Especial

O centenário bairro Apeadouro, com seus hábitos e tradições

Com aproximadamente 126 anos de existência, como defendem alguns pesquisadores, bairro ainda preserva elementos de nostalgia e afinidades entre vizinhos

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24
Turma na porta da antiga “Quitanda do Bala”, hoje uma moradia
Turma na porta da antiga “Quitanda do Bala”, hoje uma moradia

SÃO LUÍS - Apear. Verbo que oficialmente significa “fazer descer ou descer de montaria ou veículo”. Foi deste hábito que surgiu um dos bairros mais conhecidos e tradicionais da nossa São Luís histórica. Localizado entre os bairros da Alemanha, Alto Paraíso, Bom Milagre e Monte Castelo, o Apeadouro é destes pontos que ainda preservam hábitos e tradições que remontam a uma cidade nostálgica.

Nas últimas semanas, O Estado se debruçou sobre pesquisas e depoimentos de antigos e atuais residentes e descobriu um bairro de grande valor cultural e urbano. Com base na “Análise Toponímica de 81 nomes de bairros de São Luís”, feita por Heloísa Reis Curvelo Matos, da Universidade Federal do Ceará (UFCE) e com referência de antigas publicações de jornais, oficialmente é possível definir a data de criação do Apeadouro a partir de 5 de julho de 1893.

Logo, o bairro completou nesta sexta-feira (5) aproximadamente 126 anos de existência.
A data é citada, pois foi neste período que a Companhia de Ferro Carril, até então responsável pelos bondes que faziam o transporte publico de São Luís, determinou um local para embarque. Teria sido a empresa a orientadora da medida que mudaria a história dos apeadourenses.

A tese é referendada inclusive por pesquisadores, como o professor universitário Ed Wilson Araújo, filho do Apeadouro. Segundo ele, havia uma norma da companhia que ditava que os residentes nos arredores do antigo Caminho Grande (atual Avenida Getúlio Vargas, com trecho pela Casemiro Júnior e antiga João Pessoa) deveriam descer de seus cavalos para serem transportados nos bondes ao Centro.

O professor ressaltou que, após o apear, era possível ir de bonde. Antes disso, era checado se o passageiro continha a passagem. “Nestas paradas, os moradores deixavam seus cavalos e aproveitavam para se limpar, se assear, já que o Caminho Grande era feito de terra batida ou de lama, nos tempos de chuva. O ato de apear era comum neste antigo trecho da cidade”, disse a O Estado Ed Wilson na residência de sua mãe, Terezinha Ferreira Araú­jo, situada na Rua Sousa Andrade, no tradicional bairro.

A tal parada para assear tornou-se uma tradição robusta, com o crescimento populacional e expansão da cidade para a região central. A ponto de se estabelecerem no entorno pequenos imóveis feitos de palha e tijolos artesanais que ofereciam alimentos caseiros. “Havia um costume ainda que, quando havia a parada para apear o cavalo, eram oferecidos por vendedores em volta alimentos, como peixes. Era comum aquele aroma gostoso de peixe frito no líquido caseiro”, disse o professor.

Além de “empreendimentos” modestos, os pontos de parada dos animais ainda traziam cuidadores de animais. O bairro, logo, nasceu desta gente humilde - carregadora de animais e ofertadora de peixes e outras especiarias em geral. “Da região onde estamos hoje, fixaram-se casas e outras moradias. Com isso, o bairro foi surgindo”, disse o acadêmico.

Nestas paradas, os moradores deixavam seus cavalos e aproveitavam para se limpar, se assear, já que o Caminho Grande era feito de terra batida. O ato de apear era comum”Ed Wilson Araújo, professor universitário

Padronização das casas

Após o bairro começar a surgir a partir das raízes do comércio local fomentando pelo deslocamento da população ao eixo central urbano, optou-se pela necessidade de padronizar os primeiros imóveis. Coube a missão à Companhia de Ferro Carril.

O fato, inclusive, fora trazido na edição do Diário Oficial do Município (DOM), em sua página III de 5 de julho de 1893. Segundo a publicação, “pede-se aos srs. Moradores do Caminho Grande que desejam fazer apeadeiros em lugar que a locomotiva possa parar, de se entender com o Engenheiro Lourenço de Alerade para ser demarcado”.

Os dirigentes da Companhia não somente demarcaram a área do Apeadouro como ainda organizaram o trânsito de veículos de tração animal, cavalo ou gado. As casas, no nascedouro, eram demarcadas com a seguinte metragem (15x45). O Apeadouro, desta forma, pode-se dizer que foi um dos primeiros bairros na capital maranhense a ser erguido sob a organização urbana recomendável.

Rua Manoel da Nóbrega, a principal do tradicional bairro Apeadouro
Rua Manoel da Nóbrega, a principal do tradicional bairro Apeadouro

Apesar da “boa intenção” aparente, o que na verdade objetivava a empresa administradora dos bondes era “higienizar o centro”, já que estes animais deixavam seus dejetos ao longo das vias por onde passavam, sem que necessariamente seus donos recolhessem os materiais. Daí a criação desta espécie de “código de conduta” que, ao emergir os locais de apear, fez-se nascer o Apeadouro.

Com o passar dos anos, o bairro ganhou nova dimensão, se incorporou a bairros vizinhos e ainda sofre com a escassez de serviços básicos voltados para a saúde e educação.

“Era muito bom. Dava para a gente conversar na porta. Não tinha esse negócio de assalto. Sempre foi um bairro tranquilo e meu comércio era referência”Norberto Guimarães, “Seu Bala”, comerciante do Apeadouro

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