SÃO LUÍS - Se os pinheirenses tivessem a faculdade de prever o futuro, teriam, com certeza, no dia 24 de abril de 1930, preparado uma animada festança popular para saudarem o nascimento de um menino que, anos depois, entre os cargos importantes ocupados por ele ao longo de 75 anos, realçariam-se os de deputado federal, governador do Estado do Maranhão, senador da República, presidente da República e presidente do Congresso Nacional. Mas como não eram providos de capacidade premonitória ou tivessem bola de cristal, só no curso do tempo foram percebendo que àquela criança foram destinadas missões e tarefas importantes, especialmente na vida pública.
Nome dessa criança: José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa, que, mais tarde, por sugestão de um amigo de geração e intelectual como ele, passou a ser nacionalmente conhecido por José Sarney.
Hoje, quando completa 75 anos de vida, embora seja complicado separar o José de Ribamar do José Sarney, vamos deixar o José de Sarney de lado, até porque a mídia impressa e a eletrônica, em função das diversas ações e atividades públicas por ele exercidas e assumidas, já se encarregaram de mostrá-lo em todos os seus aspectos.
O que nos compete neste dia é ressaltar a figura humana de José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa, buscando, para tanto, a sua origem familiar, onde e como veio ao mundo, a educação que recebeu na infância e na adolescência, as cidades nas quais morou em razão da atividade profissional do pai, sem esquecer os primeiros passos dados na cena intelectual, a outra vertente de sua vida, que o levou a se consagrar como escritor e membro da Academia Brasileira de Letras.
Os pais
Os pais de José chamavam-se Kiola França Ferreira e Sarney de Araújo Costa. A mãe, nordestina da cidade de Correntes, em Pernambuco, filha do piauiense Assuero Leopoldino Ferreira e da paraibana Maria Augusta França Ferreira.
Assuero, que havia se separado da esposa, com a qual havia deixado os cinco filhos em Recife, depois de tentar a vida em várias cidades do Brasil, afinal chegou ao Maranhão, onde fixou residência definitiva. De São Luís, mudou-se para cidade de São Bento. Ali, achou que era o lugar ideal para instalar os filhos. Por isso, mandou buscá-los tão logo as condições o permitiram.
A 29 de maio de 1927, Kiola e os irmãos desembarcaram do navio do Lóide e, no mesmo dia, em viagem de barco, tomaram o destino de São Bento. Como era a primeira filha, coube a ela, com a idade de 16 anos, a tarefa de cuidar dos irmãos mais novos.
O pai, nascido em São Bento a 4 de setembro de 1901, filho de Rita Amélia de Araújo e de José Adriano da Costa, após concluir o curso primário na cidade em que nasceu, por causa de seu potencial intelectual, em 1915 deslocou-se para São Luís, onde estudou em vários estabelecimentos de ensino. Como precisava trabalhar, aos 18 anos fez-se funcionário da Estrada de Ferro São Luís-Teresina e depois escriturário da Secretaria-Geral do Estado do Maranhão. Em 1925, realizou o seu sonho: ingressou na Escola de Direito do Maranhão.
Ainda estudante universitário, foi nomeado para as funções de agente judiciário (juiz suplente) de Cajapió.
Namoro e Casamento
Dois meses após chegar a São Bento, em julho de 1927, Kiola conheceu o jovem Sarney de Araújo Costa, de tradicional família do município. Da amizade, nasceu o namoro e, quando menos se esperava, surgiu o noivado e o conseqüente pedido de casamento. Como Assuero gostava de Sarney, não criou problemas para concordar com o casório, ocorrido seis meses antes de Sarney concluir o curso de Direito. O evento deu-se em 18 de julho de 1929, na casa do capitão José Adriano Costa, em cerimônia simples, assistida apenas por familiares e amigos mais íntimos, celebrada sob as bênçãos do monsenhor Felipe Condurú Pacheco e do juiz Nelson Jansen.
