(Divulgação)

COLUNA

Allan Kardec
É professor universitário, engenheiro elétrico com doutorado em Information Engineering pela Universidade de Nagoya e pós-doutorado pelo RIKEN (The Institute of Physics and Chemistry).
Columa do Kardec

E a regulação da Inteligência Artificial?

Falamos sobre os movimentos de regulação da IA no mundo.

Allan Kardec

Atualizada em 29/08/2023 às 15h51
 
 

Assim como aconteceu com outras inovações, a da inteligência artificial (IA) tem gerado medo e preocupação em muitas pessoas. Embora muitos reconheçam as vantagens e os benefícios da tecnologia, também há um ceticismo generalizado sobre seus possíveis impactos negativos. Em seu último artigo na revista The Economist, Yuval Noah Harari, conhecido pelo livro "Sapiens: Uma Breve História da Humanidade", afirmou que a IA "hackeou" o sistema operacional da civilização humana, ressaltando as oportunidades e ameaças na atualidade.

O autor argumenta que a sociedade tem sido assombrada pelo medo da Inteligência Artificial desde o início da era da computação. No entanto, ele enfatiza que as recentes ferramentas podem representar uma ameaça à sobrevivência da humanidade devido à sua "direção imprevisível". Como ilustração, ele fala do impacto da IA na cultura através da linguagem. "A linguagem é a matéria de que quase toda a cultura humana é feita. Direitos humanos, por exemplo, não estão codificados em nosso DNA: são artefatos culturais que criamos contando histórias e escrevendo leis”.

Ele avança afirmando que a democracia também é uma linguagem baseada em diálogos, e quando a máquina invade a linguagem, ela também pode destruir a democracia. O autor destaca que a ascensão da IA está tendo um impacto profundo na sociedade, afetando vários aspectos, incluindo a economia, política, cultura e psicologia.

Seu argumento é que o maior desafio da era da IA não é a criação de ferramentas inteligentes, mas a colaboração entre humanos e máquinas. Para enfatizar a magnitude do impacto da desinformação impulsionada pela IA, ele aborda o culto QAnon, um movimento político afiliado à extrema-direita nos EUA que dissemina desinformação através de "gotas Q" que são vistas como sagradas pelos seguidores.

Harari também destacou como a ferramenta pode formar relações íntimas com as pessoas e influenciar suas decisões. Ele escreveu: "Através de seu domínio da linguagem, a IA pode até mesmo formar relacionamentos íntimos com as pessoas e usar o poder da intimidade para mudar nossas opiniões e visões de mundo". Para ilustrar esse ponto, ele mencionou o exemplo de Blake Lemoine, um engenheiro do Google que perdeu o emprego após afirmar publicamente que o chatbot de IA LaMDA havia se tornado senciente. Segundo Harari, essa controvérsia custou o emprego de Lemoine e ele questionou se a IA pode influenciar as pessoas a correrem o risco de perder seus empregos, o que mais pode levá-las a fazer.

Ele observou que as mídias sociais se tornaram um campo de batalha para controlar a atenção humana e a nova geração de IA pode persuadir as pessoas a votar em um determinado político ou comprar um determinado produto. Nesta parte, creio que ele chegou atrasado: as últimas eleições do Brasil e do mundo, inclusive o Brexit, foram dominados pelos algoritmos que nos influenciam através dos nossos cliques em Instagram, Twitter, Facebook, etc.

As conhecidas Fake News são amplificadas pelas chamadas "bolhas de filtro", que são manipulações algorítmicas. Uma vez inseridas nessa bolha, as pessoas tendem a receber mais conteúdos que são do seu agrado, com base em suas escolhas anteriores na internet, sejam vídeos engraçados de gatos no YouTube ou postagens e podcasts com inclinação ideológica. O aspecto preocupante é que o objetivo comercial das plataformas de filtro - ou seja, fornecer às pessoas o que elas desejam para estimular o consumo de conteúdo - tende a ter consequências negativas no âmbito político.

Isso leva as pessoas a ouvirem apenas a sua própria mensagem em vez de considerarem os pontos de vista dos outros, criando uma câmara de eco reforçada por algoritmos. Estudiosos afirmam que, enquanto a democracia depende da livre circulação de informações e ideias, as bolhas de filtro tendem a isolar os usuários. Em um ambiente filtrado, as informações não são disseminadas de forma ampla e livre. Para muitos analistas, as mídias sociais são apontadas como uma das principais causas para o declínio da saúde democrática em várias nações ao redor do mundo.

Harari traçou paralelos entre a IA atual e as noções de ilusão de mundo do filósofo René Descartes no século 17, bem como a ideia de maya dos sábios budistas e hindus. Ele destacou a importância da regulamentação e citou o exemplo da energia nuclear, afirmando que, embora possa produzir energia barata, também pode destruir a civilização humana. No entanto, ao longo dos anos, remodelamos a ordem internacional para garantir que a tecnologia nuclear seja usada para o bem-estar coletivo.

Por outro lado, a União Europeia deu um passo significativo rumo à aprovação de uma nova regulamentação para ferramentas de inteligência artificial (IA), como o ChatGPT, desenvolvido pela OpenAI, e o Bard, desenvolvido pelo Google. Considerado um dos textos mais rigorosos em discussão no mundo, parlamentares dos comitês de Mercado Interno e de Liberdades Civis do Parlamento Europeu chegaram a um acordo sobre o texto-base da nova Lei de Inteligência Artificial da UE, que foi aprovado.

A legislação recém-aprovada estipula que as empresas responsáveis pela criação de modelos de IA generativa, capazes de gerar textos, códigos ou imagens, serão obrigadas a produzir relatórios com avaliações de risco relacionadas às suas atividades comerciais. Além disso, essas empresas deverão tornar explicitamente claro quais conteúdos foram gerados por meio da IA, garantindo assim que os usuários estejam cientes de quando estão interagindo com textos, imagens e vídeos produzidos dessa forma. 

No Brasil, a situação segue um caminho similar. Em uma recente iniciativa, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, apresentou um projeto de lei com o intuito de estabelecer diretrizes abrangentes para o desenvolvimento, implementação e uso de sistemas de inteligência artificial no país. O objetivo principal é mapear e compreender os impactos econômicos e sociais que o avanço dessa tecnologia pode desencadear.

Essa proposta tem como base um relatório elaborado por uma comissão de juristas e compartilha diversos pontos em comum com o projeto de lei da União Europeia. Além disso, os Estados Unidos também estão se movimentando nesse sentido. A Casa Branca já manifestou seu apoio à regulamentação da IA e, na próxima semana, o CEO da OpenAI, Sam Altman, irá comparecer a uma audiência pública no Senado americano para discutir o tema. Enfim, o mundo não para! 

*Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP, membro da AMC, presidente da Gasmar.

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