Vice-presidente diz que "Brasil fez pacto com Diabo"

Agência Estado

Atualizada em 27/03/2022 às 14h33

Maceió - O vice-presidente José Alencar voltou a dizer, nesta terça em Maceió, que o "Brasil fez um pacto com o Diabo" ao adotar uma política de juros altos que inibe o crescimento da sua economia e agrava os problemas sociais. Ele já havia feito crítica semelhante em outubro. Alencar voltou a criticar o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, ao participar das comemorações ao 116 anos da Proclamação da República, inaugurando um monumento aos heróis republicanos de Alagoas, os marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto.

Alencar representou e fez um discurso em nome do presidente Luis Inácio Lula da Silva. A solenidade de inauguração do Memorial à República contou com a participação de cinco governadores de Estado, do presidente do Senado, Renan Calheiros, do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B/SP), do comandante do Exército no Nordeste, general Eron Carlos Marques; do embaixador do Brasil em Portugal, Paes de Andrade, entre outras autoridades.

O governador alagoano Ronaldo Lessa (PDT) disse que a partir de agora as comemorações da República terão sempre Alagoas como principal palco. "Se no 21 de abril as atenções da pátria se voltam para Minas Gerais, em homenagem a Tiradentes, no 15 de novembro as atenções se voltarão para Alagoas, em homenagem aos proclamadores da República, os marechais alagoanos Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto", afirmou.

Alencar parabenizou Ronaldo Lessa por ter construído um monumento que já faz parte do patrimônio nacional, pois funcionará como extensão do Museu da República, do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro. O vice-presidente elogiou a iniciativa do governo estadual de transformar as comemorações da Proclamação da República em uma festa nacional e disse que "no Brasil, a ordem é justa porque o progresso é para todos".

O memorial fica na praia da Avenida, foi construído em seis meses com recursos estaduais, tem 2.500 metros quadrados de área e custou R$ 1,5 milhão. A solenidade de inauguração, que reuniu cerca de 4 mil pessoas, contou com desfile militar e teve como atração a apresentação da Esquadrilha da Fumaça. Houve ainda a entrega da Medalha do Mérito da República Marechal Deodoro da Fonseca e um show de pagode com o grupo Exaltasamba.

Fome Zero

No discurso oficial, o vice-presidente disse que gostaria de falar de improviso, "sem script", mas como estava ali representando o presidente Lula ia ler o discurso que tinham lhe preparado. Depois de cumprimentar as autoridades e de enaltecer a importância da contribuição de Alagoas para a proclamação da República e a luta contra a escravatura, José Alencar destacou os feitos do governo Lula.

Alencar fez um balanço dos investimentos do governo na área social, lembrando que 3 milhões de nordestinos tiveram acesso ao Fome Zero, por meio da Bolsa-Família e outros programas sociais, enquanto no país foram contemplados cerca de 8 milhões de pessoas carentes. O vice-presidente prometeu que 50 milhões de brasileiros terão acesso à renda mínima até dezembro de 2006.

Ainda no discurso oficial, Alencar destacou o desempenho da balança comercial do Brasil e disse que o volume de recursos arrecadados com as exportações brasileiras daria para pagar a dívida externa. "Em 2002, precisaríamos de três anos e meio de arrecadação das nossas exportações para pagar a nossa dívida externa", destacou o vice-presidente, fazendo um apelo à juventude para não se deixar influenciar pela crise política.

Crise política

"Não deixem que os opositores do governo antecipem o funeral da esperança", afirmou Alencar, em seu discurso, garantindo que, apesar da crise, o governo Lula mantém o compromisso com os ideais de democracia e respeito às liberdades individuais. O vice-governador destacou ainda a recuperação do poder de compra do salário mínimo, o aumento da renda dos brasileiros e o crescimento do número de empregos.

Na entrevista coletiva à imprensa, Alencar mudou o tom do discurso e fez crítica à política econômica do governo. No entanto, ele disse que, apesar da crise política, "nunca a democracia esteve tão consolidada quanto agora". Elogiou o trabalho da Polícia Federal no combate à corrupção, investigando até "figurões" do governo. Para ele, esses fatos demonstram o aperfeiçoamento do sistema democrático. "Mas, precisamos avançar também na democracia econômica, no campo social", acrescentou.

Tortura no Exército

Alencar, que também é ministro da Defesa, falou mais uma vez sobre as denúncias de torturas a sargentos em uma unidade do Exército, no Paraná. "Foi abertura de um Inquérito Policial Militar (IPM), por iniciativa do general Albuquerque, comandante do Exército, para apurar os fatos. Além disso, por iniciativa dele, foi afastado todo o comando daquela unidade militar, para que sejam apuradas as responsabilidades", afirmou o vice-presidente.

Para ele, foi um trote exagerado. "O trote é uma tradição. Nós todos passamos por trote, mas aquele foi de um mau gosto muito grande. Ele simula um choque elétrico, mas ninguém sabe se tinha voltagem ou não. Ele simula um ferro quente, mas ninguém sabe ao certo se o ferro estava quente. Por isso tem que haver uma investigação séria sobre todos esses fatos".

