Codó

Lavradores vítimas de abuso da PM prestam depoimento

Termina nesta quinta-feira, 27, a fase de depoimentos dos lavradores do povoado Mata Virgem.

Acélio Trindade, para o Imirante.

Atualizada em 27/03/2022 às 13h41

CODÓ - Termina nesta quinta-feira, 27, a fase de depoimentos dos lavradores do povoado Mata Virgem, localizado a 72 kms da cidade de Codó, região de Cajazeiras. Eles, desde ontem, estão sendo ouvidos no prédio da Nona Companhia Independente pelo tenente-coronel Eduardo, que veio de São Luís, apurar denúncia de abusos em ação da polícia militar de Codó realizada ano passado.

A AÇÃO

Era 20 de novembro de 2007, início de tarde ( por volta do meio dia e meia) em Mata Virgem. O lavrador, Ivaldo de Sousa Carvalho, contou que estava em sua residência, com a família, quando foi surpreendido pela presença de seis policiais armados, alguns encapuzados. “Chegaram na minha casa a procura de arma e eu dizendo pra eles que não tinha arma, como não tenho mesmo. Chegaram entraram dentro do meu quarto, reviraram cômoda, jogaram as roupas tudo no chão, documentos” disse seu Ivaldo que ficou chocado com a ação “Acho que este não seja um trabalho correto. Eu sou um analfabeto, mas um policial para chegar numa residência tem que ter uma ordem, um mandado da justiça. Não apresentaram nada, nem licença pediram”, completou ainda indignado o lavrador.

A lavradora Maria dos Reis Ferreira da Silva afirmou novamente em seu depoimento que só as crianças estavam em casa, mas isso não impediu que os PMs invadissem a casa e a revirassem. “Só minhas crianças estavam em casa. Eu cheguei achei as coisas tudo bagunçada, colchão no chão, caixa de roupa tudo derramada e os meninos assim meio nervosos, sabe? Tem uma com 7 anos que ela está mais nervosa que todos os outros. Eles não perguntaram, meu filho cadê sua mãe? Seu pai? Não perguntaram, só mandaram eles saírem da porta e entraram” revelou a agricultora.

JUSTIFICATIVA DO COMANDO

Na época o comandante da PM em Codó, Major Ruy Fernandes, justificou-se dizendo que três homens de Mata Virgem, que trabalham para o suposto dono da área de 818 hectares, ora em amarrada desapropriação pelo INCRA, vieram denunciar ao delegado da cidade e ao comando da PM que estavam sendo ameaçados de morte por membros das 21 famílias que moram no lugarejo. Para desarmar os lavradores, o comandante teria ordenado a operação. Os policiais trouxeram naquele dia, de Mata Virgem, segundo o major, 9 armas de fogo, a maioria espingardas de uso costumeiro na zona rural. Ruy Fernandes também prometeu investigar se houve ou não abuso por parte dos seis soldados, até hoje não identificados, que confessou ter autorizado.

Insatisfeitos os lavradores trataram de espalhar a denúncia. “Denunciamos à promotoria de justiça, fomos à Secretaria de Segurança pública do Estado, à Corregedoria de Polícia Militar à Procuradoria da República no Estado do Maranhão e à secretaria de Direitos Humanos do Estado” explicou o representante do Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar. A presença do tenente-coronel Eduardo, da Corregedoria Estadual do Sistema de Segurança Cidadã em Codó, é resultado disso.

O tenente-coronel não quis falar ainda sobre o assunto, alegando ter pressa nos depoimentos. 11 agricultores serão ouvidos no quartel da PM, durante dois dias. Os policiais acusados não estão presentes, certamente devem ser ouvidos em um dia ainda não divulgado.

Apesar da forma sigilosa do trabalho do tenente-coronel encarregado da sindicância, os lavradores de Mata Virgem estão confiantes num resultado que sirva de exemplo para todo o resto do Maranhão. “Se eles merecerem têm que ser punidos, isso não pode acontecer. Como é que se invade uma residência sem nenhum tipo de mandado de busca. Tem que ser punido” desabafou o presidente da Associação de Produtores de Mata Virgem, José Rodrigues Magalhães, um dos depoentes.

Já o sindicalista José Luís dos Santos Castro espera que a punição, caso merecida, sirva de exemplo para qualquer autoridade. “Nós esperamos que as autoridades, a partir de agora, prestem atenção na hora de fazer essas diligências para que não façam mais invasão de domicílio sem mandado judicial”, encerrou.

O CONFLITO

Mata Virgem tem sua ocupação dividida entre antigos moradores ( 21 famílias) e os trabalhadores da fazenda que, segundo o presidente da associação local, José Rodrigues Magalhães, são funcionários do deputado estadual, Antonio Carlos Bacelar. Este, por sua vez, teria entrado na disputa pela posse da terra em 2005, quando já era de interesse dos lavradores o pedido de desapropriação.

No início, o deputado teria se mostrado favorável a venda. “Ele disse, pois vocês dão entrada no INCRA que eu negocio a terra com o Governo. Fizemos o máximo possível para ver se resolvíamos antes da eleição (pleito de deputado e governador), não deu pra resolver. Depois da eleição, ele mostrou as unhas” reclamou o presidente. Desde então, o processo de desapropriação emperrou. De acordo, com o representante do SINTRAF/Codó , José Luís dos Santos Castro, uma pesquisa no cartório de imóveis já foi feita pelo INCRA e o nome do deputado não consta como dono da área de 818 hectares, em questão. “O problema agora é que o dono, no nome de quem está o imóvel, só tem este terreno e para o INCRA, pelo tamanho dele, não pode ser desapropriado. Mas nós já vimos terreno menor servir para a reforma agrária e vamos continuar lutando”, explicou José Luís.

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