Coletânea

A poesia dos párias revistada em publicação comemorativa

Antologia “Párias: 30 anos – a poesia atravessa a rua”, a ser lançada em abril, reunirá poemas de jovens que agitaram a cena cultural na década de 1980

Evandro Júnior/De O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h50
Capa da revista "Párias: 30 anos" que reúne poemas da geração da década de 1980
Capa da revista "Párias: 30 anos" que reúne poemas da geração da década de 1980 (párias)

A década de 1980 e parte da seguinte, período de intensas transformações culturais no Brasil e no mundo, foram também marcantes para um grupo de jovens poetas maranhenses, em sua maioria alunos da Universidade Federal do Maranhão, que vestiram a camisa da irreverência para assumir uma linguagem que dialogava com os movimentos musicais e as expressões da literatura nacional e internacional. Reunidos em torno da Akademia dos Párias, eles externavam seus sentimentos na revista “Uns & Outros”, cujo primeiro número saiu em 1984 e o último em 1993.

Vivenciando a era pós-ditadura, eles tinham uma forte conexão com a prosa de Charles Bukowski e John Fante, o reggae de Bob Marley e Peter Tosh, a poesia de Paulo Leminski, o rock brasileiro daquela época e a geração marginal ou mimeógrafo, nascida na zona sul do Rio de Janeiro. Principalmente entre 1985 e 1989, eles realizaram recitais regados a vinho barato e catuaba e espalhavam pelas ruas, becos e bares da Ilha uma dicção poética até então inédita na cidade.

Agora, para relembrar esse movimento, será lançada em abril, com data ainda não definida, a antologia “Párias: 30 anos – a poesia atravessa a rua”, que reunirá quase 100 poemas dos mais de 420 publicados nas oito edições da revista porta voz da Akademia dos Párias. O conteúdo destacará versos de 22 desses poetas, entre eles Ademar Danilo, Antonio Carlos Alvim, Celso Borges, Fernando Abreu, Garrone, Guaracy Brito Jr, Joe Rosa, Mara Fernandes, Marcelo Silveira (Chalvinski), Paulinho Nó Cego, Paulo Melo Sousa, Rezende, Ronaldão, Ribamar Filho e Suzana Fernandes. O lançamento acontecerá durante coquetel com leitura de alguns poemas.

Geração - Conforme o poeta Celso Borges, aquele era o tempo da agonia da ditadura militar brasileira, da libertação do sufoco da censura e do aparecimento da "geração coca-cola", conforme leitura do jovem Renato Russo (Legião Urbana), que forma, ao lado de Cazuza (Barão Vermelho) e Arnaldo Antunes (Titãs), o triunvirato do melhor da poesia nascida das letras e atitudes incorporadas ao rock e ao mundo pop daqueles anos. “Dialogando direta ou indiretamente com esses artistas inquietos, nós arrotávamos no banquete dos conformados os nossos versos punks e haikais, ou quase haikais”, destaca.

Borges esclarece que a antologia não é um acerto de contas com os Párias. Há, claro, algum rigor na escolha dos poemas, mas também um olhar generoso sobre o que aquilo representou, tanto para as pessoas agentes daquela intervenção como também para o momento cultural e político que São Luís vivia. “Boa parte dos poemas escolhidos sobreviveu esteticamente ao tempo. Outros, em menor número, já envelheceram, mas estão presentes porque têm a cara daquela década, que reuniu jovens transitando e transando com uma linguagem de rua, de vícios e gírias, delírios derramados entre cacos de um mundo pulsante”, diz o poeta, acrescentando que a primeira ideia era fazer uma edição fac-símile dos oito números, mas isso não foi possível.

A edição opta por um projeto gráfico que mistura algumas ilustrações e grafismos originais com intervenções atuais, além de fotografias da época, a maior parte delas do acervo pessoal de Lisiane Costa. A assinatura é de Marcelo Chalvinski e a escolha dos poemas foi feita por Celso Borges, Garrone e Fernando Abreu.

Saiba Mais

A poesia produzida no Maranhão até o final dos anos 1940 permaneceu presa a uma linguagem do final do século XIX, predominantemente parnasiana. Foi o poeta Bandeira Tribuzi, voltando de Portugal onde fora seminarista, quem trouxe para São Luís, em 1947, algo do modernismo português de Fernando Pessoa e Almada Negreiros, além de poetas brasileiros da Semana de Arte Moderna de 22, principalmente Mario de Andrade e Manuel Bandeira.

Ainda assim, os escritores que começaram a escrever nos anos 1950 na capital maranhense foram muito mais influenciados pela Geração de 45, cuja proposta era conter os “excessos” do modernismo brasileiro. Salvo algumas exceções, somente no começo da década de 1970, com o movimento Antroponáutica (Luis Augusto Cassas, Viriato Gaspar, Valdelino Cécio e Raimundo Fontenele, entre outros), a poesia maranhense liberta-se da estética do soneto e se aproxima do lirismo, da ironia e do verso livre da escola modernista.

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