O vice-presidente, que é dono de uma fábrica de chinelos, lembra também as cenas onde alunos do curso de sargento são torturados com chineladas nas palmas dos pés. "Havia uma imagem de uma chinelada, com um chinelo desses de dedo, que também não deixa de ser deprimente", comentou o vice-presidente, dizendo-se contra qualquer tipo de "trote" e dando um exemplo pessoal sobre esse tipo de experiência.

"Numa ocasião, atravessando a Linha do Equador de navio com minha esposa, em 1967, saindo de Nova Iorque para o Rio de Janeiro, na travessia do Equador, havia um tal de ´batismo´ para as pessoas que nunca tinham cruzado a linha, um espécie de trote. Sabem como era o trote?: era uma banheira cheia de macarrão e molho de tomate para que as pessoas mergulhassem ali, era quase uma piscina. Eu não vou fazer isso, porque tem tanta gente passando fome no mundo e não tem um macarrão desse para comer. No final das contas, ganhei uma sonora vaia por não quis participar daquele trote".

Crítica a Palocci

Apesar de ter feito um discurso enaltecendo os feitos do governo federal, no que diz respeito ao combate ao desemprego, ao crescimento econômico e ao controle da inflação, Alencar não poupou críticas à política econômica. Segundo ele, o ministro Antônio Palocci tem dado uma demonstração de que é um homem capaz, competente, inteligente e sério, mas continua insistindo em manter a alta taxa de juros.

"Eu discordo dele quando administra essa taxa de juros estratosféricos, muito acima dos padrões internacionais. Nós somos um dos melhores países do mundo, mas nosso povo ainda sofre por causa disso. Nós não podemos pagar essa taxa", afirmou Alencar.

"Para vocês terem uma idéia, a Colômbia, por exemplo, que tem governo paralelo de guerrilha, é um país vizinho nosso, um país amigo. Pois bem, o risco Colômbia é mais baixo que o risco Brasil. A taxa básica real que a Colômbia rola a sua dívida é de 1,5% ao ano, enquanto nós rolamos a nossa a uma taxa básica real de 13,5% ao ano", acrescentou.

"Então, em relação à Colômbia, nós estamos pagando a mais nove vezes aquela taxa. Então é por isso que eu me bato contra a política de taxa de juros alto praticada pelo ministro Palocci", criticou o vice-presidente, acrescentando que "se nós reduzíssemos à metade a taxa básica real de juros, nós teríamos feito uma economia, nesses três primeiros anos, de R$ 210 bilhões", explicou o vice-presidente.

Juros altos

Para Alencar, "isso é uma questão de aritmética, porque nós gastamos R$ 420 bilhões, nesses três primeiros anos do governo Lula só com os juros da dívida externa". "A taxa poderia ser a metade. E com esses R$ 210 bilhões nós contemplaríamos inúmeros problemas nas áreas de saneamento básico, educação e saúde, mas nós não temos recursos para nada", acrescentou.

Segundo ele, o país se ressente de recursos, principalmente, para obras de infra-estrutura, como construção de estradas e melhoramento de rodovias, para escoar a safra e conduzir as pessoas com mais segurança. "As estradas do Brasil, em determinadas regiões, acabaram", destaca o vice-presidente, cobrando investimento em rodovias, para reduzir os custos de produção.

Alencar critica também a falta de recursos para a segurança pública. "O Brasil é hoje um país de 185 milhões de habitantes, há grande aglomerações populacionais, que estão sofrendo problema da violência urbana, do aumento da criminalidade. O crime vem também dessa alta taxa de desemprego. Portanto, temos que combater isso".

Pacto com Diabo

"Eu tenho falado muito com o Palocci e com o presidente Lula, nas reuniões internas, sobre a necessidade de baixar a taxa de juros", afirma Alencar. Questionado porque a equipe econômica não altera a política de juros do País, o vice-presidente respondeu. "Essa é uma boa pergunta: Parece que o Brasil fez um pacto com o Diabo. Por que? O Diabo é uma figura sobrenatural. Essa é a única forma de explicar essa política cambial. Eu não tenho outra explicação", disse.

O vice-presidente criticou ainda a falta de uma política de subsídio para a produção agrícola do Brasil. Ele citou o exemplo da França que concede até 100% de subsídio para a produção do açúcar de beterraba, protegendo, dessa forma, o mercado local da concorrência do açúcar brasileiro.

"Os Estados Unidos deram U$ 2,8 bilhões para a cotonicultura produzir 4 bilhões de toneladas. Isso significou US$ 0,70 por quilo de algodão, num período que o algodão estava a US$ 1,1 por quilo. Isso foi mais de 60% de subsídio direto. Mesmo sem irrigação e sem subsídio, o Brasil produz um algodão melhor e com mais produtividade por hectare do que no Vale de São Joaquim, na Califórnia, nos Estados Unidos".

"Isso mostra a força do brasileiro", acrescentou Alencar, destacando a riqueza da diversificação racial do Brasil e a criatividade do povo brasileiro, que apesar da crise, do desemprego e das altas taxas de juros, segundo ele, consegue sobreviver com dignidade e superar as adversidades. Para ele, "a sorte do Brasil é que apesar de integrantes do governo Lula ter feito um pacto com o Diabo, Deus é brasileiro".

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