta que o projeto sancionado não traz impacto no Orçamento, já que não cria e nem modifica despesa. A proposta entra em vigor 45 dias da data de sua publicação, o que deve ocorrer na edição de quarta-feira do Diário Oficial da União (DOU). Durante a tramitação do projeto, a Câmara retirou alteração feita pelo Senado que dizia que o "condenado" deveria ressarcir a vítima. Desta forma, os deputados permitiram que as vítimas consigam ser indenizadas mesmo antes do fim da tramitação do processo penal.

Estupro e agressões

O Brasil registrou 180 casos de estupro e 720 agressões em contexto de violência doméstica por dia em 2018, segundo dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os números de estupro são os maiores desde 2009, ano de início da análise após uma alteração na abrangência da lei. Crianças e adolescentes são a maior parte das vítimas. Já temos leis, precisamos de políticas públicas, diz promotora

A promotora Silvia Chakian, integrante da promotoria voltada ao enfrentamento à violência Doméstica do Ministério Público de São Paulo, disse que é necessário ver com cautela legislações como essas, apesar da importância de se avançar nas políticas de responsabilização do autor de violência para além da esfera penal.

"Pensando na efetividade da medida, algumas preocupações surgem. A punição contra o autor não pode afetar a subsistência da vítima e dos filhos quando ela permanecer com vínculo familiar. Como essa distinção de patrimônio será feita?", questionou.

Ela lembrou que já existe, no Código de Processo Penal, a previsão de indenização da mulher pelos danos morais ou materiais causados em decorrência da violência. A promotora viu com ressalvas a previsão de que a ordem de indenização seja aplicada antes da condenação definitiva do acusado. "É uma questão complicada. Precisa haver certeza que o autor praticou o crime para que o Estado possa cobrar a indenização, caso contrário não há reconhecimento formal da Justiça de que aquela pessoa causou a violência."

Diante dessas ponderações, Silvia disse que a cautela na interpretação da lei ocorre para que não avancem propostas que, na prática, poderão se tornar inexequíveis. "Já temos muitas leis e não podemos continuar buscando solução para problemas relacionados a questões culturais somente nessas legislações. Precisamos enfrentar outros entraves, como melhoras em políticas públicas e serviços de uma rede que hoje é muito deficitária."

AGU também mira cobrança

Em 2017, Advocacia-Geral da União (AGU) e Conselho Nacional do Ministério Público firmaram acordo para compartilhar dados sobre violência doméstica. A ideia é ajudar a AGU em ações judiciais contra assassinos de mulheres, para impedir que recebam pensão por morte quando são responsáveis pelo homicídio da mulher e na cobrança dos valores pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a dependentes da vítima. Até aquele ano, a AGU havia proposto 14 ações do tipo, com expectativa de ter R$ 1,4 milhão ressarcido. Amamentação Outro projeto sancionado estabelece o direito de mães amamentarem seus filhos durante a realização de concursos públicos na administração pública direta ou indireta.

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