Comprova Explica
O governo federal enviou ao Congresso um projeto de lei (PL 1087/2025) para ampliar a isenção de Imposto de Renda de Pessoas Físicas (IRPF) para pessoas que ganham até R$ 5 mil e uma das propostas para compensar a perda de arrecadação tem sido alvo de debate e gerado confusão. Trata-se da taxação de dividendos, uma parcela do lucro da empresa que é distribuída a seus acionistas. Ela prevê a tributação de cidadãos que ganham acima de R$ 600 mil por ano (R$ 50 mil por mês) em dividendos de empresas.
Conteúdo analisado: Conteúdos apontam que, com a taxação de dividendos, o governo faria uma “dupla cobrança” aos empresários, que teriam que pagar os impostos empresariais e, depois, teriam que pagar mais impostos sobre os lucros e dividendos recebidos. “Sabe aquele lucro suado que sua empresa já paga 34% pro governo antes de chegar no seu bolso? Então, agora vão cobrar MAIS UMA VEZ quando você receber, podendo levar até 27,5% do que sobrou”, diz o texto.
Comprova Explica: Com o anúncio do projeto que aumenta a faixa de isenção para o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), uma das propostas do governo para compensar a perda arrecadatória gerou debate antes mesmo de ser divulgada. É a tributação dos dividendos, que atualmente são isentos de tributação conforme a Lei 9.249/1995.
A ideia do governo é que pessoas físicas com renda acima de R$ 600 mil por ano proveniente de dividendos estejam sujeitas a um imposto mínimo, com alíquota progressiva que vai de 0% até 10% (para quem ganha mais de R$ 1,2 milhão por ano).
O governo argumenta que o projeto não cria novo tributo nem aumenta a alíquota geral do Imposto de Renda. A justificativa é que pessoas com a renda muito alta pagam, proporcionalmente, menos impostos, já que parte desse valor vem de rendimentos não tributados, como os dividendos, ou tributados de forma mais vantajosa. A proposta do Planalto ainda será examinada pelo Congresso, que pode alterá-la.
A proposta do Planalto chegou ao Congresso em 18 de março. Durante o evento realizado pelo governo federal para apresentação do projeto, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse que o Congresso irá tratar o tema com sensibilidade, mas também sinalizou que o texto sofrerá modificações.
Dupla tributação
O Brasil é um dos poucos países no mundo com isenção de impostos em dividendos. Dentre os países membros e aqueles candidatos a entrarem na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por exemplo, apenas o Brasil, Letônia e Estônia não fazem esse tipo de tributação. Há quem critique a tributação dos dividendos, dizendo que empresários serão duplamente taxados. Isso pode ocorrer, a depender do modelo de tributação adotado, mas a proposta do governo federal impõe regras sobre essa duplicidade (leia mais abaixo).
Atualmente, as empresas pagam até 34% com a soma das alíquotas do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). No caso de bancos, a alíquota máxima chega a 45%. O economista Otto Nogami, professor de economia do Insper e sócio da Nogami Economia & Estratégias, explica que a tributação sobre os dividendos pode se caracterizar como uma “tributação em cascata” (imposto sobre imposto), mas isso depende do modelo adotado.
A proposta do governo, afirma Nogami, é reter o imposto na fonte, ou seja, descontá-lo antes de o valor ser repassado aos acionistas. “A ideia do governo é não alterar a carga sobre empresas, mas redistribuí-la entre a empresa e os acionistas”, afirma.
No projeto de lei, o Planalto propõe estabelecer um teto para que um indivíduo não pague mais de 34% de imposto no caso das empresas e 45% no caso dos bancos quando somadas as alíquotas sobre a pessoa jurídica e sobre a pessoa física. Nesses casos, o governo federal propõe evitar a dupla tributação por meio da restituição quando o limite em questão for atingido. Segundo Nogami, uma das possibilidades é reduzir as alíquotas do IRPJ e CSLL para compensar a carga tributária, mas o governo ainda não sinalizou qual estratégia será adotada.
Como vai funcionar
Roberto Piscitelli, professor de Finanças Públicas da Universidade de Brasília (UnB), explica que a tributação vai acontecer de forma separada, ou seja, assalariados e pessoas que ganham honorários, por exemplo, que têm o IRPF tributado na fonte, continuam a declarar o Imposto de Renda normalmente. Mesmo para os trabalhadores que ganham mais de R$ 50 mil por mês, nada muda, já que o valor do imposto é descontado diretamente do pagamento.
“É parecido com a taxação do 13º, que é recebido no fim do ano, mas não é considerado nos rendimentos de dezembro”, diz. O economista destaca que parte dos milionários e bilionários do país têm como maior fonte de renda esses valores de dividendos, o que faz com que paguem menos imposto proporcionalmente por conta da isenção. Ele também argumenta que a proposta prevê uma ampla faixa de isenção.
Na tributação de alta renda proposta pelo governo, o contribuinte deve ter todas as formas de rendimento somadas, como salário, aluguéis e dividendos (herança e venda de bens não entram no somatório). Se essa soma for menor que R$ 600 mil, não há cobrança adicional. Se ultrapassar esse valor, aplica-se uma alíquota que cresce gradualmente até 10%. Na hora de calcular o imposto devido, alguns rendimentos são excluídos, como ganhos com poupança, títulos, indenizações, aposentadorias e pensão por moléstias graves, e outros rendimentos mobiliários isentos.
O Comprova entrou em contato com o autor da publicação no X que fala sobre a tributação de dividendos para comentar o assunto, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
Fontes consultadas: Consultamos os sites oficiais do Planalto e Ministério da Fazenda, além da cartilha explicativa sobre a reforma no Imposto de Renda. Também consultamos a legislação atual em relação à tributação de empresas e de dividendos. Procuramos especialistas para entender os impactos da nova mudança.
Por que o Comprova explicou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está gerando muitas dúvidas e desinformação, o Comprova Explica. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Para se aprofundar mais: O Comprova já mostrou ser falsa a informação de que o reajuste da contribuição de MEIs foi estabelecido pelo ministro Fernando Haddad e explicou os efeitos da implementação da gratuidade dos itens do Farmácia Popular.
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