Checagem

Vídeo dissemina informações falsas sobre Alexandre de Moraes, fraudes nas eleições e prisão de indígenas

Publicação traz uma compilação de desinformações compartilhadas pelas redes sociais desde 30 de outubro.

Projeto Comprova

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original. (Reprodução)

Falso

É falso que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, tenha instaurado uma “ditadura” no Brasil e forçado os cidadãos a aceitar a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições presidenciais de 2022, como sugere vídeo viral publicado no Twitter. O conteúdo também dissemina desinformação sobre o processo eleitoral brasileiro. Diferentemente do que alega o vídeo verificado, a urna eletrônica, utilizada no Brasil desde 1996, não apresentou nenhuma fraude comprovada ou adulteração de resultado.

Conteúdo investigado: Em vídeo postado no Facebook pelo portal britânico MW3.News, uma narração em voice-over acusa o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, de ter instaurado uma “ditadura” no Brasil e forçado os cidadãos a aceitar a vitória de Lula nas eleições presidenciais de 2022. A gravação alega haver um conluio entre Moraes, Lula e uma organização criminosa internacional. O conteúdo diz também ter havido fraudes no pleito presidencial e que Moraes determinou a prisão de todos os indígenas que o critiquem. O vídeo mostra cenas dos atos de violência cometidos por bolsonaristas em Brasília, em 12 de dezembro, e os atribui a extremistas de esquerda infiltrados nos protestos de aliados do presidente Jair Bolsonaro (PL).

Onde foi publicado: Twitter.

Conclusão do Comprova: Com três minutos de duração, o vídeo traz uma série de alegações falsas, muitas das quais já foram verificadas pelo Projeto Comprova e outros veículos de checagem de informações. A principal é a de que o Brasil está sob uma ditadura imposta por Moraes, que atuaria em conluio com Lula e uma organização criminosa internacional. Os brasileiros, menciona o vídeo, teriam sido obrigados pelo TSE a aceitar a vitória do petista nas urnas, que teriam sido fraudadas. Essa premissa é falsa.

O Brasil não é acusado por nenhum organismo nacional nem internacional de rompimento da ordem constitucional democrática. Tampouco houve denúncias fundamentadas de irregularidades nas eleições de 2022, informou o TSE. No vídeo, não são apresentadas provas. Lula foi eleito presidente com 50,9% dos votos válidos, contra 49,1% de Jair Bolsonaro , no segundo turno, em 30 de outubro.

Esse resultado foi acatado pelos três Poderes e avalizado por órgãos de controle, organismos do país e do exterior, e várias nações. O Tribunal de Contas da União (TCU) reiterou que não houve fraudes nas urnas. A alegação de que Moraes determinou a prisão de “todos os indígenas” críticos a suas decisões não tem fundamento . O Supremo Tribunal Federal (STF) ordenou a prisão preventiva por 10 dias do cacique José Acácio Serere Xavante, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), por ter liderado atos antidemocráticos em Brasília (DF). Mas o STF afirma não ter determinado outras detenções de indígenas .

Verificações anteriores permitem concluir que o vídeo traz uma compilação de desinformações compartilhadas pelas redes sociais desde 30 de outubro. Uma delas é a de que Lula é um condenado, eleito de forma fraudulenta. Suas condenações, entretanto, foram derrubadas por decisões tomadas pelo STF em 2021. Vinculações de Lula e de Alexandre de Moraes ao crime organizado internacional surgiram em posts ao longo deste ano e foram considerados como boatos pelo Comprova.

Os protestos bolsonaristas não são totalmente pacíficos, como alega o vídeo. Houve bloqueios em rodovias e ataques, em 12 de dezembro, em Brasília. O governo do Distrito Federal identificou os agressores como extremistas de direita – não de esquerda, como menciona o post. As acusações de que o presidente do TSE se vale de proteção similar à da Gestapo (a polícia secreta do nazismo na Alemanha) e de que ele seria uma espécie de novo Adolf Hitler não têm respaldo. Moraes tem sua segurança feita pelas polícias militar e judicial, informou o TSE, e exerce funções elevadas apenas na hierarquia do Judiciário.

Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. O post original teve 7,7 mil likes e foi compartilhado 4,4 mil vezes até o dia 16 de dezembro.

O que diz o responsável pela publicação: Procurado pela verificação, o disseminador da peça desinformativa não respondeu. Will Lisil se apresenta no Twitter como “ativista sócio-construtivo”, CEO da MW3.biz e dono da _PopHits.CO, plataformas de divulgação de músicos independentes. Também está vinculado ao portal de notícias MW3.News, que tem entre suas editorias uma específica sobre o Brasil – não há o mesmo destaque sobre o Reino Unido e outros países. Os conteúdos publicados no canal midiático, favorável à pauta bolsonarista, envolvem teorias da conspiração sobre as eleições brasileiras.

Como verificamos: O Comprova transcreveu o texto da narração do vídeo checado e assinalou as acusações. Buscas nos sites de agências de checagem, inclusive no Comprova, nos permitiram identificar verificações anteriores de acusações feitas por outros usuários das redes sociais, semelhantes às do vídeo verificado.

Por meio de pesquisa no Google sobre o termo “Will Lisil” e “MW3.biz”, encontramos a fonte original do vídeo.

Também buscamos os portais associados a esse canal de notícias, como o MW3.biz e o PopHits.Co, ambos pertencentes a Lisil. E, por meio da área de contato do site do MW3.biz, foi possível enviar mensagem ao empresário com perguntas sobre seus vínculos com o Brasil e as acusações feitas no vídeo. Não houve respostas até a publicação desta verificação.

