SANTO AMARO DO MARANHÃO - A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA) condenou a Rede Record de Televisão a pagar indenização, por danos morais, no valor de R$ 20 mil, a um morador do Município de Santo Amaro do Maranhão, que disse ter tido sua imagem relacionada a um ser estranho que atacaria pessoas em noite de lua cheia, chamado de “Vira Porco”. O homem disse que, por causa da reportagem exibida em rede nacional, passou a sofrer ofensas.
O Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Humberto de Campos havia condenado a rede de televisão a pagar uma indenização de R$ 50 mil ao senhor mencionado na reportagem, mas o órgão colegiado do TJ-MA decidiu adequar o valor aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e peculiaridades do caso, reduzindo-o para R$ 20 mil.
A emissora recorreu ao Tribunal de Justiça, alegando que a matéria jornalística tinha o objetivo de levar ao conhecimento nacional, a cultura, costumes e belezas do Maranhão. Acrescentou que o homem citado aceitou, de modo voluntário, ser indagado pela equipe e que a matéria deixou claro que não existe o ser, acabando com o boato regional. Mencionou inexistência de prejuízo, a liberdade de informação e o indiscutível conteúdo de interesse social.
De acordo com o relator, desembargador Raimundo Barros, o apelado disse que, em setembro de 2010, a emissora exibiu, em rede nacional, no programa Câmera Record, sem seu consentimento, reportagem que, além de denegrir sua imagem e reputação, constrange-o moralmente, juntamente com seus familiares.
“VIRA PORCO” - Segundo Barros, o apelado disse que, na reportagem, aparecem pessoas que dizem e até indicam onde encontrar o suposto “Vira Porco”, que dizem tratar-se dele mesmo.
O apelado destacou que a equipe o procurou por várias vezes em sua residência, mas não o encontrava porque ele sai logo cedo para a roça e só retorna ao final do dia. Acrescentou que, tempos depois, foi abordado por um repórter da Record que, de forma surpreendente e desrespeitosa, teria lhe perguntado se virava bicho em Santo Amaro.
O morador disse que não foi avisado que a reportagem seria exibida em rede nacional; que ficou assustado com a repercussão; que houve comentários maldosos e críticas pelas ruas de Santo Amaro e cidades vizinhas. Falou que vem convivendo com piadas de mau gosto e que sofre graves constrangimentos. Ele pediu reparação pelo abalo moral, no valor de R$ 1 milhão.
O relator ressaltou que os direitos da personalidade são considerados direitos fundamentais, com previsão na Constituição da República. Citou o artigo que trata do tema, assim como alguns elencados no Código Civil, junto com a possibilidade de indenização decorrente da violação a esses direitos.
Raimundo Barros narrou que a reportagem apresenta aspectos variados dos Lençóis Maranhenses, menciona casos de lobisomem no Ceará e no Rio Grande do Norte, e volta a Santo Amaro, mencionando a lenda de um homem em forma de porco. Entrevistados falam sobre supostos ataques e características do ser. Em seguida, o apelado é entrevistado, ocasião em que manifesta repulsa à pergunta do repórter, se é verdade que é conhecido como o vira-bicho.
O desembargador frisou que, em que pese que a reportagem não tenha tido a intenção de causar constrangimento ao apelado, efetivamente o fez, uma vez que expôs, em cadeia nacional, a notícia de que existe um vira-bicho, vira-porco, e que essa pessoa que se transformaria em noite de lua cheia seria ele.
O relator afirma que, ao veicular a matéria, mesmo com a intenção de informação, de divulgação da cultura local, dos costumes, deveria ter tido cautela, fazer uma entrevista prévia com o apelado, perguntar se ele se importaria em prestar declarações de grande audiência, em programa exibido em todo o território nacional. Ou seja: esclarecê-lo previamente da possível repercussão da matéria, o que não ocorreu.
Acrescentou que, em audiência, o apelado confirmou que não foi indagado antes do conteúdo da entrevista, que não consentiu com a transmissão de sua imagem e a veiculação de seu nome como sendo "vira-porco" para todo o Brasil.
O representante da rede de televisão disse que não teria como o apelado não saber que estava sendo gravado; que, geralmente, a produção/edição ocorre dois meses antes; que não há procedimento de autorização para matéria jornalística, apenas para programas de entretenimento; que, no momento em que a pessoa aceita ser entrevistada, já autoriza a exibição de sua imagem.
O relator observou que as duas testemunhas ouvidas no processo afirmaram que, após a exibição da reportagem, tiveram contato com o apelado e observaram sua indignação com a repercussão da matéria.
Barros entendeu como incontroverso, nos autos, o nexo de causalidade entre a conduta da empresa e os danos sofridos pelo apelado. Afirmou que a emissora primeiro deveria ter contatado o apelado, informado o conteúdo da entrevista, cientificado do alcance nacional da entrevista e eventual repercussão.
O magistrado considerou que a emissora incorreu em ato ilícito passível de reparação, mas considerou excessivo o valor de R$ 50 mil, fixado em primeira instância a título de danos morais, reduzindo-o para R$ 20 mil. Os desembargadores José de Ribamar Castro e Vicente de Paula acompanharam o voto do relator, pelo provimento parcial do recurso da Rede Record.
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