Casados, ficaram morando em São Bento até meados de 1930, quando o jovem bacharel em Direito, a 3 de fevereiro, por ato do governador Magalhães de Almeida, foi nomeado promotor público da comarca de Pinheiro, fato que levou o casal a mudar de pouso. Àquela altura dos acontecimentos, Kiola estava grávida e à espera do primeiro filho. Por isso, teve de ser conduzida de São Bento para Pinheiro em rede. Dois taboqueiros (homens que seguravam a rede na ponta das tabocas) a transportaram com extremo cuidado para não permitir que ela sofresse qualquer problema no parto.
Nascimento de José
Em 31 de março de 1930, Kiola e Sarney instalaram-se em Pinheiro em uma pequena e humilde casa, localizada na hoje movimentada rua Eurico Dutra. Dias depois, ou seja, na madrugada de 24 de abril, a parteira da cidade, Mãe Raimunda, foi chamada às pressas para, sob a luz de um lampião de querosene, prestar assistência e receber nos braços o menino José.
O jornal “Cidade de Pinheiro”, edição de 27 de abril de 1930, registrou o fato dessa maneira: “O Dr. Sarney de Araújo Costa, nosso digno promotor, esteve com o seu lar feliz em festas no dia 24 deste mês. É que a sua Exma. Esposa, D. Kiola, deu à luz o primogênito do casal, que, ao nascer, recebeu o nome de José. Ao casal Araújo Costa os nossos mais sinceros votos ao Criador, para que o inocente José tenha sempre uma vida feliz, cercada das melhores ternuras dos seus distintos progenitores”.
A deflagração da Revolução de 30 alterou a vida do casal. Por isso, Kiola, Sarney e o filho José demoraram pouco tempo na Princesa da Baixada. Por ato da Junta Governativa do Maranhão, o promotor Sarney de Araújo Costa foi removido para a comarca de São Bento, onde nasceram mais dois filhos do casal, Evandro e Conceição.
Em São Bento, onde fixaram residência, ocorreu o batizado de José, cerimônia realizada na Igreja do Senhor São Bento, a 8 de dezembro de 1930, em ato celebrado pelo vigário Felipe Condurú Pacheco, sendo padrinho o Dr. Ivan de Araújo Costa e madrinha Dona Dulce. Naquela cidade, José iniciou seus estudos, alfabetizado pela respeitada professora Maria Menezes de Teixeira, mais conhecida por Cota.
Itinerância
Em 1936, quando José estava com seis anos, o promotor Sarney recebeu convite para trabalhar na Procuradoria-Geral do Estado, em São Luís. Por causa da educação dos filhos, veio para a capital e trouxe a família para morar em casa alugada no Beco do Teatro. O processo de aprendizagem de José teve aqui continuidade com Arcelina Mochel.
Menos de um ano em São Luís, o pai sofre intransigente perseguição do interventor Paulo Ramos, que o transfere para a comarca de Codó, de onde, em seguida, é removido para Coroatá e logo depois para Santo Antônio de Balsas. Em 25 de agosto de 1940, aportam na cidade, depois de uma tumultuada viagem, que durou sete dias.
A primeira providência de Kiola e Sarney foi matricular José no melhor colégio de Balsas, do professor Joca Rego, mas com a rigorosa recomendação de a educação ser praticada sem o auxílio de castigos físicos, tão comuns na época.
Ainda não havia completado um ano em Balsas, eis que chega a alvissareira notícia da transferência do promotor para São Bento. A viagem de retorno foi até mais dramática e penosa, pois demorou cerca de dezoito dias.
Em São Bento, José teve como professora a dedicada Maria de Lourdes Pinho, no Grupo Mota Júnior, onde concluiu o curso primário. A meta seguinte era o exame de admissão para ingressar no ginásio, mas, no interior do Estado, não existia curso secundário, fato que levou Kiola e Sarney, em 1942, a mandarem José, com 12 anos, para São Luís, onde, no Colégio dos Irmãos Maristas, foi aprovado em primeiro lugar no exame de admissão ao ginásio.