Em seguida, enviamos ao TSE solicitação de resposta às acusações ao ministro Alexandre de Moraes. Também pedimos para o STF comentar as razões da prisão de José Acácio Serere Xavante e responder se houve outras detenções de indígenas. Solicitamos ainda à assessoria de imprensa do presidente eleito um posicionamento sobre as declarações do vídeo.

Resultado das eleições

Lula foi eleito com 50,9% dos votos válidos, contra 49,1% de Jair Bolsonaro, em 30 de outubro. O Congresso Nacional, o próprio Poder Executivo, os órgãos de controle nacionais e os organismos internacionais que acompanharam o pleito consideraram as eleições justas. O resultado foi reconhecido por países da União Europeia, Estados Unidos e vizinhos latino-americanos. O TSE informou não ter havido fraudes nas urnas, o que foi respaldado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A assessoria de Lula informou que o ex-presidente “foi eleito em eleições livres junto com governadores, deputados e senadores em eleições reconhecidas por todo o mundo, inclusive o Reino Unido”.” Se o senhor Will Lisil tem algum conhecimento ou provas de suas afirmações seria importante apresentá-las concretamente, coisa que a coligação do senhor Jair Bolsonaro nunca fez.”

Ditadura

Não há nenhuma ditadura no Brasil desde o fim do regime militar, na década de 1980. A ordem democrática continua em vigor, sem sobreposição de um dos Poderes sobre os demais nem adoção de medidas inconstitucionais. O presidente e o vice eleitos, em processo de acordo com a legislação eleitoral, foram diplomados em 12 de dezembro pelo TSE, conduzem um período de transição de governo e serão empossados em 1 de janeiro, como prevê a Constituição.

Prisão de indígenas

O indígena José Acácio Serere Xavante foi preso preventivamente em 12 de dezembro por determinação do STF, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR). Serere Xavante liderou protestos antidemocráticos em Brasília e, segundo a PGR, valeu-se de sua posição de cacique para “arregimentar indígenas e não indígenas para cometer crimes, mediante a ameaça de agressão e perseguição” a Lula e a ministros da Suprema Corte. A ordem de prisão foi assinada pelo ministro Moraes. O STF informou que não determinou a prisão de outros indígenas. O tribunal disse ainda não ter havido registro nem denúncias de que votos em tribos indígenas não foram computados. Em municípios do Mato Grosso, o TSE verificou que os votos se concentraram em apenas um dos candidatos à Presidência em algumas seções eleitorais.

Fraude nas urnas

O TSE afirmou que o processo eletrônico de votação é auditado antes, durante e após as eleições por inúmeras entidades fiscalizadoras. “As eleições brasileiras ocorreram dentro da normalidade e de forma transparente, como pode ser verificado nos relatórios das missões de observação nacionais e internacionais”, ressaltou o tribunal. Postagens sobre fraudes nas urnas foram verificadas pelo Comprova, que as considerou falsas. Também foi considerado como desinformação um post sobre alteração de votos nas urnas.

Organização criminosa

Não há evidências de que Moraes e Lula estejam associados a qualquer grupo criminoso internacional. Posts anteriores que ligavam o PT ao Primeiro Comando da Capital (PCC) foram considerados boatos por agências de verificação, assim como os que vincularam Moraes ao PCC.

Lula condenado

O vídeo alega que Lula foi condenado a 12 anos de prisão, mas cumpriu apenas 580 dias. Na verdade, em segunda instância, a pena foi elevada de 12 para 17 anos. As condenações, entretanto, caíram por decisão do STF em 2021. Lula deixou de ser considerado um condenado da Justiça e, como tal, pôde se candidatar à Presidência neste ano.

Gestapo

A informação de que Alexandre de Moraes é protegido por uma “espécie de Gestapo”, a polícia política do regime nazista, foi desmentida pelo TSE. “A segurança dele é feita pelas Polícias Militar e Judicial, assim como ocorre com os demais ministros”, informou o tribunal ao Comprova.

Protestos pacíficos

As manifestações antidemocráticas em curso desde o resultado das eleições, em 30 de outubro, não podem ser generalizadas como pacíficas, como diz o vídeo. Houve bloqueios em rodovias do país, que resultaram em obstáculo ao direito constitucional de ir e vir e ao abastecimento de mercados, hospitais e farmácias, entre outros. Manifestantes concentram-se em frente a quartéis militares, que são áreas de segurança nacional. Brasília foi palco de atos de vandalismo em 12 de dezembro, que causaram danos materiais a proprietários de 13 veículos destruídos e pânico nas pessoas que trabalham e circulam pela região central da cidade. Houve depredação do prédio da 5ª Delegacia de Polícia e tentativa de invasão da sede da Polícia Federal. O Comprova constatou ser enganosa a presunção de que os protestos bolsonaristas sejam a maior manifestação da história da humanidade, como alega o vídeo.

Extrema-esquerda infiltrada

A informação de que os protestos violentos em Brasília foram perpetrados por militantes de extrema-esquerda, como alega o vídeo aqui verificado, não procede. O Departamento de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado da Polícia Civil do Distrito Federal (Decor/PCDF) identificou e investiga extremistas de direita.

Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e peças que questionam o resultado das eleições presidenciais. Publicações como esta verificada aqui são prejudiciais, pois tentam levantar dúvidas sem fundamentos que podem tumultuar o processo democrático brasileiro.

Outras checagens sobre o tema: O Projeto Comprova já verificou que as urnas brasileiras não foram hackeadas nos EUA e que empresa foi multada por pagar propinas, não por fraudar urnas eletrônicas. Outras verificações sobre temas correlatos ao aqui apurado foram realizadas pelo Estadão Verifica e UOL Confere.

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