Resgate histórico

Rampa Campos Melo: espaço de grande “burburinho” da cidade

No início, a estrutura era um dos grandes espaços de escoamento da produção, revendida no Mercado das Tulhas; não há registros históricos da Rampa Campos Melo, mas muitas lembranças de chegadas e partidas e encontros sociais

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h27

[e-s001]Construída em 1862 - de acordo com o exemplar “São Luís: Fundamentos do Patrimônio Cultural”, por Ananias Martins - e com Carlos de Lima em “Caminhos de São Luís” - a Rampa Campos Melo foi, por vários anos, um dos principais espaços de interação social, não somente pelo fluxo intenso de embarcações e mercadorias que por ali chegavam, como também pelo local de concentração de personagens conhecidos do cotidiano, como caixeiros, carregadores, vendedores de jornais, de café, de comidas e outras mercadorias. O local também sediou práticas de esporte e cultura e foi ponto de seleção daqueles que poderiam, com o acesso à cidade, apresentar sintomas de doenças com grau considerável de contaminação.

Como começou
A iniciativa foi do então presidente da província, Antônio Manuel de Campos Melo e seguia, de acordo com Carlos de Lima em “Caminhos de São Luís”, até o fim da atual Rua Portugal, passando ao lado da primeira Alfândega (ou antigo edifício da extinta Companhia do Comércio, onde atualmente funciona a Casa do Maranhão). A referência à rampa também é feita por César Augusto Marques em seu “Dicionário Histórico-Geográfico da Província do Maranhão”.

Conforme citado por Mário Martins, “até a quarta parte do século XIX, a área da chamada Praia Grande era considerada um lodaçal”. Segundo ele, a água - antes da obra - costumava invadir desde a “rampa do palácio até a Rua da Estrela, onde se encontrava a alfândega”. Foi a partir da rampa que houve melhora no acesso até a Feira da Praia Grande.

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A ‘Campos Melo’ tem relação direta com o desenvolvimento de um dos polos financeiros da capital maranhense. Por causa da rampa, o acesso a pontos mais distantes da capital maranhense foi dinamizado. “Na verdade, a Campos Melo ficava paralelamente a rampa do Palácio, separada pelo prédio do Tesouro antigo, atualmente Casa do Maranhão”, disse o engenheiro, professor e membro da Academia Maranhense de Letras (AML), Luiz Phelipe Andrès.

Segundo o também pesquisador, foi a partir da rampa Campos Melo que se desenvolveu boa parte da região Central da cidade, já que a estrutura se ligava à Rua Portugal, até hoje uma das referências na Praia Grande. “Quando as mercadorias chegavam, iam direto para dentro da cidade. Para se ter uma ideia de onde era a Campos Melo, ficava onde é hoje uma praça ao lado da Casa do Maranhão, de um dos lados”, disse Andrès.

Boom da economia local
Se antes da consolidação da rede de apoio portuário, São Luís - até o fim do século XVIII - registrava casas em situação precária e construídas de taipa, conforme cita César Marques (2006), a partir do registro mais intenso de embarcações na capital maranhense, houve um “boom da economia local”, impulsionada com a criação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão. O elemento representativo deste aporte financeiro foi a Feira da Praia Grande, que se tornou o polo
atrativo das mercadorias que chegavam pelas rampas nos rios Anil e Bacanga.

Na verdade, a Campos Melo ficava paralelamente à do Palácio, separada pelo prédio do Tesouro antigo, atualmente Casa do Maranhão”Luiz Phelipe Andrès, engenheiro, professor e membro da Academia Maranhense de Letras (AML)

Antes da consolidação dos acessos (rampas), a economia ludovicense estava baseada na exploração de produtos de subsistência. Com o desenvolvimento de novos métodos na produção agrícola, o estado do Maranhão - com o destaque ludovicense - passou a fazer parte do comércio mundial com a produção de arroz e algodão.

Neste contexto, surge - de acordo com Ananias Martins em “São Luís: Fundamentos do Patrimônio Cultural” - a Casa das Tulhas ou o Mercado das Tulhas “como um conjunto arquitetônico fundamental e monumental de importância histórica para a cidade devido às suas características coloniais”. Segundo Martins, o imóvel foi erguido em meados do século XVIII para funcionar inicialmente como um “celeiro”.

A estrutura da Casa das Tulhas foi feita em um só pavimento, com “contorno quadrilátero”, segundo Martins e quatro “entradas em arco pleno, guarnecidas em pedras de cantaria”. Martins esclarece ainda que, na Casa das Tulhas, “ainda há portões que levam a uma praça interna, ajardinada e ornamentada com um belo chafariz inglês que pertencia à Companhia de Águas do Rio Anil, criada pelo engenheiro Teixeira Mendes”.

[e-s001]Martins esclarece ainda que tulha “era o nome dado aos cofos feitos de palha de buriti para armazenar os mantimentos que seriam comercializados no local”. Segundo o artigo “FEIRA DA PRAIA GRANDE: as peculiaridades mantidas através de séculos”, em 1863, houve um incremento na rede econômica da cidade. Foi quando o “Presidente Antônio Manoel de Campos Melo melhorou ainda mais a Praia Grande com a construção do “Beco do Trapiche e da Rampa Campos Melo”.

Rampa Campos Melo: palco de “rodas de capoeira”
A história da Campos Melo não está somente baseada na entrada e saída de mercadorias e passageiros. O local também foi palco de encontros sociais, compra e venda de produtos e práticas de atividades que fugiam ao cotidiano dos “trabalhadores braçais”. Entre uma e outra folga, os estivadores e carregadores de produtos praticavam a capoeira, conforme cita Leopoldo Vaz, especialista no assunto.

Vaz cita Dilvan de Jesus Fonseca, que informou que o avô era “estivador do Porto de São Luís”, que abrange a área do Cais da Sagração e que ele sempre citava a prática de “capoeira”, luta praticada na juventude. Outro - Mestre Diniz -, lembrou que “na rampa Campos Melo”, quando era jovem, ia acompanhar o seu pai e observava os estivadores jogando capoeira.
Registros históricos também apontam que a influência da prática da capoeira na Campos Melo também se dá pela cultura africana e formação populacional da Ilha. Não há registros fotográficos de pessoas praticando capoeira na famosa rampa.

Segregação epidemiológica
A Rampa Campos Melo também é citada no trabalho intitulado “O Estado Sanitário da Província do Maranhão de 1850-1860” de Jossilene Louzeiro Alves. Segundo o trabalho, o impaludismo (doença causada por um protozoário) castigou em meados do século XIX boa parte da província do Maranhão. Para conter a doença, o governo à época teria autorizado a abertura de enfermarias em diversos locais.

Segundo César Augusto Marques, em “Dicionário Histórico Geográfico da Província do Maranhão”, houve a necessidade da criação de uma Comissão de Política, nos portos da Província do Maranhão, para “avaliar o estado de salubridade dos navios e verificar a condição clínica das pessoas que estivessem a bordo dos navios.

As embarcações, em sua maioria, atracavam - de acordo com César Marques - no “Porto da Praia Grande”, considerada a principal via de acesso marítimo na ocasião da cidade. Pela Campos Melo, era feita a consulta dos pacientes e verificada a situação de cada um deles. Dependendo do estado de saúde e parecer médico, o cidadão tinha o acesso à cidade restringindo.

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