Em São Luís, José viveu uma verdadeira via-crúcis. Além da separação dos pais, hospedou-se em pensionatos, casas de amigos e de parentes. Essa angústia só findou com a renúncia de Paulo Ramos, em 1945, quando o país deixou o regime ditatorial e ingressou na democracia.
Nomeado Clodomir Cardoso para governador do Maranhão, este convidou Edison Brandão para ocupar o cargo de procurador-geral do Estado, o qual trouxe Sarney para São Luís, a fim de trabalhar na Procuradoria, após o que ingressou, por concurso, na magistratura. Mais tarde, deixou a carreira de juiz e retornou aos quadros do Ministério Público, onde exerceu postos e funções relevantes.
Formação Intelectual
Estruturada a família em São Luís, Kiola e Sarney passaram a dar maior assistência aos filhos e a orientá-los para o futuro. José, então, com 14 anos e cursando o terceiro ano ginasial, resolve deixar os Maristas e transferir-se para o Liceu Maranhense, onde, pela manhã, assistia às aulas, e, à tarde, freqüentava a Biblioteca Pública, na Rua da Paz. Ali, adquiriu o hábito de ler autores nacionais e estrangeiros.
Ainda que adolescente, contava com invejável bagagem intelectual e potencial liderança política. Por isso, os colegas o fizeram candidato à presidência do Centro Liceísta. Passou no seu primeiro teste nas urnas. Além da militância política estudantil, fundou o jornal “O Liceu”, do qual era um dos redatores.
No correr de 1945, José enfrentou duas lutas. A reeleição para o Centro Liceísta, da qual foi o vencedor, e a participação nos embates travados nas ruas contra a ditadura getuliana, fato que levou o ditador Paulo Ramos a mandar prendê-lo.
No ano seguinte, após submeter-se ao vestibular para a Faculdade de Direito de São Luís, no qual logrou êxito, tomou a decisão de buscar o caminho da independência financeira. Por isso, quando “O Imparcial”, jornal dos Diários Associados, lançou o concurso de reportagem, com o pseudônimo de Zé da Ilha, produziu o melhor trabalho, o que lhe valeu a imediata contratação na função de repórter.
A década de 50 modificou literalmente o seu modo de vida. Ainda era universitário, em que participou das lutas nacionalistas encabeçadas pela União Maranhense dos Estudantes e pela União Nacional dos Estudantes, quando aconteceram alguns episódios marcantes, que tiveram enorme repercussão em sua existência, mas todos produtos de sua obstinada tenacidade e fulgurante inteligência.
O primeiro, ao conquistar um lugar de relevo no cenário cultural maranhense, em torno de um movimento jovem, que se reunia sistematicamente na Movelaria Guanabara, que contava com a presença de intelectuais de todos os matizes. Resultado: em 19 de março de 1952, depois de publicar o livro de poesia “A Canção Inicial”, elegeu-se para a Academia Maranhense de Letras, e a 17 de junho tomou posse na cadeira patroneada por Humberto de Campos.
O segundo, ao encontrar novas alternativas financeiras, com vistas a melhorar o seu padrão de vida. Levando em conta de que concurso, naquela época, não era condição fundamental para ingressar na atividade pública, tornou-se consultor técnico do Diretório Regional de Geografia, depois oficial judiciário, com lotação na Biblioteca Pública, em seguida, por ato do governador Eugênio Barros, foi nomeado Oficial de Gabinete, e finalmente, a convite do desembargador Trayahú Moreira, presidente do Tribunal de Justiça, exerceu a Secretaria daquela Corte.
O terceiro, ao contrair matrimônio, no dia 12 de julho de 1952, com uma das moças mais bonitas da cidade: Marly Macieira, com a qual teve três filhos: Roseana, Fernando e Sarney Filho.
A partir daí, José Sarney caminhou com firmeza para alcançar os mais elevados postos políticos do país, chegando à Presidência da República, e trilhar uma estrada intelectual que o levou à Academia Brasileira de Letras.
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