(Divulgação)

COLUNA

Félix Alberto
Félix Alberto é poeta e jornalista.
FÉLIX ALBERTO

Chat GPT: quem tem medo da inteligência artificial?

As respostas, em forma de texto, são extremamente rápidas. Se são úteis? Se são confiáveis? O Chat GPT oferece informações rarefeitas, recicladas, que podem ou não servir ao interesse do usuário.

Félix Alberto

Atualizada em 02/05/2023 às 23h50
Félix Alberto é poeta e jornalista.
Félix Alberto é poeta e jornalista. (Ipolítica)

Se você ainda não teve acesso diretamente, pelo menos já deve ter ouvido falar do Chat GPT, uma ferramenta de inteligência artificial lançada há pouco tempo que está provocando debates acalorados sobre praticidade, desvio ético, violação de direito autoral e plágio no ambiente digital. A partir de uma compilação de dados lançados na internet, os robôs que estão por trás da ferramenta podem entregar ao usuário uma infinidade de informações. 

Não há limites para uma consulta. Você pode pedir ao Chat GPT para que escreva uma crônica sobre o centenário de fundação do Sampaio Correia, ele entrega. Se você optar por um relatório técnico sobre a economia do Maranhão, ele entrega. Se você quer escrever um conto sobre solidão, mas não sabe nem por onde começar, ele entrega. Se você pretende escrever uma poesia sobre a brisa da praia do Calhau, e não tem a menor ideia de como fazer, a ferramenta entrega. As linhas gerais de uma dissertação de mestrado. Uma simples receita de arroz de cuxá. Um discurso. Um ensaio literário. Um diagnóstico médico? Sim, até um diagnóstico médico.

As respostas, em forma de texto, são extremamente rápidas. Se são úteis? Se são confiáveis? O Chat GPT oferece informações rarefeitas, recicladas, que podem ou não servir ao interesse do usuário. As respostas são genéricas, algumas vezes superficiais, quando o tema requer uma avaliação mais técnica ou acadêmica. Quando o assunto exige uma elaboração mais subjetiva, como é o caso da linguagem literária (um poema ou conto, por exemplo), as respostas são simplórias, mas pelo menos garantem a arquitetura do resultado, um ponto de partida, um rascunho fluido, sem muita inventividade. 

Novidade que mais parece uma simbiose prosaica de duas ferramentas populares, como o Google e a Alexa, o Chat GPT desperta, no mínimo, curiosidade. Mas tem despertado mesmo é muita preocupação entre professores, que, com o advento dessa tecnologia, já não sabem mais se determinado conteúdo foi escrito de fato pelo aluno ou se é mera obra de robôs. 

O que é ruim para a área de educação – pelo estímulo natural da ferramenta à formação de uma massa de alunos reprodutores de conteúdo de internet, de uma geração de ineptos – não é bom também para questões como ética e direito autoral. O Chap GPT nasceu com o “vício crônico” de não citar fontes. O robô simplesmente faz uma varredura na internet, mistura frases e parágrafos no liquidificador e regurgita o resultado em poucos segundos, como algo novo. Mas não cita a origem das informações, não dá nome aos autores garimpados. Tudo isso, claro, pode resultar numa fraude grosseira de conteúdo alheio. O risco de plágio é altíssimo. 

Mas – dirão os defensores do uso da tecnologia – fora do ambiente da inteligência artificial o mundo anda cheio de plagiários, imitadores da criação alheia, jabutis e embusteiros profissionais. Muitos deles aplaudidos por suas obras-primas, premiados pelos incautos. 

Se ferramentas tecnológicas como o Chat GPT interferem diretamente na educação, no cotidiano de professores e alunos, também causa impacto no mercado de trabalho. Tomo como exemplo a minha área de atuação, a publicidade. Trabalha-se aqui com redação de textos para anúncio, criação de marcas, slogans e produtos para rádio, TV e mídias digitais. Como teste precário, fiz o seguinte pedido ao Chat GPT: “Escreva um roteiro de TV de 30 segundos sobre o Dia Internacional da Mulher no Maranhão”. E a ferramenta, em pouco mais de 10 segundos, entregou a seguinte peça:   

Cena 1:

Uma mulher maranhense caminha pela praia, olhando para o horizonte. Ela para e olha para a câmera.

Mulher: “No Maranhão, o Dia Internacional da Mulher é celebrado com muita alegria e orgulho. É um dia para lembrar o quanto as mulheres maranhenses contribuíram para o desenvolvimento do nosso estado.”

Cena 2:

Corta para um grupo de mulheres maranhenses se reunindo em uma praça. Elas estão se abraçando e se divertindo.

Mulher: “No Dia Internacional da Mulher, celebramos nossa força, nossa coragem e nossa determinação. É um dia para celebrar a nossa união e o nosso amor.”

Cena 3:

Corta para uma mulher maranhense segurando uma bandeira do Maranhão. Ela ergue a bandeira e olha para a câmera.

Mulher: “Viva o Dia Internacional da Mulher no Maranhão!”

A resposta do Chat GPT está longe de ser um roteiro primoroso, acabado. Mas a ferramenta oferece um rascunho ao usuário mais exigente, que pode ser acurado no discurso, lapidado na forma. Ao usuário sem escrúpulo, ao profissional preguiçoso, à agência que não conta com uma estrutura de roteiristas, a peça publicitária está pronta. É o tipo de tecnologia que pode afetar o futuro do mercado de trabalho, com a substituição de mão de obra por ferramentas como o Chat GPT? Acho pouco provável. Mas os robôs há muito já rondam o RH das empresas.

Estamos mais próximos do Black Mirror do que supõe nossa vã filosofia. Se o Chat GPT opera milagres em matéria de respostas textuais, já há outros caminhos no campo da inteligência artificial prontos a oferecer ao usuário resultados em forma de imagens. É o caso do software Dall-E. Basta você pedir ao robô que crie um desenho, uma fotografia, uma ilustração, uma logomarca ou uma compilação de imagens, ele vai lá e responde. 

Imagine uma serpente se arrastando sobre a ponte do São Francisco... Ele entrega. Imagine um orangotango passeando de jet-ski no espigão da Ponta d’Areia... Ele entrega. Essas são situações improváveis. Agora imagine coisas mais práticas, úteis a atividades recreativas ou profissionais, o futurismo em traço, obras elaboradas, sofisticadas... O robô entrega. Será a morte da arte, como alguns já anunciam? Nada substitui o talento humano.           

Há versões gratuitas do Chat GPT, de conteúdo mais simples, e existem também aplicativos pagos, com possibilidades de buscas mais avançadas. E hoje não faltam concorrentes da ferramenta no mercado digital, como Meta, ChatSonic, Bing, Bard e algumas outras ainda em fase de desenvolvimento. Ou seja, estamos apenas no começo dessa corrida insana pelo eldorado da inteligência artificial.     

Não temos a menor ideia onde tudo isso vai dar. Estamos diante de uma realidade que não tem mais volta. Ferramentas como o Chat GPT não devem impor medo, mas atenção. A inteligência artificial não pode ser utilizada como um vagão desgovernado nas infovias digitais capaz de atropelar a ética, o direito autoral. É preciso estabelecer a distância necessária entre conhecimento propriamente dito e informação instantânea subtraída de uma máquina. Para isso, vale discernir, no uso corrente da tecnologia, o que é pesquisa de fato daquilo que pode ser um exercício meramente lúdico.

As opiniões, crenças e posicionamentos expostos em artigos e/ou textos de opinião não representam a posição do Imirante.com. A responsabilidade pelas publicações destes restringe-se aos respectivos autores.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.