(Divulgação)

COLUNA

Allan Kardec
É professor universitário, engenheiro elétrico com doutorado em Information Engineering pela Universidade de Nagoya e pós-doutorado pelo RIKEN (The Institute of Physics and Chemistry).
Coluna do Kardec

O Colar de Pérolas

Uma crônica sobre uma solução de integração para o Arco Norte do Brasil.

Allan Kardec

Atualizada em 02/05/2023 às 23h38
 
 

Qual o rosto de Maria Firmina? Fiquei angustiado e estupefato quando soube que não há registros fotográficos ou pinturas da escritora maranhense, ousada e talentosa. Mais grave: a que vemos usualmente seria o de uma escritora gaúcha - e branca - chamada Maria Benedita Borman, que utilizava “Délia” como pseudônimo.

Enquanto isso, a cara do Brasil apareceu na partida contra a Servia: o pombo! Richarlison, além de campeão olímpico, é ativo política e socialmente. Lembro que, em 2021, ele contribuiu com o USP Vida, programa da universidade criado para contribuir com o avanço de pesquisas e ações da Covid-19. O atleta doou a chuteira usada por ele na semifinal da Copa América, no Peru, em 5 de julho e o objeto foi protagonista de leilão beneficente.

Assisti ao jogo contra a Servia com a velha e nobre Amarelinha, guardada há quatro anos na gaveta. Ainda tentei recuperar a que usei na copa de 1994, do Tetra, mas é muito quente. Vite e oito anos depois, comprei a chamada dry fit que todos usam hoje e fui roer as unhas na frente da TV, junto com milhões de brasileiros e torcedores pelo mundo afora.

Qual o caminho para o gol? Sinceramente, eu não sei! Nas partidas que joguei quando criança ou adolescente era sempre ou quase sempre o último escolhido. Você não sabe o que é se sentir rejeitado em uma pelada... Ouvir “fica com ele” é muito doloroso, vindo de grandes amigos com quem brincava durante o dia, ou no rio Grajaú, ou nas matas colhendo pequi ou bacuri.

Agora, o caminho para o Brasil, esse eu tenho certeza que é por aqui, pelo Arco Norte! Não só por conta da extraordinária possibilidade da Margem Equatorial, mas porque aqui está localizado o maior hub de logística das próximas décadas. 

O Maranhão tem características geográficas singulares, como sabemos. O Estado está localizado em uma zona de transição entre o Nordeste e a Amazônia, e por isso tem dois biomas: ao sul de seu território a extensão última do cerrado brasileiro, a leste coexistem as características típicas desta região sertaneja e dos limites do cerrado, e ao norte o grande deserto brasileiro, o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, com vegetações de manguezais. A oeste, os alagadiços da Baixada Maranhense, o Pantanal Maranhense, transitando para a grande floresta amazônica, que aqui se inicia. 

Por isso, especialistas chamam a terra de Gonçalves Dias de “zona de soldadura”, por também ser o eixo central logístico de toda a região do chamado Arco Norte, ou seja, tudo acima de Brasília. Por quê? Ele conecta o Leste e o Oeste, por suas vantagens naturais, mas igualmente o Sul e o Norte, por conta de ser por onde há um grande escoamento de grãos produzidos no exuberante Centro Oeste.

Hoje o chamado complexo portuário da Baía de São Marcos é formado pelo porto público de Itaqui e dos terminais da Ponta da Madeira (VALE) e Porto da Alumar, um voltado para minério de ferro e outro, para alumínio. A participação dos portos maranhenses poderá ser acrescida em breve, quando confirmadas a construção de duas novas instalações já autorizadas: o Porto de São Luís, recém adquirido pelo grupo COSAN e o Porto de Alcântara - TPA, autorizado para o grupo GPM.

Mas aqui cabe enxergar algo interessante: Com uma extensão aproximada de 3.000 km, o litoral do Nordeste é o maior do Brasil, e tem em operação três dos maiores complexos portuários do país: Itaqui (MA), Suape (PE) e Pecém (CE). Adentrando a região Norte, temos ainda os portos de média capacidade operacional como os do complexo portuário de Belém, e os de Santarém (PA), Itaituba (PA), Porto Velho (RO), Itacoatiara (AM) e Macapá (AP).

Estes portos, motivados pela sua proximidade aos principais mercados consumidores, ou seja, América do Norte, Europa e Ásia, tiveram sua importância relativa aumentada consideravelmente na última década. Ou pela exportação de commodities agrícolas, como soja ou milho, ou pela minerais como ferro, alumínio e alumina. Por último, vale notar que houve um incremento grande na última década da importação de derivados de petróleo, como gasolina ou diesel.

Por conta disso, em nosso laboratório de pesquisa, um dos nossos trabalhos em desenvolvimento de doutorado, conduzido por Artur Cabral, surgiu a ideia de um “colar de pérolas” – algo que já existe em um conjunto de portos no Oceano Índico, conectando China, Mianmar, Bangladesh e Índia. Uma Rota da Seda feita pelo mar.

A grande vantagem deste Colar do Arco Norte seria se juntar à grande vocação do Norte e Nordeste, que são as fontes de energia. Seja em produção de energia eólica, pela capacidade extraordinária de ventos da região quanto solar, o que é igualmente óbvio. A Margem Equatorial também vem para solucionar muitos dos problemas do Brasil. 

Não existe solução e soberania de um país sem um forte componente logístico. Adam Smith nos alertava de que fatores como a geografia física podem ser decisivos no desenvolvimento econômico, sem que se caia na armadilha do determinismo geográfico, e considerava fundamental a proximidade do comércio marítimo de baixo custo. Olha só o que ele fala:

“Por meio do transporte aquático um mercado mais amplo se abre para toda espécie de indústria de que o transporte terrestre sozinho pode dar conta; assim, é junto a costa marítima e ao longo das margens dos rios navegáveis que a indústria de todo tipo naturalmente começa a se subdividir e se aperfeiçoar, com frequência, não demora muito para que esses aperfeiçoamentos se estendam para o interior do país.”

Como acontece com quem gosta de usar colares, creio que o Colar de Pérolas do Arco Norte daria harmonia, integração e beleza à região. 

*Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP, membro da AMC, presidente da Gasmar.

As opiniões, crenças e posicionamentos expostos em artigos e/ou textos de opinião não representam a posição do Imirante.com. A responsabilidade pelas publicações destes restringe-se aos respectivos autores.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.