MANIFESTAÇÃO

Indígenas realizam manifestação na Funai

Povos nativos reivindicaram respeito à identidade cultural indígena e demarcação de terras e contra medidas propostas por Jair Bolsonaro, presidente do Brasil

Igor Linhares / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h26

Organizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a mobilização nacional em alusão ao “Janeiro Vermelho - Sangue Indígena: nenhuma gota a mais” aconteceu em todo o Brasil ontem (31). Em São Luís, a manifestação teve início logo nas primeiras horas da manhã, com caminhada saindo da Casa de Orações de Oásis, localizada no bairro Aurora, em direção à sede Fundação Nacional do Índio (Funai), abrigada no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Anil, onde houve atos de reivindicações contra o governo de Jair Bolsonaro e favoráveis à demarcação de terra, no interior da autarquia federal.

Segundo indígenas, manifestantes e outros apoiadores da cau­sa, após 30 anos de aprovação da Constituição Federal de 1988, que trouxe respeito à identidade cultural dos povos nativos e ao direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam, eles alegam que continuam sofrendo ameaças, ten­do sido a mais recente anunciada pelo presidente Jair Bolsonaro, na Medida Provisória (MP) n.º 870/2019 e, ainda, nos decretos assinados pelo presidente para reorganizar a estrutura e as competências ministeriais. Com a MP 870, o Governo Federal transfere para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), que tem à frente a ministra Tereza Cristina, a identificação, delimitação, reconhecimento e demarcação das Terras Indígenas (TIs).

Aos gritos de “Demarcação já!” e “Ocupar e resistir!”, a comunidade presente durante a manifestação exigiu proteção aos ecossistemas e à biodiversidade, sobretudo à vida e cultura indígena, que vem sendo ameaçada, como acontece na comunidade Awá-Guajá, no interior do estado, e na comunidade de Engenho, em São José de Ribamar, na Região Metropolitana de São Luís. Além disso, os indígenas dizem perder a Fundação Nacional do Índio (Funai), ór­gão que tinha a responsabilidade de garantir a integridades das TIs, que agora é subordinada ao Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos, comandado pela ministra Damares Alves.

“Nós, enquanto povos indígenas, originários desta terra, não poderíamos ficar omissos, de braços cruzados vendo os nossos parentes lutando, sem fazer nada. Por isso, a gente decidiu se mobilizar, realizar essa manifestação em repúdio a tudo o que está acontecendo no país, todo o retrocesso, todo esse descaso para com os direitos daqueles que o Governo chama de minoria. Nós somos guerreiros, somos resistência e sempre que a gente ver e sentir que os nossos direitos estão sendo ameaçados, a gente vai se manifestar”, declarou Magno Guajajara, da comunidade indígena Canabrava, localizada no município de Jenipapo dos Vieiras, distante 500 km de São Luís. Sobre as últimas ações do presidente direcionadas aos indígenas, disse: “Ele não tem respeito!”.

Segundo Domingos Tremembé, do território do povo indígena Tremembé do Engenho, no município de São José de Ribamar, as manifestações continuarão até que se obtenha resposta exitosa às reivindicações diante das ameaças que todos os índios alegam sofrer com o novo gestor federal. “Queremos garantir direito sobre os nossos territórios, porque o Governo Federal tem tirado os nossos direitos, feito alterações sem fundamento, como transferir a Funai para outro ministério, sucateando os nossos direitos. Quando o atual presidente assumiu o governo, ele já encontrou tudo o que se refere ao índio, organizado”, destacou. “É uma falta de responsabilidade desse governo que, mal entrou, e já chegou retirando o direito do povo”.

Ameaças aos indígenas

Há cerca de duas semanas, no Maranhão, índios denunciaram à Funai que fazendeiros e posseiros haviam entrado na terra indígena Awá-Guajá da região do São João do Caru, a 245 km de São Luís, para derrubar árvores e colocar gado para pastar na região. De acordo com a Frente de Proteção Étnico-Ambiental Awá, da Fundação Nacional do Índio (Funai), fazendeiros que ocupavam as terras ilegalmente haviam sido retirados das terras dos índios em 2014 após uma decisão judicial. Mas, desde 2015, fazem incursões, sem se estabelecer no local.

Ao determinar a saída dos fazendeiros em 2014, a Justiça estabeleceu que eles deveriam ser assentados pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na região da cidade de Parnarama, no leste do Maranhão. No entanto, segundo a Frente de Proteção Awá, os fazendeiros estariam insatisfeitos porque os reassentamentos não foram cumpridos para uma parte das famílias, e têm intenção de voltar a viver nas terras.

“No contexto da MP 870, que coloca para a Agricultura a demarcação de terras, [editada] na semana passada, tivemos informações de que um carro de som convocaria pessoas a uma reunião. Eles [fazendeiros] fizeram essa reunião neste domingo (13) no povoado Maguary, com informações de uma possível invasão [para voltar a viver nas terras] na área. Mas não houve nada até agora. O que nós tivemos informações é que eles vão fazer um documento e enviar ao ministério para fazer uma revisão da demarcação e retornar à área”, declarou o coordenador da Frente de Proteção dos Awás Bruno de Lima.

Os Awá Guajá são definidos pela Funai como “de recente contato”, prova disso é que a maioria só fala a língua nativa, o “Awá Guajá”.

Ainda no Maranhão

Segundo os manifestantes no ato realizado ontem, e material divulgado pela Rede Eclesial Pan Amazônica (REPAM), com informações Conselho Indigenista Missionário do Maranhão (CIMI/MA), tratores e um forte aparato policial invadiram o território do povo indígena Tremembé do Engenho, em São José de Ribamar, em dezembro, para uma ação de reintegração de posse em favor do deputado estadual Alberto Franco (PRB). Missionários do CIMI/MA e lideranças denunciaram as contradições no processo que autorizou o despejo das famílias indígenas e as violações de direitos humanos, com destruição de casas e do roçado e até revista policial em crianças.

Foram colocadas abaixo “as casas, o trabalho, a luta dos Tremembé”, de acordo com agentes do CIMI/MA, numa ação com aparato policial “maior do que a quantidade de moradores”. Fotos compartilhadas nas redes sociais, mostram tratores destruindo a horta dos indígenas que vivem na ilha de Upaon Açu.

De acordo com o CIMI/MA, os Tremembé estão resistindo a uma sequência de expulsões impetradas por jagunços do ex-dono de cartório e deputado Alberto Franco e mais recentemente pelo poder judiciário, em favor do mesmo. A reintegração de posse realizada nesta quarta-feira foi expedida pelo juiz Gilmar de Jesus, da Comarca de São José de Ribamar, numa sequência de pedidos de reintegração de posse expedidos mesmo depois do episódio em que o desembargador Raimundo Nonato Magalhães Melo sofreu intimidação de jagunços quando foi fazer uma visita ao território do Engenho.

Saiba mais

A Funai, antes de responsabilidade do Ministério da Justiça, passou para a responsabilidade da pasta comandada pela ministra e pastora Damares Alves, do Ministério da Mulher, Família e Direito Humanos. Indígenas alegam que, com as mudanças feitas pelo novo presidente, a saúde dos nativos passaram a ser de responsabilidade dos municípios, antes da Funai – repartição federativa.

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